Independentemente da senhora ser ou não culpada, esta história do “caso Felgueiras” incomoda-me. E sabem porquê? Em primeiro lugar porque, na minha opinião, uma pessoa que é acusada de 23 crimes e teima em candidatar-se a um cargo público, parece revelar, no mínimo, uma grande falta de sentido político e uma enorme ausência de ética.
Recordo, a propósito, que há uns anos um senhor que tinha sido ministro e era, na altura, figura destacada de uma representação diplomática no estrangeiro, por causa de um deslize de um filho seu, pediu imediatamente a exoneração do cargo.
Há bem menos tempo, o então ministro António Vitorino, também saiu do governo porque não tinha pago uma verba irrisória relativa à sisa de uma casa que comprara.
Estes dois casos demonstram bem a lisura de carácter de ambos, em situações relativamente às quais não foram sequer acusados. Aliás, no primeiro caso, o erro não foi cometido pelo político mas sim pelo seu filho.
Repito, a senhora pode vir a ser considerada inocente de todos aqueles crimes de que é acusada, mas nunca deveria – antes de tudo estar esclarecido – ser candidata à Câmara de Felgueiras.
Aliás, o mesmo se passa relativamente a outros candidatos a presidências de câmara, nomeadamente o Major Valentim Loureiro em Gondomar, Avelino Ferreira Torres em Amarante e Rosa Damasceno em Leiria, que terão ser julgados por aludidas irregularidades, cometidas no âmbito do caso “saco azul”
A outra coisa que me incomoda é o fanatismo patenteado por uma boa parte da população de Felgueiras que, sem estarem minimamente informados do que se passa, cantaram as maiores hossanas à “Deusa Fátima”, a Amiga do Povo.
E que se cuidem aqueles que não manifestam a mesma simpatia pela ex-autarca. Ainda ontem, num dos telejornais, assistiu-se em directo a um cidadão que não comungava a mesma opinião que a multidão presente à porta do Tribunal de Felgueiras e, por um pouco, não era linchado pela populaça.
Mas, incómodo à parte, o que me preocupa deveras é o modo como todo o processo se desenrolou, uma vez que existem factos que foram muito mal contados e que suscitam muitas interrogações.
Fátima Felgueiras fugiu para o Brasil ao saber que ia ser detida e sujeita a prisão preventiva. Como soube, quem lhe disse? Dois anos depois, regressa agora como se nada se tivesse passado, numa conjuntura que lhe é favorável e vendo a pena anteriormente aplicada, ser alterada pela juíza do Tribunal de Felgueiras (não deve ter tido outra alternativa, senão a populaça linchava-a também) para termo de identidade e residência.
Mediática, isto é, com apetência pelas câmaras, voltou candidata. Depois de um dia intenso, apresentou-se, na conferência de Imprensa repleta de cidadãos eufóricos, com um ar rejuvenescido, para dizer "Mostraram-me que Felgueiras precisa de mim".
A sensação com que nós ficamos é que o crime compensa. Ou seja, faz-se uma aldrabice (ou 23), foge-se e, uns tempos depois, regressa-se e é-se aclamado.
Por isso, o descrédito no sistema de justiça vai crescendo, por isso, a descrença nos nossos políticos vai aumentando, por isso, a nossa democracia, vai definhando.
4 comentários:
Pois é!!! Cada vez mais tenho vontade de aprender espanhol para ver se mudo de governo, porque por cá está tudo cada vez mais .... nem tenho palavras.
É que uma coisa é haver pessoas que se julgam acima da lei e do respeito pelos outros. Isso é mau, claro, mas, supostamente, essas pessoas são (ou seriam) avaliadas/julgadas pelos seus actos, e teriam que sofrer as consequências.
O que é verdadeiramente assustador, é quando são elogiados e idolatrados por isso. Porque sendo o "Povo quem mais ordena", que solução existe? Como é que a restante sociedade pode lutar por repôr a verdade e a justiça?
Ainda não tive muitas oportunidades de ver ao vivo e a cores no meu país um processo desta natureza percorrer, com clareza, os trâmites normais da justiça, de forma a poder depois olhar para o caso já encerrado, reconhecer mérito nos seus intervenientes e sentir algum orgulho por ver as coisas acontecerem como deviam acontecer - como acontec nos países realmente desenvolvidos.
Nunca vi ou pelo menos não tenho memória disso. Mas ainda assim tenho um sentido de justiça e de ética minimamente apurado.
Isso pode ser uma grande chatice quando, de tempos a tempos, surgem as fátimas felgueiras da vida. É que é, no mínimo, embaraçoso ver estas coisas acontecerem em tempo real debaixo das nossas barbas.
O caso desta senhora é tão vergonhoso que se torna patético. Mas isto assume contornos surreais quando o povo da sua terra ainda deposita nela uma espécie de fé messiânica, como que hipnotizados, e isto tudo foge ao controlo - ou pior - à compreensão das pessoas bem formadas e com dois dedos de testa.
É revoltante. É estranho
Este caso da "Amiga Fátima" é absolutamente vergonhoso. Mas, para mim, o que me choca mais é o modo como uma boa parte do povo de Felgueiras a idolatra !
Que povo é este que recebe a dita senhora em apoteose, quando sabe que ela é acusada de 23 crimes, repartidos entre participação económica em negócio, corrupção passiva para acto ilícito, peculato e abuso de poder ?
Que povo é este que se prepara para votar na "Fatinha" para Presidente de Câmara, antes dos tribunais se pronunciarem ?
Que povo é este para quem, o mediatismo, umas palavras bonitas (que lá nisso a senhora é exímia, sem dúvida ...), uns beijinhos e umas palmadinhas nas costas, se sobrepõem aos valores da ética, da moral e da honestidade ?
Parafraseando a maria : "Se o Povo é quem mais ordena, que solução existe ?".
Tenham paciência, com mentalidades assim, nunca sairemos da mediocridade ! ! !
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