quarta-feira, dezembro 21, 2005

A maior árvore de Natal da Europa

Mais de dois milhões de luzes iluminam este ano a Praça do Comércio, em Lisboa, na maior árvore de Natal da Europa. Tem 72 metros de altura (o que corresponde a 23 andares) e uma estrutura de 170 toneladas de peso. A sua montagem envolveu 350 pessoas, ao longo de 44 dias consecutivos de trabalho.
Amigos, esta é

A MAIOR ÁRVORE DE NATAL DA EUROPA

Nós portugueses somos assim. Ou somos uns perfeitos incapazes, ou se fazemos alguma coisa de jeito, temos que ser sempre os melhores da Europa ou até do Mundo.

Ainda há dias, no Algarve, milhares de pessoas assistiram à confecção (e até o comeram) de um bolo-rei que era tão comprido, tão comprido, que se candidatou a entrar para o Guiness. A exemplo, de resto, do que aconteceu com a célebre feijoada que celebrou a inauguração da Ponte Vasco da Gama.

Assim somos. Na falta de outros motivos de orgulho vamo-nos deleitando com estes pequenos luxos de país de terceiro mundo *.

A todos, desejo

BOM NATAL

FESTAS FELIZES

e … cuidado com o excesso de doces e de álcool

BOM ANO DE 2006


* Atenção, eu não disse que éramos um país de 3º. Mundo. O que eu escrevi é que esses pequenos luxos eram de país de terceiro mundo. Entenderam?

Estarei de volta no dia 5 de Janeiro do próximo ano. Até lá!


terça-feira, dezembro 20, 2005

Diferentes maneiras de contar 5 minutos

De uma maneira geral é perigoso generalizar. Sobretudo se estamos a falar de pessoas. Há a consciência que as pessoas não são todas iguais, que têm diferentes formas de sentir e de exteriorizar as suas convicções e emoções.

Por isso, quando se fala de um determinado grupo profissional, corporativo, político, social, religioso ou o que seja, não devemos emitir uma opinião sobre ele, como se aquilo que dizemos sirva como uma luva a todas as pessoas desse grupo.

No entanto, machismos à parte e assumindo correr tal perigo, arrisco a dizer que é muito diferente a interpretação que homens e mulheres fazem de um mesmo período de tempo.

Enquanto que o homem está condenado a esperar três quartos de hora, pelo menos, que a mulher se acabe de arranjar, depois de ela lhe ter dito que em cinco minutos estaria pronta, a mesma mulher exige que os cinco minutos que o marido lhe disse que faltavam para terminar o jogo de futebol a que ele estava a assistir na televisão, sejam exacta e escrupulosamente cinco minutos e não seis ou dez.
Afinal, quem é que iria adivinhar que, no último minuto da partida, a equipa adversária ao empatar o jogo, levaria o seu clube a mais meia hora de prolongamento?

segunda-feira, dezembro 19, 2005

O adeus ao selo




A notícia apanhou-me completamente de surpresa e confesso que me deixou muito preocupado: o selo tem os seus dias contados.
Vamos deixar de poder colá-lo no canto superior direito das cartas.
Ao que parece, o selo está seriamente ameaçado, não só pelas novas tecnologias de comunicação, como pelas modernas máquinas de franquiar dos correios e das empresas, pelo que, a sua utilização, poderá resumir-se, em breve, a uma mera peça de colecção.

Os responsáveis dos correios dizem que, cada vez mais, as pessoas comunicam por SMS e por e-mail e não tanto por carta, aquela mesma carta que, ainda há poucos anos, constituía um meio de correspondência por excelência, sobretudo pela proximidade pessoal que transmitia.

Assim, a subsistência do nosso selo, parece resumir-se ao mercado filatélico, já que os coleccionadores continuam a reivindicar a sua emissão.

Mas, e eu? Como é que eu vou resistir a tamanha perda? Como vou aguentar o suplício de não poder saborear a cola que os selos têm? Um hábito que estava tão enraizado na maioria dos portugueses de há uns anos atrás, e que foi de resto transversal a várias gerações, que utilizaram sistematicamente a língua para lamber o verso do selo, na tentativa de conseguir alguma aderência ao papel da carta.

Mas preocupa-me, ainda, uma outra coisa. Com a diminuição da circulação das cartas, o governo poderá vir a entender que não valerá a pena manter o serviço tal como hoje o conhecemos (e, então, adeus carteiros deste país) e, assim, determinar que essas poucas cartas ainda sobreviventes, possam vir a ser transportadas pelos novos “funcionários”, pombo azul e/ou pombo verde, que substituirão os antigos correio azul e correio verde, respectivamente.

sábado, dezembro 17, 2005

Louçã desiste da corrida a Belém


Passadas poucas horas depois de, no “lado a lado” Soares/Louçã, transmitido pela SIC, Francisco Louçã ter respondido que se fosse eleito Presidente da República usaria gravata sempre que necessário, este candidato anunciou que se o governo não alterar imediatamente a política de financiamento da campanha eleitoral para a Presidência da República, o qual venha a contemplar um suplemento especial destinado à aquisição de gravatas,
ele desistirá da corrida a Belém, a favor do candidato do Partido Socialista Mário Soares.
O anúncio foi feito hoje de manhã, na sede de campanha de Francisco Louçã.
Em fundo podia ver-se um cartaz onde se lia
Olhos
nos olhos
Subsídio para gravatas

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Alentejanos

“O que é que os Alentejanos fazem ao fim de um dia de trabalho?Tiram as mãos dos bolsos”

Anedotas como esta sobre alentejanos, quando bem contadas e se usado convenientemente o característico e delicioso sotaque da região, fazem as delícias de qualquer encontro.

O pior é que, para além da graça das próprias anedotas, a maioria delas tem implícita a ideia de que os “compadres” são um tanto ou quanto lerdos e que gostam demasiado do descanso.

“Sabem porque é que os alentejanos são baixos?Porque quando são crianças, os pais dizem:- Come tudo filho, para quando fores grande ires trabalhar”

Estão a ver a ideia?

Claro que, quem gosta de contar este tipo de anedotas, jura a pés juntos que, no fundo, não pretende diminuir quem quer que seja, antes deseja manifestar o respeito, o apreço e o carinho que têm pelos alentejanos.

“Tá bem, dexa …”

Só que, e há sempre o reverso da medalha, quando são os próprios alentejanos a contar as anedotas, sabem-nas escolher, de modo a fazer realçar a sagacidade, a inteligência e a graça que são uma característica da sua personalidade.

“Por que é que o Alentejo é um deserto? É para que os camelos dos Lisboetas façam a travessia para o Algarve”

Toma e embrulha…

Mas, piadas à parte, penso que a maioria das pessoas tem um carinho muito especial pelos nossos amigos do Além Tejo.

Razão acrescida agora, de resto, para sentirmos especial carinho e admiração, uma vez que foi anunciado que a cidade de Évora, capital do Alto Alentejo, é uma das “smart communities” seleccionadas pelo Intelligent Community Fórum para a eleição das “Sete Cidades Inteligentes de 2006”. O galardão distingue as cidades com melhores modelos de banda larga e tecnologias de informação, que vão ser anunciadas em 17 de Janeiro em Honolulu (Hawai).

Grande motivo de orgulho para Évora, para o Alentejo e para Portugal. Só não sei se, a partir de agora, os alentejanos, com a alta estima ao rubro, não vão querer passar a chamar à sua região AquemTejo, em vez de Alentejo.

quarta-feira, dezembro 14, 2005

Ainda Sobre a Boa Educação

Os comentários que aqui foram feitos a propósito do texto “A Boa Educação Também se Aprende” levaram-me a considerar que faria todo o sentido voltar ao assunto. Aliás, não só os comentários mas, também, uma mensagem que um amigo me enviou pela net.

E começo exactamente por fazer referência a essa mensagem que, resumidamente, me questionava sobre se eu não estaria fora deste tempo. Por outras palavras, o meu amigo perguntava se, actualmente, ainda se justificará uma forma de tratamento como as que eu, no fundo, acabei por defender. E a minha resposta é, claramente, que continua a justificar.

Quanto aos comentários propriamente ditos, parece-me que dois deles estão em sintonia com o que escrevi, mas relativamente ao comentário subscrito pelo nosso companheiro MR, verifiquei que, aparentemente, tem uma opinião diferente da minha. E, porque este é um espaço plural, poderemos discutir livremente os argumentos de cada um.
Ao fim e ao cabo, sinto a necessidade de voltar ao tema porque, para mim, as formas de tratamento têm a ver com questões de princípio.

Antes, porém, gostaria de contar uma pequena história acontecida poucos anos depois da revolução de Abril de 74, numa época em que as mulheres davam passos decisivos para a sua emancipação na sociedade, embora com muitos erros de percurso à mistura e, quanto a mim - o principal – o de quererem afirmar à viva força, uma igualdade total e absoluta com os homens.
E a história é esta. Esperava um elevador e, quando chegou ao piso onde me encontrava, abri a porta e ofereci passagem à senhora que estava ao meu lado. A reacção dela não podia ser mais violenta e inesperada. Disse-me para passar primeiro porque ali, homens e mulheres, eram todos iguais. Lembro-me bem de que chegou a dizer “Dá-me passagem só porque sou uma mulher? Não, nós mulheres temos os mesmos direitos dos homens, você estava primeiro, logo, entra primeiro”.

O que aquela mulher não percebeu é que exactamente por sermos homens e mulheres somos diferentes. Não me refiro ao aspecto físico, naturalmente. Tão-pouco à questão dos direitos e deveres. Felizmente nessa matéria foram conseguidos resultados importantíssimos e decisivos para uma igualdade entre os sexos, muito embora, por enquanto, ela só se registe verdadeiramente ao nível da legislação.
Mas a verdade é que somos definitivamente diferentes. E é exactamente nessa diferença que se encaixam na perfeição as tais regras de cortesia e de amabilidade a que chamei regras de boa educação.

Por exemplo, regras como a de um homem abrir uma porta para deixar passar uma senhora, a de um homem subir ou descer uma escada à frente da senhora, a de o homem dar a parte de dentro do passeio a uma senhora, a de o homem abrir a porta do carro para a senhora entrar, a de o homem segurar/ajustar a cadeira para a senhora se sentar e, eu sei lá, tantas outras manifestações de cortesia, como … o tratamento por Srª. D. Maria João (ou, simplesmente, D. Maria João) mas nunca, e jamais, por senhora Maria João.

Reparem que eu estou apenas a dar exemplos de manifestações de cortesia na relação homem/mulher. Mas, algumas delas, e muitas mais, poderiam ser evocadas em outros tipos de relação, nomeadamente com as pessoas mais velhas.

Voltando, agora, ao comentário do MR, devo confessar que desconheço como e quando começou a forma de tratamento em apreço. Mas é legítimo pensar que o tratamento por dona é, em si mesmo, um tratamento respeitoso, provavelmente originado na monarquia, onde os nobres eram todos dons e donas e não consta que essas donas, assim fossem tratadas por serem donas de casa. Quanto à questão que levanta dos apelidos das senhoras, penso que actualmente ela já não se coloca. Como se sabe, hoje em dia há muitas mulheres que adoptam os nomes de família dos maridos mas, muitas outras, preferem manter os seus próprios nomes de solteiras.
Mas estou de acordo consigo, MR, quando diz que há gente de todas as idades que são muito mal-educados. É verdade que sim, infelizmente. E sou capaz de concordar também consigo (pelo menos em parte) quando refere que este tipo de tratamento não é uma questão de boa educação mas trata-se, isso sim, de uma convenção e que a boa educação vai para além das convenções. De facto, a boa educação vai para além de todas as convenções e, exactamente por isso, é necessário que se estimulem as pessoas a terem padrões de comportamento adequados à vida em sociedade, nomeadamente, a serem pessoas educadas e respeitosas. Por isso, quanto a esse tratamento não passar de uma mera convenção, não sei o que lhe diga. Há boas e más convenções e, se esta for boa, então, que se mantenha.

Mas, independentemente dos conceitos que cada um de nós tem sobre o que é, ou o que deve ser, a educação e para além do tema não se esgotar com os exemplos atrás referidos, atrevo-me a dizer, correndo o risco de me chamarem (pelo menos) “cota”, que apesar de poderem estar em desuso certas regras de delicadeza, elas continuam a ser apreciadas pela maioria das mulheres e, curiosamente, por muitas mulheres jovens.
O que acho é que muitos homens jovens ainda não perceberam isso …

terça-feira, dezembro 13, 2005

Gestor Poupadinho


Já aqui tenho escrito sobre alguns casos de má gestão das empresas públicas e de “aproveitamentos” dos dinheiros públicos por parte dos administradores dessas empresas.

E, “água mole em pedra dura …”, faz com que, por vezes, as críticas sejam ouvidas e se consigam resultados como aquele que agora nos chega do Hospital Infante D. Pedro, em Aveiro.

O Conselho de Administração do Hospital, comprou 3 carros novos para os administradores que entraram recentemente em funções. O custo dos três carros foi de 72 mil euros, pelo que, em média, cada carro terá custado qualquer coisa como 24 mil euros o que, convenhamos, não é assim nada de especial.

Mas o que eu achei curioso nesta notícia, dada em tempo de contenção de despesas e provavelmente em nome da tão falada transparência das contas públicas, foi a explicação que o administrador do Hospital de Aveiro entendeu prestar aos contribuintes. É que o contrato dos gestores prevê a compra de um carro para cada administrador até ao montante de 35 mil euros. Como foram comprados três, a um preço unitário bastante mais baixo, conseguiu-se poupar 33 mil euros.

Muito bem, senhor gestor, o povo agradece …

segunda-feira, dezembro 12, 2005

O Verdadeiro Alegre?



"EU É QUE SOU O MANUEL ALEGRE"

Esta a declaração de Manuel João Vieira, vocalista dos grupos Ena Pá 2000 e Irmãos Catitas, aquando da apresentação da sua candidatura presidencial.

A frase caiu como uma verdadeira bomba e surpreendeu todos os presentes.
Afinal, ele, Manuel João, é que é o verdadeiro MANUEL ALEGRE.

Mas para quem tem acompanhado a carreira política, perdão, queria dizer a carreira artística de Manuel João ao longo dos últimos anos, sabe bem que a afirmação corresponde à verdade. Ele é, de facto, muito mais alegre que o outro Alegre, o político poeta.

E se ele se mostra tão credível como candidato à Presidência, também não temos motivos para duvidar que ele vai cumprir uma das suas promessas eleitorais, sempre reafirmada em todas as campanhas a que concorre.

“Quando tomar posse como Presidente da República, a minha primeira medida é demitir-me”.

domingo, dezembro 11, 2005

Contrastes




Apesar de estarmos a viver uma época de profunda crise económica e das grandes dificuldades sentidas pela população em geral, a campanha de recolha de alimentos promovida, há dias, pelo Banco Alimentar Contra a Fome conseguiu estimular milhares e milhares de cidadãos anónimos e de empresas e, o resultado de toda essa solidariedade, traduziu-se em mais de mil toneladas de alimentos, um aumento de quase 19% em relação à campanha de Dezembro do ano passado.
Estamos, pois, todos de parabéns por nos termos associado a uma causa tão nobre.

Mas, claro está, neste tipo de iniciativas, ninguém é obrigado a dar. Quem não acredita n
a causa, quem não tem possibilidades de ajudar ou, ainda, quem não ajuda porque, ela própria, também necessita de ajuda, não contribui. Pelo que, mais uma vez nesta campanha, deu quem quis ou quem poude.

No entanto, em três pequenas histórias a que eu assisti durante o fim de semana da recolha, vejam como a motivação das pessoas, para dar ou para não dar, pode ser tão diferente.


1ª. História

A manhã estava muito chuvosa e a convidar as pessoas a ficarem em casa. Uma senhora já bastante idosa, com dificuldade em andar e apoiada por duas canadianas, chegou junto dos voluntários e disse-lhes:
“Não precisava de nada do supermercado mas, porque pensei que outros necessitam de ajuda, vim de propósito para contribuir”
E, distribuindo um sorriso doce, dirigiu-se para o interior do super, andando vagarosamente, com evidente sacrifício físico.

2ª História

Numa das grandes superfícies da Grande Lisboa, encontrei um amigo que não via há muito. A conversa começou animada e tentámos pôr em dia tantos assuntos em atraso.
Antes da despedida, disse-lhe, meio a sério meio a brincar, para não se esquecer de entregar o saquinho à saída aos voluntários do Banco Alimentar.
O ar afável que o meu amigo ostentara até aí desapareceu e a postura tornou-se agressiva, provocadora até:
“Para esses gatunos não dou nem um grão de arroz”.
“Mas, porque é que dizes isso?...” perguntei,
“Porque mais de metade do que se dá, é vendido lá fora…”
Ainda tentei argumentar mas ele, decidido, exclamou:
“Não, já disse, são gatunos e por isso não levam nada”
E, voltando-me as costas, desapareceu a caminho das caixas.

3ª História

Um deputado da nação, por sinal um daqueles políticos que até são bem conhecidos do grande público, entrou no supermercado e foi abordado por dois jovens voluntários que tentaram entregar-lhe o saco do BA.
O senhor deputado passou por eles num rompante, não lhes prestou a menor atenção e nem sequer se dignou falar com os dois jovens, mesmo que fosse para lhes dar um não. E seguiu em frente sob o manto da sua “importância”.

Como disse, percebo perfeitamente quem não possa ou não queira contribuir, mas já não consigo admitir a arrogância e a má formação de algumas pessoas.

Como aconteceu com a triste figura que fez o meu amigo ao demonstrar, no mínimo, má informação e lamentável intolerância.
Como aconteceu com o senhor deputado, de postura altiva e arrogante, que ignorou aqueles jovens que estavam a colaborar voluntariamente, porque acreditavam que a sociedade pode ser melhor e mais solidária.

Perante histórias como estas, temos que insistir na informação. É absolutamente indispensável que se proceda a uma maior divulgação da obra do Banco Alimentar, de modo a que essa gente quando não tiver interesse em colaborar o faça, unicamente, por esse motivo e nunca por suspeição de que alguém se anda a aproveitar da generosidade de tantos.

A finalizar, um beijinho para aquela senhora idosa e anónima que foi, ela própria, um verdadeiro exemplo de solidariedade.

segunda-feira, dezembro 05, 2005

A Boa Educação Também se Aprende


Acreditem que se há coisas com que eu afino de verdade, é a de me tratarem por “Senhor Mário”. Sei lá, é uma coisa que me arrepia e quase me leva a responder “Olhe, senhor Mário era o seu …”

Talvez eu seja antiquado, não sei! O que sei é que, noutros tempos, se ensinava aos miúdos como se deviam tratar os adultos. Aos homens pelo apelido e às senhoras pelo primeiro nome, antecedido de senhora dona.
O senhor António Silva Borges era o Sr. Borges e, a esposa, Miquelina Antunes Horácio Borges era a Sr.ª D. Miquelina.
Este era o tratamento que estava incluído nas regras de boa educação que, como disse, se ensinava desde cedo.

Mudaram-se os tempos, foram-se perdendo certos valores e, entretanto, chegou-nos dos “states” um outro tipo de tratamento. Aliás dois, e que depressa se impuseram.

O primeiro deles, foi o de passar a haver uma certa liberalização, um certo intimismo no relacionamento que fez com que as pessoas se passassem a tratar apenas pelo primeiro nome. Era o António, o Mário, a Leopoldina.
No outro, que apareceu logo de seguida, as pessoas tratavam-se na mesma pelo primeiro nome mas, para lhe dar um pouco mais de formalismo, juntavam-se aos nomes próprios a indicação de senhor ou senhora, conforme os casos. Passaram, então, a ser o senhor António (ou, às vezes, o shôr António), o senhor Mário e a senhora Leopoldina.

E se
, com o primeiro, enfim, sobretudo entre colegas de trabalho a quem, no dia a dia, se dispensa uma formalidade por aí além, eu até estou de acordo, quanto ao segundo tipo de tratamento não posso estar mais em desacordo. Acho mesmo que, no mínimo, é um tratamento de mau gosto, mas é sobretudo, um tratamento de má educação.

E, na minha opinião, ele verifica-se não porque os costumes se alteraram, mas porque as pessoas que os utilizam não foram devidamente ensinadas ou, provavelmente, quem as ensinou também desconhecia essa forma básica de cortesia e de boa educação.

Ainda nos últimos dias tive a oportunidade de ser presenteado com as duas formas de tratamento. A primeira aconteceu na Caixa Geral de Depósitos, onde fui atendido por uma funcionária que aparentava estar na casa dos cinquenta anos. Tratou-me por Sr. XXX (apelido). A segunda, veio de uma diligente, simpática, bem-falante e educada empregada de uma loja de electrodomésticos que me tratou, do princípio ao fim, por sr. XXX (primeiro nome).
E se já disse que a simpática atendedora até era educada, porque razão não me tratou ela pelo apelido? Provavelmente porque nunca a ensinaram.

E este tipo de tratamento generalizou-se de tal forma pelo comércio em geral, pelos centros de atendimento das empresas (João Paulo, eu sei que são mais conhecidos por “call centers”), por tudo quanto é sítio, que eu tenho receio que seja assimilado rapidamente por todos. Se é que o não foi já!

Mudam-se os tempos mas será que se mudaram as regras de educação?

domingo, dezembro 04, 2005

Até quando?

Não paro de me interrogar. Os dias vão passando, já lá vão oito meses desde que tomou posse e, todas as semanas são anunciadas novas medidas que vêm mexer em interesses instalados há muito. Até quando, Engenheiro Sócrates, vai aguentar todas as pressões que lhe são dirigidas de todos os quadrantes, sem que se deixe desfalecer?
A agitação social está ao rubro. Pudera, o que me admiraria é que estando a pôr em causa tantos privilégios, esses senhores não começassem a fazer uma guerra dos diabos.

Mas, Engº. Sócrates, o senhor foi mais papista que o Papa. Então deu-lhe para questionar uma data de coisas em meia dúzia de meses, coisas essas que os sucessivos governos (incluindo os do seu próprio partido) desde há trinta anos nunca quiseram pegar, nem ao de leve que fosse?
Aliás, eu acho que não lhe fez nada bem ter ouvido o Major Valentim Loureiro afirmar que o senhor era um homem de coragem. É que, notou-se, encheu-se de brios e vá de querer imitar o major-valentão a saltar para a praça pública e a disparar em todas as direcções : “quantos são, quantos são?”.

Começou logo no discurso de posse quando desafiou o lobby das farmácias - sector intocável! - e jurou que os medicamentos sem prescrição médica iriam ser vendidos noutros locais. Não terá começado mal?

A partir daí tem sido um nunca mais acabar. Enfrentou as polícias, as magistraturas, os professores, a administração pública, os laboratórios farmacêuticos, as moageiras, os sindicatos e, máximo dos máximos, teve a ousadia de mandar investigar instituições financeiras suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais.

Mais, acabou com os dois meses de férias dos tribunais, aumentou a idade de reforma, terminou com muitos dos privilégios dos políticos e, pela primeira vez em tantos anos, sente-se uma vontade determinada em atacar a corrupção.

Mais ainda, tem posto cobro a múltiplas situações inacreditáveis de clientelismo e fraude nas empresas públicas e sabe-se que a Autoridade da Concorrência está de olho em muitas empresas e sectores, para pôr cobro aos cartéis existentes.

E, agora, até quer mandar retirar os crucifixos das escolas? Das mesmas escolas que acolhem muitas crianças dos mais diversos credos. Das mesmas escolas que são do Estado, do mesmo Estado que até é laico?

E já não quero falar das montanhas de problemas que lhe caíram em cima com projectos tão polémicos como os da Ota e do TGV.

Em muito pouco tempo o governo, que o senhor dirige, incomodou os mais poderosos sectores da sociedade. Por acaso pensou que muitos desses interesses instalados contavam que se eternizassem a incompetência e a desonestidade dos múltiplos governantes que por aí passaram?
Já viu como poderia andar descansado a esta hora se embarcasse na inércia em que o país mergulhou há muitos anos?

É preciso coragem para tão grande empreitada. Os portugueses já quase não acreditavam que um dia ainda iriam ter um governo sério, que quisesse mesmo resolver os problemas do país. A desilusão estava instalada.

E é por isso, por essa coragem, pela honestidade e pela determinação em querer fazer de Portugal um país, que lhe pergunto, com toda a admiração:
Até quando vai conseguir aguentar, Sr. Engº. José Sócrates?

terça-feira, novembro 29, 2005

A Idade dos Porquês

A brasileira Adriana Calcanhoto tem no seu reportório um poema intitulado “oito anos”. A canção é muito engraçada e os versos retratam bem a curiosidade própria dos miúdos dessa idade.

Quem tem ou já teve crianças nessas idades, sabe que eles tudo questionam e a toda a hora, e sabe bem como é difícil dar resposta à maioria das perguntas, pelo menos respostas coerentes e que façam algum sentido.

Por vezes, os miúdos lembram-se de perguntar as coisas mais estranhas (ou mais simples), deixando os adultos embaraçados, quantas vezes confusos, e porque se calhar nunca tinham pensado naquelas questões, acabam por responder com um “Não sei”, quando muito com um “Sei lá”.

Vejam só, e digam-me se tenho razão:

“Porquê você é Flamengo e meu pai Botafogo?
O que significa impávido colosso?
Porquê os ossos doem enquanto a gente dorme?
Porquê os dentes caem?
Por onde os filhos saem?

Porquê os dedos murcham, quando estou no banho?
Porquê as ruas enchem, quando está chovendo?
Quanto é mil trilhões vezes infinito?
Quem é Jesus Cristo?
Onde estão meus primos?

Porquê o fogo queima?
Porquê a lua é branca?
Porquê a terra roda?
Porquê deitar agora?
Porquê as cobras matam?
Porquê o vidro embassa?
Porquê você se pinta?
Porquê o tempo passa?

Porque é que a gente espirra?
Porque é que as unhas crescem?
Porque é que o sangue corre?
Porque é que a gente morre?

Do que é feita a nuvem?
Do que é feita a neve?
Como é que se escreve reveillon”

Quando ouço a Adriana cantar imagino as crianças a fazer perguntas. E, tal como elas, ponho-me a pensar “Porque é que as unhas crescem?” E, tal como elas, também me dá vontade de perguntar:

“Porque é tão grande o fosso entre ricos e pobres?
Porque é que, às vezes, o amor dói?
Porque é que não valorizamos o que temos?
Porque é que a gente mal nasce começa a morrer?
Porque é que depois de chegar, temos que partir?
Porque é que os jogadores de futebol cospem tanto?
Porquê não dizemos amo a quem gostamos?
Porquê o tempo passa?”

domingo, novembro 27, 2005

Licenciados e desemprego

Na última semana os jornais noticiaram que o desemprego em Portugal atingiu em Setembro último, o nível mais alto desde 1998, chegando aos 7,7% e afectando qualquer coisa como 430 mil portugueses.
Segundo alguns especialistas, o aumento do desemprego era inevitável. Talvez pela conjuntura internacional, talvez por culpa da globalização, talvez pela incapacidade dos sucessivos governos em desenhar planos de desenvolvimento que pudessem inverter a situação. E será que, também, por falta de formação?
Acredito que todas essas hipóteses tenham contribuído para o descalabro que se afigura muito preocupante mas, relativamente à educação, é bom dizer que Portugal tem sido dos países onde mais se investe na educação em termos de PIB, nomeadamente no ensino superior. Então, se é gasto tanto dinheiro na educação e se, cada vez mais, saem tantos licenciados das universidades, porque é que se continua a falar tanto na falta de preparação dos portugueses e porque é que uma boa percentagem desses desempregados é ocupada exactamente por licenciados?

Bem, eu tenho uma teoria sobre o assunto. É que, para mim, no actual sistema educativo, ser licenciado não representa um atestado de competência, mas uma mera credencial em como um indivíduo frequentou o ensino durante uns quantos anos e cumpriu certas formalidades legais. Ou, como dizia o Professor Adriano Moreira nas suas aulas: “a licenciatura é apenas a licença para aprender”.

Na verdade, os jovens de hoje, do ponto de vista da sua preparação académica, são claramente mais credenciados do que eram os jovens de gerações anteriores. No entanto, regista-se uma grande discrepância entre as competências transmitidas pelas escolas e universidades e aquilo que é exigido pelas empresas. Isto porque o sistema não consegue ajustar os programas escolares às exigências do mercado de trabalho e da sociedade.

Em Portugal o Estado não impõe uma "educação obrigatória" mas uma escolaridade obrigatória, que é uma coisa bem diferente.
O que o Estado certifica é que um jovem cumpriu um determinado número de anos de escolaridade e não que ele possui um certo número de competências relevantes. Este sistema não produz competências, produz formalidades. E, claro está, que os empregadores não estão mesmo nada interessados em pagar um salário a quem provou ter frequentado a escola durante uns anos. O que os empregadores procuram são competências, ou seja, dito de outro modo, querem quem esteja preparado para trabalhar.

Da mesma forma no ensino superior, aquilo que o Estado atesta a um jovem recém-licenciado é que ele possui uma licenciatura, isto é, que ele cumpriu um certo número de formalidades, tais como ter uma escolaridade de quatro ou cinco anos numa universidade oficialmente reconhecida, durante umas tantas semanas por ano, com tantas horas por semana, que frequentou um certo programa de cadeiras numa certa área do saber.

Quanto aos programas e quanto às cadeiras neles incluídos, muito haveria certamente para dizer e, se calhar, para dizer mal. Ou, pelo menos, para colocar muitas dúvidas quanto ao interesse real de algumas das matérias que fazem parte dos programas dos cursos do ensino superior.
Mas, enfim, estamos a falar dos cursos que temos e, o certo é que todos esses programas e cadeiras são aprovados por um Ministério, dito da Educação, e avalizados por uns senhores professores, que nunca serão avaliados pelo seu "julgamento", ainda que possa não ter sido o melhor. Afinal, professores/burocratas que possuem uma visão tremendamente estática da vida e da sociedade, do mundo real, enfim.

Resumindo, ter uma licenciatura não é sinónimo de ter competência, por muito que isto custe a muitos licenciados. Ter licenciatura, do meu ponto de vista, para além do cartão de visita que isso representa, é possuir uma ferramenta que poderá proporcionar uma melhor compreensão e um melhor aproveitamento das tarefas que o licenciado vai ter que executar no futuro.
Daí que, muitos dos licenciados, só venham a ser competentes depois de algum tempo de trabalho. Não, apenas, por terem um curso, mas porque - com a ajuda desse curso e com as suas capacidades próprias - se tornaram realmente competentes.

E o que é que pensarão os empregadores? Que lhes basta terem um candidato com um curso superior, uma ou duas pós-graduações, um mestrado, talvez até um doutoramento? Afinal, isso prova o quê? Que o candidato ao emprego é muito bom e que vai ser uma mais valia para a empresa? Não, para os empregadores o que todas aquelas certificações provam não é que o candidato sabe trabalhar de facto, mas que, tão simplesmente, teve jeito para estudar.

sexta-feira, novembro 25, 2005

Bocas …

1 -
Título de primeira página do Jornal de Notícias de há uns dias
TGV de Lisboa a Madrid e Porto com atraso de quatro anos
Isto só em Portugal! Como é possível que um comboio, ainda por cima de alta velocidade, se atrase tanto mesmo antes de ser construído?

2
Notícia de última hora
Um dos nossos deputados contraiu gripe das aves. De acordo com os procedimentos universalmente aceites, vai ter que se abater todo o bando!

quarta-feira, novembro 23, 2005

Manhã de Outono


A manhã de Outono estava soalheira e amena, muito embora o vento suave fizesse lembrar que o Inverno se aproximava. E, não fora o trânsito intenso que passava sem cessar, quase se podia dizer que aquela era uma bela manhã.
As árvores centenárias que ladeavam a rua comprida, iam-se despindo lentamente de folhas que caíam nos passeios, formando pequenos tufos verde/amarelados.

Enquanto contemplava aquela beleza bucólica, um varredor ia apanhando as folhas do chão e deitava-as no seu carrinho de lixo. Vagarosamente repetia os gestos que prometiam eternizar-se.

O varredor avançava ao longo da rua e as folhas continuavam a cair. E, uma a uma, voltavam a tecer tapetes na calçada.

É ingrato o trabalho dos varredores nesta época, não acham?

terça-feira, novembro 22, 2005

“Milagres”

Ainda mal tinha completado o texto publicado ontem, em que falava sobre o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa e fui surpreendido por um artigo publicado no Expresso de sábado passado, intitulado “O Milagre das Peras”.

Já toda a gente ouviu falar no “Milagre das Rosas” ou no “Milagre da Multiplicação dos Pães” mas no “Milagre das Peras”, que milagre é esse que nunca ninguém ouviu falar?
Muito simplesmente o milagre de se poder transformar 275 toneladas de peras em vias de se estragarem, em compotas para serem distribuídas a famílias carenciadas pelo Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa (BACF).
A coisa parece fácil mas, todos sabemos, que não é tão simples assim. Eu diria mesmo que só a forte e determinada iniciativa da presidente do BACFL e da Federação dos Bancos Alimentares contra a Fome, Isabel Jonet, foi essencial para que o milagre acontecesse.
E a receita utilizada para se fazer esta compota “resumiu-se” a estes ingrediente: as peras foram cedidas pelo INGA, a DAI cedeu parte do açúcar, a Calimenta procedeu à transformação, a Sotancro ofereceu os frascos e a Luís Simões assegurou o transporte. Simples, não acham?
Donde, graças à iniciativa da Isabel Jonet e das diversas boas vontades referidas, desta milagrosa receita resultaram 188 mil frascos que encheram 95 paletes de compota.

E agora, uma vez apanhado o jeito, os milagres não vão ficar por aqui. Há outras ideias do género que já estão a andar, nomeadamente o “milagre do tomate” e o “milagre do peixe”.
No primeiro caso, o BACF conta com a ajuda da Compal (para a transformação) e da Tetra Park (para as embalagens) para transformar 120 toneladas de tomate fresco em 50 toneladas de polpa de tomate.
Quanto ao projecto do peixe, a Federação dos Bancos Alimentares contra a Fome juntamente com o BACF de Setúbal, com a colaboração da Doca Pesca e com a adesão entusiástica dos pescadores, vai congelar 3800 toneladas de peixe que iria ser “devolvido ao mar”. Com este peixe é possível alimentar 100 mil pessoas, com 200 gramas de peixe, todos os dias do ano.

Pois é, ficamos de rastos quando ouvimos falar na forma como se pode evitar o desperdício. E há tanto desperdício por aí.

De uma maneira geral os “milagres” não se questionam, é uma questão de fé.

Mas há milagres que têm que ser ajudados ... perceberam? Volto a lembrar que se realiza já no próximo fim-de-semana, dias 26 e 27 de Novembro a recolha de alimentos do Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa. Colaborem.

segunda-feira, novembro 21, 2005

Dar sim, mas …

Todos nós somos abordados constantemente por alegados membros de “associações de protecção a qualquer coisa”, de “ligas nacionais e humanitárias de …”, de “bombeiros voluntários de…”, de “organizações a favor de…”, enfim, das mais diversas áreas de assistência e solidariedade para pedir a nossa ajuda para uma determinada causa, seja em dinheiro, em géneros ou na compra de um qualquer objecto ou coisa.
E, muito embora, muitas dessas instituições sejam reconhecidamente da mais absoluta confiança, o facto é que, de forma quase inconsciente, muitas vezes somos levados a pensar se o nosso contributo se destina efectivamente à organização que o solicita ou se, pelo contrário, vai reverter para outros fins não identificados, nomeadamente para o proveito de trapaceiros que se sustentam à custa da boa fé das pessoas.
Não duvido que, na maioria dos casos, as razões invocadas sejam as mais justas e as mais credíveis mas, o assalto continuado ao comum do cidadão, começa a ser um exagero.
Ainda há dias num semáforo, uma Corporação de Bombeiros Voluntários não sei das quantas (ainda por cima de uma terra que fica a mais de 50 km da capital) me pediu para os ajudar. Depois, quando cheguei ao supermercado, pediram-me para comprar um boneco a favor de uma instituição de assistência social. Ao sair, junto ao parque de estacionamento, pediram-me uma contribuição para a luta contra já não sei o quê.
Tudo isto, quase no mesmo sítio e num curtíssimo espaço de tempo.
Naquele momento, juro que cheguei a pensar que se a pedinchice continuasse àquele ritmo, não me restaria outra hipótese do que montar a minha própria banca para promover uma recolha de fundos a favor de … mim.
Mas a verdadeira questão é esta. É que, para além do facto dos portugueses não terem – ainda que o quisessem – a possibilidade de contribuir para todas as causas que consideram justas, existe um outro problema. Na maioria dos casos não se conhecem essas instituições nem fazemos ideia da sua obra.

Essa questão não se coloca relativamente à instituição de que vos vou falar hoje – O Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa. Uma instituição reconhecida como “Instituição de Superior Interesse Social”.
Trata-se de uma organização bem estruturada e da máxima confiança, que luta contra o desperdício alimentar para minorar as carências alimentares de pessoas comprovadamente necessitadas.
Com a colaboração de uma lista numerosa de empresas doadoras de produtos e de serviços, com a generosidade de muitos particulares e com a dedicação de um grupo de voluntários e funcionários, o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa (BACF) recebe os alimentos dos doadores e distribui-os às Instituições Beneficiárias.
E para que tenham uma ideia da dimensão da acção do BACF de Lisboa, referirei que em 2004 foram recolhidos 6.750.249.71 de quilos de produtos, os quais foram distribuídos por 258 Instituições, envolvendo um total de 54.210 pessoas assistidas. Tudo isto com instituições que mantêm um acordo com o BACF.
Relativamente às instituições que ainda se encontram em lista de espera, o BACF não as esqueceu e, mesmo a essas, entregou 309 toneladas de alimentos. É obra!
Mas para responder àquela dúvida que se coloca, tantas vezes, a quem dá - se os alimentos vão mesmo parar às pessoas que precisam - direi o seguinte:
O BACF acompanha em permanência as diversas instituições de solidariedade social com três objectivos principais:
- assegurar que os produtos sejam efectivamente entregues a quem deles necessita;
- evitar os desperdícios;
- e, naturalmente, inviabilizar as utilizações indevidas.
Deste modo o BACF recebe os alimentos dos doadores, distribui-os e assegura-se que eles chegam ao seu verdadeiro destino, ou seja, às pessoas carenciadas.
E, se alguma vez, se detecta algum procedimento inadequado por parte de alguém de qualquer Instituição, o BACF suspende imediatamente o fornecimento de alimentos.
Por tudo isto, o BACF é uma organização que merece toda a nossa confiança.

Porém, o Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa só pode dar aquilo que recebe. E recebe durante todo o ano das empresas doadoras a maior parte dos alimentos que redistribui, quer ao nível dos chamados produtos frescos, quer dos não perecíveis.
A restante ajuda chega através das doações efectuadas pelos particulares – por nós consumidores – nas duas recolhas em Abril e em Novembro de cada ano – efectuadas em diversos supermercados e hipermercados da zona de Lisboa.
E é muito reconfortante constatar que, nestas recolhas anuais, as pessoas, apesar das dificuldades sentidas, estão de ano para ano mais participativas e mais solidárias. Sente-se que existe a consciência de que “Há quem viva muito pior do que nós”

Dito isto, quero convidar-vos a participar na próxima recolha de alimentos que se realizará nos próximos dias 26 e 27 de Novembro – portanto, já no próximo fim-de-semana.
Vamos estar juntos por uma boa causa. Tenho a certeza que se vão sentir muito mais felizes por estarem envolvidos neste grande movimento de ajudar a quem necessita mais.

domingo, novembro 20, 2005

As ruas do nosso Estado (ou estado das nossas ruas)

Com excepção do fatídico momento em que um dos pneus do nosso carro cai redondamente num buraco, já se deram bem conta do estado miserável em que se encontram os pavimentos da generalidade das nossas ruas?

São ruas cheias de buracos e com falta de alcatrão. São ruas com rasgões profundos provocados por obras diversas, que as atravessam em toda a sua largura e que, ainda por cima, estão todos muito mal remendados. São ruas com alcatrão a transbordar sobre os passeios ou, não caso raro, com os lancis demasiados altos e sobranceiros ao alcatrão. São ruas feitas de paralelepípedos, a maior parte das vezes impróprias para a circulação automóvel.
São, enfim, as ruas onde nunca encontramos a conjugação perfeita, a harmonia desejável entre os pavimentos e as diversas caixas de esgotos, de electricidade, dos telefones ou do que quer que seja. Ou as caixas estão mais altas do que os pavimentos ou estes estão acima das caixas. Nunca quem efectua estes trabalhos, consegue colocar os dois ao memo plano.

E quem é que são os verdadeiros prejudicados com esta situação? Para já, os próprios carros que ficam cheios de ruídos, com direcções desalinhadas, que ficam com os tampões amolgados, ou sem eles, que batem após os despistes provocados por alguns buracos mais manhosos. Depois, são prejudicados os proprietários dos carros que têm que pagar chorudas contas das oficinas.

É que, cá pelo burgo, esventrar as ruas para os mais diversos trabalhos é um acto rotineiro. O que já é raro, é ver fechar as mesmas ruas duma forma correcta, ou seja, proceder à sua repavimentação e não, tão-somente remendá-las, como, isso sim, parece ser rotineiro.

Mas a rapaziada já se habituou de tal forma a este estado de coisas que, no dia a dia, limitamo-nos a resmungar e pronto, no fundo já não damos muita importância ao assunto. E só reagimos quando, um dia (quase sempre de noite e com chuva) o nosso querido carrinho se lembra de cair redondamente num buraco.

quinta-feira, novembro 17, 2005

A Bandeira do Santana, uma vez mais

Sem que seja necessário tirar uma vírgula ao que escrevi em 19 de Setembro sobre a bandeira portuguesa, “plantada” por Santana Lopes no alto do Parque Eduardo VII, em Lisboa, terei forçosamente de acrescentar mais alguma coisa à história, que só agora veio a público, para a completar … por agora.

E esse aditamento tem a ver com a visita que um miúdo, o Tomás Carvalho, de nove anos, efectuou a Madrid com os pais e com a forma com que ele ficou impressionado perante a grandeza da bandeira de Espanha, erguida na Plaza Colón.
No regresso, decidiu escrever uma carta ao Presidente da República a sugerir que fosse colocada uma bandeira de Portugal na cidade de Lisboa. Jorge Sampaio respondeu a Tomás Carvalho, agradecendo a sugestão e dizendo que ia pôr a ideia à consideração do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Bem, o resto já se sabe. O Presidente da Autarquia (não sei se foi Santana ou Carmona) concordou com a sugestão do Tomás e a nossa bandeira (inaugurada por Santana Lopes, aí não restam dúvidas) lá está, garbosa e a ondular ao vento.

quarta-feira, novembro 16, 2005

O seu a seu dono

Antes de mais, e para que não subsistam dúvidas quanto à isenção das minhas opiniões, devo dizer que não tenho uma simpatia por aí além pela Teresa Ricou, a conhecida “mulher-palhaço”.
E se me perguntarem porque razão é que eu não simpatizo com a senhora (que até nem conheço, a não ser dos meios de comunicação social), digo-vos com toda a franqueza que não faço a mínima ideia. Deve ser uma questão de pele ou, talvez, por ser uma mulher palhaço, que é uma actividade pela qual eu tenho o maior respeito mas com que nunca tive uma grande afinidade.
Declarado o princípio, há que dizer que trabalho é trabalho e conhaque é conhaque, pelo que, muito embora eu não simpatize com a Teresa Ricou não significa isso que não lhe reconheça um enorme mérito no trabalho que vem desenvolvendo há anos.
Na verdade, esse trabalho da mulher-palhaço não é muito conhecido. Ou antes, quando se ouve falar na Teresa Ricou e no seu Chapitô, pensa-se, de uma forma geral, numa escola de arte, vocacionada sobretudo para o circo, mas essa ideia representa uma parte muito limitada da actividade daquela escola.
A escola artística “O Chapitô” é, de facto, uma escola de arte mas é, também, um local que desenvolve há 25 anos em Lisboa, um trabalho de Acção Social destinado a integrar na sociedade as crianças e os jovens em situação de risco, através de actividades artísticas.
Mais, o Chapitô (onde já trabalham 120 pessoas) é uma associação privada sem fins lucrativos, criada em 1981, que presta um serviço cultural, social e educativo, ao cruzar o ensino e o divertimento com a intervenção social, através das artes e do espectáculo.
Também na área da Acção Social, o Chapitô está actualmente a construir uma residência aberta para jovens maiores de idade e que vivem em situações de risco.
Assim, e pelo conjunto da sua obra, a escola artística Chapitô, na pessoa da sua fundadora, recebeu recentemente no Parlamento Europeu em Bruxelas, o prémio europeu "Rosa de Prata", atribuído anualmente pela organização não-governamental Solidar, como reconhecimento pelo seu serviço na área social. Os prémios "Rosa de Prata", destinam-se a reconhecer pessoas ou organizações que trabalhem junto da sociedade civil para criar um mundo mais justo.

E justo, é exactamente a palavra adequada para definir o meu sentimento quanto à atribuição deste galardão. Em Portugal, onde o Estado não consegue dar resposta a muitas das carências mais básicas de tantas e tantas pessoas, o papel das instituições não-governamentais é absolutamente fundamental no apoio da população mais fragilizada. Instituições como é o caso do Chapitô.

Parabéns, pois, à Teresa Ricou pela sua obra em prol das crianças e dos jovens em situação de risco.
Pode-se simpatizar, ou não, com a Teresa mas temos que reconhecer que é uma mulher notável. O seu a seu dono.

terça-feira, novembro 15, 2005

Mais um caso …

No parque industrial português existe uma empresa pública chamada Urbindústria que tem apenas 3 funcionários e uma actividade muito pouco significativa. Tão pouco significativa que, segundo a lei, faz parte das empresas públicas classificadas no Tipo C.
Para além dos tais 3 empregados, a empresa tem 2 administradores. Como se trata de uma empresa do Tipo C, esses administradores deveriam ganhar, naturalmente, como administradores de empresas do Tipo C. E ganham? Não, eles ganham como administradores de empresas do Tipo A. O seu presidente (Hermínio Carreira) recebe 4.753 euros por mês, acrescido de 1.663 euros de despesas de representação e a vogal (Ivone Ferreira) recebe 4.204 euros mensais mais 1.621 euros de despesas de representação. Isto, para além de carros da empresa para uso pessoal, cartão de crédito sabe-se lá de quanto e PPR’s de valor não revelado.
Mas, para que a tão grande azáfama de gerir uma empresa com tantos empregados (3) e de uma tamanha actividade (muito reduzida) tivesse uma retribuição que, minimamente, fosse compensadora, o Estado decidiu atribuir um suplemento de 844 euros mensais aos dois elementos do Conselho de Administração da Urbindústria. E porquê? Porque eles são, também, administradores da Siderurgia Nacional – Empresa de Serviços SA (SNES), uma empresa que até 2001 esteve integrada no grupo das maiores empresas públicas mas que, agora, está ao mesmíssimo nível da Urbindústria. Isto é, quase não tem actividade.

Portanto, o Sr. Presidente e a Srª. Vogal por tão árdua tarefa de gerir uma empresa praticamente paralisada e que não suporta sequer os custos de funcionamento (tal como a SNES), recebem 14 vezes no ano pequenos salários mensais de 7.260 euros e 6.309 euros, respectivamente.

Ainda por cima, e apesar da Urbindústria ter terminado o ano de 2004 com um resultado negativo, cujo défice foi duas vezes superior ao do ano anterior, o Sr. Hermínio e a D. Ivone tiveram ainda direito a um prémio de gestão (que premiou os magníficos resultados obtidos, já se vê) de 15 mil euros e de 13.500 euros.

Mais um caso de empresas públicas em que o dinheiro dos contribuintes está a ser desbaratado. É demais!

segunda-feira, novembro 14, 2005

Ode ao futebol

Confesso que a minha “cultura futebolística” não passa lá muito pela leitura dos jornais desportivos. Raramente os leio. Por sorte, num dos últimos dias, ao folhear o Jornal Record, dei de caras, num espaço de opinião assinado pelo Jorge Gabriel, com um poema que tentava encontrar há anos.

Trata-se da “Ode ao futebol”, escrita pelo poeta Tossan e que, um dia, tive a felicidade de ouvir dizer - pelo próprio poeta - no saudoso programa televisivo “Zip-Zip”, do Carlos Cruz, Raul Solnado e Fialho Gouveia.

Acho o poema muito bem escrito e divertido. Por isso o transcrevo, esperando que os meus amigos – mesmo os que não gostam de futebol – o apreciem devidamente:

“Rectângulo verde, meio de sombra meio de sol
Vinte e dois em cuecas jogando futebol
Correndo, saltando, ziguezagueando ao som dum apito
Um homem magrito, também em cuecas
E mais dois carecas com uma bandeira
De cá para lá, de lá para cá
Bola ao centro, bola fora.
Fora o árbitro!
E a multidão, lá do peão
Gritava, berrava, gesticulava
E a bola coitada, rolava no verde
Rolava no pé, de cabeça em cabeça
A bola não perde, um minuto sequer
Zumbindo no ar como um besoiro,
Toda redonda, toda bonita
Vestida de coiro.
O árbitro corre, o árbitro apita
O público grita
Gooooolllllooooo!
Bola nas redes
Laranjadas, pirolitos,
Asneiras, palavrões
Damas frenéticas, gordas esqueléticas
esganiçadas aos gritos.
Todos à uma, todos ao um
Ao árbitro roubam o apito
Entra a guarda, entra a polícia
Os cavalos a correr, os senhores a esconder
Uma cabeça aqui, um pé acolá
Ancas, coxas, pernas, pé,
Cabeças no chão, cabeças de cavalo,
Cavalos sem cabeça, com os pés no ar
Fez-se em montão multidão.
E uma dama excitada, que era casada
Com um marinheiro distraído,
No meio da bancada que estava à cunha,
Tirou-lhe um olho, com a própria unha!
À unha, à unha!
Ânimos ao alto!
E no fim, perdeu-se o campeonato!”

domingo, novembro 13, 2005

Comemorações

Ao ver espalhados pela cidade, montanhas de cartazes a anunciar a celebração dos 250 anos do terramoto de Lisboa de 1755, confesso que fiquei um tanto ou quanto abazurdido.
O quê, pensei, esta gente quer fazer a celebração de um terramoto? Querem comemorar uma das maiores catástrofes que aconteceram em Lisboa? Esta gente está doida, ou quê? Se calhar, a seguir, até são capazes de quererem comemorar o incêndio do Chiado. Ou até as grandes cheias de Lisboa de 1969. Não, não acredito...

Mas antes que passasse a escrito a minha surpresa, quiçá a minha indignação, tratei de consultar o dicionário para saber quais os diversos significados da palavra comemoração.
E o dicionário “respondeu-me” que o termo pode querer dizer:

- acção de comemorar
- celebração
- recordação
- memória
- lembrança
- preceito em homenagem ou memória de pessoa ilustre ou de facto histórico
importante

Bom, fiquei muito mais descansado. Os promotores da celebração tinham empregue a palavra correctamente. Não pretendiam comemorar (no sentido de celebrar) o terramoto, pretendiam, antes, comemorar (lembrar) a tragédia.

Ainda assim, e para o meu gosto, preferiria que nos anúncios a um evento deste tipo, usassem a palavra memória (quando muito recordação) dos 250 anos do terramoto de Lisboa. Porque, meus amigos, para mim celebração é festa, é alegria.

Como se sabe, a língua portuguesa, para além de traiçoeira, é muito rica e as palavras a usar têm que ser aplicadas criteriosamente.

quinta-feira, novembro 10, 2005

Entre as canções e a política


Nada melhor para uma pessoa que regressa ao país, depois de uns dias de férias lá por fora, do que ler num jornal que uma entrevista de uma conhecida cantora pop (Shakira) dada a um canal de televisão cá do burgo, teve audiências muito superiores à de uma outra entrevista dada – à mesma hora - por um dos candidatos à Presidência da República (Mário Soares) a um canal de televisão concorrente. Nada menos de 32,8% contra 22,9% de audiência média.

Desculpem lá, mas acham isto normal? Eu sei que todos nós estamos um bocado fartos dos políticos e das “tretas” que na maioria das vezes nos tentam impingir. Mas será que os portugueses já se desinteressaram definitivamente da política e preferem ouvir meia dúzia de coisas ditas por uma cantora (por melhor e mais interessante que ela seja) a ouvir o que um dos candidatos à mais alta figura do Estado tem para dizer? Será que o nosso futuro nos interessa tão pouco?

Não sei, mas, no mínimo, acho preocupante …

quarta-feira, novembro 09, 2005

E o Rio de Janeiro continua lindo

Oi!

Tal como prometi, estou de volta depois de umas pequenas férias.

Como os meus amigos (inteligentes e perspicazes como sempre) já perceberam pelo título desta crónica e, também, pelo Oi! com que vos saudei, estive no Brasil, mais propriamente no Rio de Janeiro.
Desta vez num Rio de Janeiro diferente daquele que a maioria das pessoas, e eu próprio, normalmente imagina quando se pensa na Cidade Maravilhosa. De facto, quando se fala do Rio de Janeiro, pensa-se em sol, em calor e em mar. Pois o Rio que eu visitei agora não teve nada disso. Ao contrário, teve muita chuva, muita trovoada e um pouquinho de frio, sobretudo à noite.
Como me disse um motorista de táxi, “o Rio de Janeiro com chuva mais parece um cemitério”.
Bom, mas exageros à parte e mesmo tendo em conta as condições adversas do tempo, a verdade é que o Rio de Janeiro continua lindo. E se é certo que não houve um único dia em que o Cristo Redentor se mostrasse perfeitamente descoberto de nuvens, a ponto de nos deixar admirar as magníficas vistas que se costumam observar do alto do seu Corcovado, ainda assim, vale sempre a pena visitar o Rio. Oh, se vale …

É que a cidade maravilhosa não tem este título por acaso. É um lugar de rara beleza, de muitos rostos e muitos ritmos. O Rio de Janeiro é quase um estilo de vida, de gente alegre e de atractivos naturais e culturais. É a terra do futebol mas também da música. Da música de Tom Jobim, de Vinicius, de Caetano, de Betânia, de João Gilberto e de tantos outros. Da música que está presente no andar insinuante das mulheres e que está patente na forma e no jeitinho de falar dos seus habitantes.

Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil …”, os versos iniciais da conhecidíssima canção de André Filho, convidam a conhecer o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Baía da Guanabara, o Maracanã, a Floresta da Tijuca, a Catedral, os Arcos de Santa Teresa e, naturalmente, todas as praias, cujos os nomes nos fazem sonhar com o doce sabor das ondas e das brisas, Copacabana, Ipanema e o Leblon. É, de facto obrigatório conhecer e admirar, sempre, estes lugares, com bom ou mau tempo.

Mas, tanta e tanta beleza não impede, porém, de constatar que o Rio é, também, uma cidade de profundas assimetrias, de tremenda exclusão social e de favelas de onde emana uma violência assustadora e incontrolável.

Pois apesar desses contrastes, das más condições de vida da maioria da população e da violência, sente-se que esta é a capital da beleza e da sensualidade. É o lugar onde encontramos um povo que nos contagia com a sua simpatia e que nos deixa a sensação, quando partimos, de termos já saudades e de quererermos voltar. E, ao partir, essa melancolia faz-nos trautear canções como “Menino do Rio” ou “Garota de Ipanema”.

Gosto de quem gosta deste céu, desse mar, dessa gente feliz…” como dizia a canção...

Mesmo com muita chuva e sem sol, o Rio de Janeiro continua lindo.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Um primeiro balanço

Estão a completar-se dois meses do “Por Linhas Tortas”. Olhando para o que foi feito – os temas, a participação dos amigos e a periodicidade da publicação dos textos – a questão que se me coloca é “será que valeu a pena entrar nesta aventura?”. Considerando os prós e os contras, sou levado a concluir que tem sido bom.
Como afirmei logo no início, propus-me escrever sempre que me desse na gana ou quando os assuntos despertassem a minha atenção. Declarei então que este seria um espaço reservado às minhas opiniões pessoais, aos relatos, aos desabafos, aos estados de alma e onde responderia a eventuais provocações dos que tivessem a paciência de frequentar o blogue (já viram que continuo a recusar escrever blog. Tenho a esperança que, pelo menos, se tenda para o aportuguesamento da palavra que até poderá ser blogue).
Desse ponto de vista, e com o dia a dia, procurei, dentro do espírito enunciado, achar um rumo. Quero intervir, denunciar, alertar os mais adormecidos, criar um espaço cívico, falar de viagens, de poesia. Tudo isso tratado umas vezes em tom mais sério, outras de forma mais bem humorada ou com ironia e, sempre que possível, diversificando os assuntos.
Sinto-me a isso obrigado. Ao fim e ao cabo, aceitei partilhar convosco a minha escrita.
Apesar de tudo, e este tudo é a trabalheira que me dá escrever tantos e (alguns) tão elaborados textos, penso que a experiência tem sido agradável.
Só não sei exactamente qual é a vossa aceitação. Muito embora o meu contador de visitas ao blogue indique cerca de 70 mil presenças nestes dois meses (mentira, não tenho nenhum contador, apenas me apeteceu dizer isto), a verdade é que não têm sido muitos os comentários que fazem. E, quanto a provocações, nada. Estarão, porventura, com medo que eu me zangue e, qual Valentim, saia a terreiro a perguntar
“Afinal, quantos são, quantos são …”
Participem também neste espaço, que é de todos.
Vou ausentar-me uns dias. Encontrar-nos-emos, de novo, lá para o dia 10 de Novembro.
Até breve.

segunda-feira, outubro 24, 2005

A classe média

Ao reler o que publiquei aí há tempos sobre a (hipotética) crise da classe média deu-me um baque. Eu disse que a classe média estava em crise? Disse isso mesmo?

Mas, afinal, qual classe média, se em Portugal foi coisa que nunca existiu? Sabemos apenas que sempre houve os ricos e os pobres mas nunca se sentiu a falta de mais alguém. Se bem que, na minha juventude, na casa dos meus pais, sempre se disse que nós não éramos nem ricos nem, tão pouco pobres, éramos apenas “remediados”. Donde, afinal, para sermos rigorosos, talvez devêssemos considerar não a tal classe média, mas a classe dos “remediados”.

É que isto das classes sociais é basicamente uma questão de mentalidade, muito mais do que de dinheiro. O dinheiro é sempre relativo. Com as mesmas moedas no bolso pode ser-se um príncipe no Rio de Janeiro e um teso em Nova Iorque.

Um pobre está sempre inconformado e nunca se esquece que passou a vida cheio de dificuldades. Mesmo que ganhe o totoloto ou que um tio radicado na Venezuela lhe deixe uma pipa de massa, o pobre nunca abdica do seu estatuto de pobre. Quando muito assume-se como um ... remediado, mas nunca como um rico.

Os ricos podem ser obrigados a comer sardinhas em lata durante todo o mês, que nunca deixam de sentir que vivem num mundo tremendamente diferente e distante do resto da rapaziada.

O que é curioso neste tipo de atitudes, assumida quer por uns, quer por outros, é que nunca ninguém está satisfeito ou tranquilo.
Os pobres passam a vida inteira a reclamar contra o destino e nunca desistem de dizer mal dos endinheirados, muito embora, bem no íntimo, gostassem de estar na sua situação - ter o seu dinheiro, os seus carros e as suas casas.
Os ricos vivem no pânico permanente de perderem a exclusividade do “seu” mundo e do pavor de sentirem que no “seu” restaurante, na mesa ao lado da “sua”, o filho do “seu” jardineiro, emigrado na Alemanha, está a gabarolar-se - entre arrotos e gargalhadas alarves - de pretender comprar o palacete ao lado do “seu”, onde vai espetar dois grandessíssimos e imponentes leões de pedra no portão da entrada.

E porque nunca houve classe média cá no burgo, e porque sempre se gozou este saudável equilíbrio que demorou séculos de História a conquistar, fica-se terrivelmente chateado quando se vê alguém a querer dar nas vistas, sem qualquer vergonha na cara, a dizer-se e a assumir-se como sendo da classe média! Um escândalo. Um escândalo, meus amigos...

Esses tipos não são, nem nunca foram, da classe média. Eles nem sequer são ricos nem pobres, nem o que quer que seja. São, isso sim, tipos que estão muito satisfeitos consigo próprios, orgulhosos por demais da câmara de vídeo que compraram no Jumbo, da camisa Lacoste que é, em si mesma, um símbolo da sua satisfação e das férias que passarem na Eurodisney de Paris com a família.
Levam o tempo a imaginar o que é que podem comprar para aumentar a inveja da vizinhança, mas o único acto de rebeldia de que são capazes é de, quando muito, surripiar um pacote de alcagoitas de um hipermercado.

Este tipo de pessoas da dita “classe média” – os chamados “médios” que, definitivamente, não conseguem chegar a ser classe média – estão completamente satisfeitos com o seu estatuto. Não querem, de todo, ser pobres porque sentiriam vergonha, mas os ricos assustam-nos porque não conseguem perceber que raio valores são aqueles que fazem os ricos passar as férias sentados numa cadeira a ler um livro, enquanto o carro de topo de gama vai ficando dias e dias sem sair da garagem.
Os sonhos dos “médios” são todos iguais e, ainda por cima, são todos estupidamente concretizáveis – ter um apartamento de férias na Marina da Praia da Rocha, um carro novo ao fim de três anos e um emprego como alguma estabilidade para os filhos, se possível num Banco.
Outro dos sonhos dos “médio” é viajar. É vê-los por essa Europa fora, pelo nordeste brasileiro ou por Cuba, sempre acompanhados pela família, a cumprirem escrupulosamente os programas organizados pelas agências de viagem, repetindo incessantemente fotografias a monumentos e panoramas, comprando as mesmas lembranças inúteis de sempre e exibindo a sua imensa felicidade estampada nos rostos por serem exactamente aquilo que são.

E porque os “médios” têm terror à diferença, por pequena que ela seja, acabam infalivelmente por casar com pessoas médias, com quem terão filhos médios e em número médio, para cumprir cabalmente a sua missão cá na terra. Então, poderão morrer felizes e em paz ... e dentro da média, é claro ...

domingo, outubro 23, 2005

Turquia, ainda tão longe

A Turquia moderna é herdeira de milénios de História. Foi a cabeça do Império dos Hititas, do Império Romano do Oriente e do Império Otomano, que se estendeu em África até Marrocos e na Europa até às portas de Viena. É um país que foi, ao longo de séculos, encruzilhada de civilizações.

Há uns anos passei duas semanas de férias na Turquia e para além de ter “bebido” toda aquela riqueza histórica e cultural, senti que a sua população era amistosa e hospitaleira. Não raro, no primeiro encontro, e em simultâneo com o aperto de mão franco, lá vinha a pergunta “De que país é que são?”, feita mais pelo prazer do contacto com pessoas de outras latitudes do que por mera curiosidade. Achei, sinceramente, os turcos acolhedores e amáveis.

Talvez por isso, fiquei muito satisfeito pelo facto da Europa ter aberto recentemente as negociações para a entrada da Turquia na União Europeia. Achei que a esta entrada, ainda que se venha a verificar só daqui a dez ou quinze anos, vai beneficiar o país e os cidadãos.

Claro está que a Turquia tem ainda grandes problemas para resolver antes de entrar para o “clube”. Nomeadamente o problema com os curdos, o não reconhecimento de Chipre e as violações dos direitos humanos. Mas há que reconhecer, porém, que a Turquia fez uma rápida evolução para aderir à União, quer na economia, quer na legislação, quer no funcionamento das instituições democráticas. De resto, num processo de ocidentalização que já existiu quando Mustafá Kemal Ataturk governou o país.

Mas mesmo que os turcos avancem rapidamente e cumpram as exigências impostas pela Europa, o acordo não vai ser fácil. E porquê? Porque os europeus temem os turcos. De acordo com sondagens publicadas recentemente só 35% dos europeus querem que os turcos se juntem à União Europeia. E entre os que têm mais medo, encontram-se países de grande peso no seio da União, como a França, a Áustria e a Alemanha da nova chanceler Ângela Merkel.

Não obstante, a generalidade dos analistas turcos parece acreditar que o seu país poderá dar uma contribuição importante para o significado estratégico do bloco europeu e o mundo empresarial turco também reagiu bem ao início das negociações.

Mas, se a Europa fechar as portas à Turquia, poder-se-á perder a ponte que permita o diálogo entre o Ocidente e o mundo muçulmano e estar-se-á, porventura, a empurrar os turcos para se juntarem às fileiras dos fanáticos muçulmanos que pretendem, por qualquer meio, derrubar a civilização ocidental. E é bom não esquecer que o fundamentalismo muçulmano turco, embora ainda minoritário, é extraordinariamente activo e está bem posicionado junto dos órgãos da Administração.
Mas, para além isso, a Europa estará a fechar a porta a um mercado de 70 milhões de pessoas.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Desigualdade

Comemorou-se na última segunda-feira o Dia Mundial Para a Erradicação da Pobreza.
Segundo os dados já revelados, Portugal é o país da União Europeia onde há mais desigualdade entre ricos e pobres, onde os ricos são os mais ricos e os pobres os mais pobres, característica, de resto, comum aos estados em vias de desenvolvimento.

O problema da desigualdade é tão chocante que basta ver que as 100 maiores fortunas portuguesas representam 17% do Produto Interno Bruto e 20% dos mais ricos controlam 45,9% do rendimento nacional.

E o que é mais confrangedor ainda é que, apesar de todos saberem que esta desigualdade existe (com um fosso que tem aumentado nos últimos anos), parece haver uma grande apatia da sociedade (de todos nós, portanto) relativamente a esta desigualdade e à pobreza em particular.

Pese embora alguma preocupação social manifestada ao nível de medidas tomadas pelo actual governo, o facto é que o discurso político, de uma maneira geral, está mais preocupado com a redução do deficit do que, propriamente, com a situação da enorme injustiça que separa cidadãos de primeira (poucos) de cidadãos de segunda (a maioria)

As estatísticas indicam que um em cada cinco portugueses vive no limiar da pobreza. Mas a realidade da pobreza em Portugal é ainda pior. Porque pobreza não é apenas a falta de dinheiro, é também a falta de acesso às necessidades que conferem dignidade à população.

No nosso país existem dois milhões de pobres e dez por cento da população vive com menos de 60 por cento do ordenado médio nacional.

E este problema não deveria resolver-se apenas com recurso às Instituições Particulares de Segurança Social ou às Misericórdias. Os problemas da pobreza são estruturais e por isso merecedores de resoluções que não passem tão somente por pequenas acções de cosmética ou soluções meramente pontuais.
Desde que Portugal entrou para a Comunidade Europeia, temos assistido ao gasto de milhões e milhões e continuamos praticamente na mesma. Se calhar pior. Há cada vez mais pobres e cada vez há problemas mais graves.
É, pois, absolutamente necessário que o país, de uma vez por todas, acorde (mas acorde mesmo) e actue de forma eficaz para conseguir erradicar a pobreza. Um país que se mostre solidário e justo.

Preferências


Dias depois de se terem realizado as eleições autárquicas de 9 de Outubro, dei de caras com um cartaz (eu sei que estavam à espera que escrevesse “outdoor”, mas enganaram-se) do candidato de um dos partidos concorrentes à Câmara Municipal da Amadora.
É claro que o cartaz já lá estava há mais de um mês e que todos os dias eu olhava para ele.
Só que, naquele dia, no mesmíssimo sítio onde o tal candidato afirmava "que o melhor da terra eram sempre as pessoas", o cartaz tinha uma tira de papel colada na parte de baixo, onde se podia ler:
“Obrigado Amadorenses”

O agradecimento deveu-se, naturalmente, ao facto do candidato ter sido eleito Presidente da Câmara. Vá lá, teve um gesto de boa educação e eu gosto de pessoas educadas.
Mas aquela frase teve o condão de me irritar. Não gostei que me chamassem “amadorense”. Sei lá, podiam-me chamar outra coisa, não sei. Até agora nunca tinha pensado que eu também era aquilo (isto é, amadorense).

Ao fim e ao cabo, é capaz de não ser assim tão mau como isso. Até porque os habitantes da maioria das nossas terras também são qualquer coisa em “enses”. São os figueirenses, os portuenses, os setubalenses, os farenses, os lacobrigenses, os leirienses, os calipolenses e outros que tais.
Se calhar até é por isso que eu gostaria de ser uma outra coisa que não “enses”, por exemplo, ser lisboeta ou escalabitano.

Bem, mas pensando melhor, prefiro ser um “amadorense” do que ser um “porcalhoto” (que não tem ense) que, provavelmente, seria a designação que seria atribuída aos habitantes da Porcalhota, que foi, como se sabe, a povoação que deu origem à actual Amadora.

Apesar de tudo, e mesmo não gostando, prefiro ser um “amadorense” do que um “gondomarense” ou um “felgueirense” e está-se mesmo a ver porquê, não “tá-se”?

quarta-feira, outubro 19, 2005

Orçamento de Rigor

Título da 1ª Página do “Correio da Manhã” de ontem, dia 18 de Outubro

“Orçamento de Estado Ataca Pensões”

Que o orçamento para 2006 ia ser de rigor já o sabíamos, o governo do Engenheiro Sócrates já o tinha anunciado. O estado a que chegaram as contas públicas é de tal maneira lamentável que não restava grande alternativa a qualquer governo decente, que não fosse o de ser rigoroso com um orçamento de verdade e sem malabarismos financeiros. Portanto, ainda que isso nos afecte as carteiras, venha o tal orçamento de rigor e de transparência, que eu aplaudo.
Mas, senhor primeiro-ministro e senhor ministro das finanças, o orçamento prever o ataque às pensões, aí já não posso estar mais em desacordo.

Ao fim e ao cabo, razões terão os partidos da oposição à esquerda do PS, quando dizem que o governo penaliza sempre os trabalhadores e que é incapaz de se meter com o grande capital, nomeadamente com a Banca (bom, face às notícias que vieram ontem a público sobre a investigação que está ser levada a cabo pela Polícia Judiciária e pela Direcção Geral dos Impostos, precisamente a grandes grupos financeiros, já não sei não).
E, as razões apresentadas por esses partidos, acabam por estar, afinal, retratadas no título do Correio da Manhã “Orçamento de Estado Ataca Pensões”

Mas, pergunto, porquê o ataque às Pensões? E porque não às Residenciais? E porque não às Albergarias? E porque não aos Hotéis?

São sempre os mesmos a pagarem a crise!

segunda-feira, outubro 17, 2005

Jogadas


Já passaram dois dias e ainda não consegui compreender porque é que no jogo do FC do Porto com o Benfica, o Nuno Gomes levou uma grandessíssima cabeçada daquele defesa do FCP que, ao que parece, se chama Bruno Alves. Será que o Bruno pensava que "jogar com a cabeça" era dar cabeçadas noutro jogador?
Pus-me a pensar e, das duas quatro. Bruno, ou tu és mesmo muito mau, mau como as cobras, o que não acredito, muito embora aquela cabeçada já fosse a tua segunda agressão só naquele jogo; ou andas a precisar de óculos e não conseguiste distinguir entre a bola e a cabeça do Nuno Gomes, que, por acaso, até nem se parecem porque a cabeça do Nuno é mais bonitinha; ou, finalmente, não conheces mesmo nada das leis do jogo e, nesse caso, tens que aprendê-las se queres continuar a jogar futebol.
Assim é que não, Bruno, senão ainda corres o risco de um dia destes, quando entrares em campo, alguém gritar: “É um g’anda jogador este Bruto Alves”.

domingo, outubro 16, 2005

Objectivo ou Obsessão?

No mundo das empresas como na vida, nem sempre é fácil definir objectivos. E, se calhar por não ser fácil é que, neste momento em Portugal, muita gente anda preocupada com a obtenção de dois objectivos que considera ser essenciais para o nosso bem-estar:

- o primeiro, sobretudo alimentado (e de que maneira) pela imprensa, era o de saber quando é que o Pedro Pauleta era capaz de ultrapassar o número de golos marcados pelo Eusébio ao serviço da Selecção Nacional de Futebol. Bem, esse problema foi ultrapassado recentemente mas, a minha dúvida mantém-se. Será que era assim tão importante o Pauleta marcar mais golos do que o Eusébio? Quem foi o cérebro que definiu esse objectivo? Que Pauleta marque muitos golos em cada jogo que faz, acho óptimo. A ele deve dar-lhe uma grande gozo, à Selecção pode significar que a equipa sempre vai ganhando, mas, para os portugueses, o que é que isso adianta?
Desculpem lá, mas ter como objectivo ultrapassar o recorde dos 41 golos do Eusébio parece-me, francamente um bocadinho de menos.
Afinal, seria objectivo ou obsessão?

- o segundo objectivo tem a ver com os candidatos presidenciais de esquerda já conhecidos. Como é público, todos eles dizem concorrer para derrotar Cavaco Silva, para derrotar a direita.
Para já, e que eu saiba, Cavaco até pode ser apoiado pelos partidos de direita mas ele não é, de facto, de direita. Depois porque acho uma ideia peregrina alguém se candidatar à Presidência da República apenas com o objectivo de derrotar a direita e não por uma razão mais válida. Sei lá, por exemplo, por Portugal, pelos portugueses, pela moralização da vida pública e dos partidos políticos, para constituir um factor agregador da sociedade. Mas, apenas para derrotar a direita? Não será um pouco redutor?
Afinal, será objectivo ou obsessão?

Quando os objectivos são mal definidos ou mal explicados, os resultados ou não têm interesse ou não são lá grande coisa. O que, muitas vezes, nos faz questionar se serão realmente objectivos ou tão-somente obsessões?

quinta-feira, outubro 13, 2005

O Zé Povinho

Sou capaz de jurar que todos conhecem a figura do Zé Povinho. Quem não deu já de caras com aquela pujante figura que usa o manguito como expressão corporal? Aquele que, de calças remendadas e botas rotas, é a eterna vítima dos partidos, e do poder em geral, dando a vitória a uns e a outros em épocas eleitorais. Como aconteceu, de resto, na última semana.
Mas já não tenho a mesma certeza quanto a saberem quem foi o seu autor.
Pois o criador desta figura-símbolo do povo português foi Rafael Bordalo Pinheiro.
Raphael Augusto Bordallo Prestes Pinheiro, de seu nome, nasceu em Lisboa, em 21 de Março de 1846. Foi uma figura marcante da cultura portuguesa da segunda metade do século dezanove e distinguiu-se – apenas - como desenhador, aguarelista, caricaturista político e social, jornalista, ilustrador, ceramista, actor e professor. A sua genialidade única, atravessou todas estas especialidades e, apesar de ter morrido no início do século vinte, a actualidade da sua obra faz com que seja intemporal.
Começou a fazer caricatura por brincadeira. Ilustrou e compôs desenhos para almanaques, anúncios e revistas estrangeiras e para largas dezenas de livros e publicações. Foi percursor do cartaz artístico em Portugal.
Caricaturista também no barro, deu forma a notáveis figuras como o sacristão, o padre, o polícia, a ama de leite e o genial "Zé Povinho" ao lado de quem colocou a inseparável Maria da Paciência, velha alfacinha alcoviteira.
E, quando lhe perguntavam onde tinha aprendido as artes, respondia:

"Nunca cursei academias. Tenho o curso da Rua do Ouvidor...Cinco anos. Canto de ouvido"

No entanto, Rafael matriculou-se sucessivamente na Academia de Belas-Artes (desenho de arquitectura civil, desenho antigo e modelo vivo), no Curso Superior de Letras e na Escola de Arte Dramática, para logo de seguida, e sempre, desistir.
Por ser avesso a qualquer disciplina, apaixonou-se antes pelo lado boémio da vida lisboeta e estreou-se como actor no Teatro Garrett e no luxuoso Theatro Thalia, na costa do Castelo.
Mas o riso era, de facto, a vocação de Rafael Bordalo Pinheiro. Com o traço irreverente e satírico constrói uma galeria de figurões políticos e financeiros, intervindo decisivamente na demolição das estruturas caducas duma monarquia decadente e na rápida ascensão e propagação dos ideais republicanos.
Mas, muito mais interessante do que esta breve evocação, será admirar a obra deste grande e genial mestre, irmão do pintor Columbano, que pode ser apreciada no Museu Bordalo Pinheiro, onde é possível ter uma visão retrospectiva do seu brilhante trabalho gráfico e cerâmico.
Rafael Bordalo Pinheiro foi um artista empreendedor e multifacetado que reflectiu quase sempre de forma crítica o quotidiano cultural, político e social da época em que viveu.
Mas o que é muito curioso observar é que podemos descobrir nas suas críticas uma tal actualidade que parecem ter sido feitas, à medida, para a sociedade de hoje. Lá estão os temas como o défice, a insegurança e a corrupção. Lá encontramos, por exemplo, figuras e figurões como os políticos desonestos e os troca-tintas.
Pena foi que o boémio incorrigível em que se tornou, sempre de olhos maliciosos a cintilar por entre o monóculo, ter tido uma vida tão curta, porém atribulada.
Uma visita a não perder.
Museu Bordalo Pinheiro
Campo Grande, 382, em Lisboa – 3ªs a Domingo das 10h00 às 18h00
Encerra às 2ªs e feriados

terça-feira, outubro 11, 2005

Conversas de miúdos

Há dias, ao sair de casa, dei de caras com um casalinho de miúdos que caminhava pelo passeio, de mãos dadas. Eram giríssimos os dois, teriam à volta de sete, oito anos, mas percebia-se pela sua desenvoltura que eram desenrascados (perdoem-me o plebeísmo). E, muito senhores do seu papel, iam conversando animadamente.

Alguém que os conhecia bem, acercou-se deles e perguntou-lhes onde iam passear. Os miúdos responderam a isso e a uma série de outras perguntas, daquelas que os adultos costumam fazer às crianças há séculos. Confirmaram que eram namorados e, a simpatia deles era tão grande, que levou a que esse alguém lhes fizesse aquela pergunta sacramental que é comum ouvir-se:
“Então e quando crescerem o que é que querem ser?
“Magistrado”, respondeu o rapazinho. “E porquê?”, questionou o mesmo alguém.

O rapaz que, pelos vistos, ouvia tudo o que se passava lá em casa e provavelmente tinha ouvido a indignação dos pais sobre aquela notícia que saíra nos jornais, respondeu num fôlego:
“Ora, porque os magistrados recebem um subsídio de renda de casa de 700 euros por mês, mesmo que residam em casa própria e na sua terra. O mesmo dinheiro que recebem quando estão colocados a centenas de quilómetros. E quando um dia eu estiver reformado, eles (o miúdo sabia que eles era o governo) incluem esse subsídio na reforma. E, ainda por cima, esse subsídio não conta para o IRS”.
“Mas, como é que tu sabes essas coisas?”, perguntou o alguém, deveras admirado.
“Ouvi, pronto”, volveu o rapaz, acrescentando: “E ouvi também que se eu trabalhar no Supremo Tribunal Administrativo ou no Tribunal Constitucional e morar fora da área da Grande Lisboa, além dos 700 euros, eles ainda me pagam ajudas de custo por cada dia de sessão nos respectivos tribunais. E mais, para ir trabalhar ainda vou ter viagens totalmente gratuitas em todos os transportes públicos terrestres e fluviais, incluindo os comboios Alfa”.

O alguém estava completamente aparvalhado. Isto é, estava ele e estava eu que também tinha ouvido a conversa. No meu caso, porém, não percebia bem se a minha estupefacção era devido às benesses atribuídas (incompreensivelmente) aos magistrados, se à esperteza daquele miúdo que desfiava tão bem toda aquela prosa, cujo significado ele (neste caso o miúdo), por certo, não devia compreender totalmente.

“E tu, querida, o que é queres ser quando fores grande?”, perguntou o alguém.
Ela, agarrou a mão do companheiro com mais força, sorriu para o alguém e respondeu:
“Como eu gosto muito dele, quero casar com ele e quero ser, também, magistrada”
“E magistrada porquê? voltou a perguntar o alguém.
“Porque, assim, eles também me dão 700,00 euros para a renda de casa e podemos, os dois, sacar 1400,00 euros, percebes?”

Não me recordo de mais nada. Quando acordei estava deitado numa marquesa e, segundo me disseram, estava branco como a cal das paredes …

domingo, outubro 09, 2005

Ganhámos

Neste último fim-de-semana fomos chamados a exercer o nosso dever cívico, isto é, fomos votar nos candidatos que mais mereceram a nossa confiança, aqueles que, ao fim e ao cabo, nos pareceram ser os mais aptos para dirigir e controlar os destinos das nossas autarquias.

Isto, muito embora a maioria deles, para além do voluntarismo e da boa vontade, não terem a mínima ideia sobre o que é, de facto, a gestão autárquica.
Naturalmente que todos os candidatos deveriam ter conhecimentos (pelo menos mínimos) de planeamento estratégico, de associativismo intermunicipal, de controlo orçamental, de conhecimento nas áreas sociais, culturais, ambientais e de ordenação do território.
Mas, enfim, sabemos todos que temos os candidatos que temos e, sabemos também, que a maioria deles é proveniente dos partidos que regem e dominam o sistema.
Bom, nós fizemos a nossa parte, votámos e, por isso, ganhámos.

Quanto aos partidos políticos, também ganharam todos. Ou se não ganharam, consolidaram ou reforçaram as suas posições nas Câmaras, nas Freguesias e nas Assembleias Municipais. Todos são vencedores, como de costume.

Mas ganharam também os independentes. Aqueles que à revelia dos respectivos partidos se candidataram e levaram de vencida os candidatos desses mesmos partidos. Todos eles, à excepção de Avelino Ferreira Torres em Amarante. Aí quem ganhou foi o bom senso e a democracia.

E ganhou também a abstenção que, em certos municípios, chegou a ultrapassar os 50%


Mas se pensaram que eu me dispunha a fazer análise política às eleições de ontem, tirem o cavalinho da chuva. Não é isso que me interessa neste momento.
Não, não é destes ganhos e destes ganhadores que vos vim falar. Hoje, gostaria antes de realçar a vitória da Selecção Portuguesa de Futebol sobre a selecção do Liechtenstein, que permitiu a nossa classificação para o Mundial da Alemanha de 2006.
E levou a cabo esse feito fazendo um jogo com uma equipa classificada para além do centésimo lugar na tabela da UEFA. Num jogo de baixíssima qualidade, de uma alta percentagem de passes mal executados, de malabarismos individualistas despropositados (lembro que este é um jogo de equipa) e de apostas duvidosas em jogadores sem ritmo competitivo e que não actuam nos seus respectivos clubes. Para além da elevada taxa de não concretização e de uma grande penalidade falhada, este foi um jogo em que quase tudo aconteceu, até um frango que, ainda por cima, se encaixou na nossa baliza.

Mas, afinal, o que interessa tudo isso quando o resultado acabou por ser uma vitória das nossas cores que, para mais, permitiu a classificação da nossa Selecção para a Alemanha?
Portanto, o que vale verdadeiramente é que ganhámos.

quinta-feira, outubro 06, 2005

Ai como tudo isto anda viciado

Sempre que posso, gosto de ver e ouvir o programa “O Eixo do Mal” na SIC Notícias. É um programa cheio de ironia, de maledicência também e de muita crítica ao que se vai passando no mundo, mas especialmente cá pelo burgo. E, a brincar, a brincar, vão-se dizendo coisas bastantes sérias.
Bom, mas falo nisto para dizer que num dos últimos programas, quando se discutia um qualquer assunto que já não recordo o tema, um dos participantes argumentou:
“É por isso que os jornais e revistas da especialidade nunca dizem mal dos carros quando são lançados modelos novos”.

O assunto ficou por ali mas fiquei a pensar na frase. É que, muito recentemente, comprei carro novo e no dia em que fui escolher a cor do automóvel, ao passar por uma das dependências do representante da marca, vi uma placa a indicar “Parque da Imprensa”.

Perguntei ao vendedor que me acompanhava que espaço era aquele e ele, num repente e sem qualquer relutância, esclareceu-me que era o parque onde ficavam estacionados os carros destinados à imprensa.

“Que carros?”, questionei. Respondeu que eram os modelos acabados de lançar e que a marca põe à disposição dos jornalistas da especialidade para eles passarem fins-de-semana e férias.

“E porque cedem os carros?”, voltei a perguntar. A resposta veio envolta num misto de indignação e de surpresa pela minha ignorância.
“Para que não digam mal dos nossos carros”, ao que acrescentou “Aí há tempos, tivemos um problema porque a Administração entendeu não ceder um carro a determinada pessoa e ela, no seu jornal, fez-nos a vida negra durante meses a fio, sempre a colocar defeitos no carro.

Realmente andava muito distraído. Como é que eu fui achar normal que todos os artigos publicados sobre carros novos, fossem unânimes em dizer que esses carros, todos eles, são os melhores do mundo.

quarta-feira, outubro 05, 2005

Assim não, Senhor Engenheiro

Ao contrário do que prometeu, que era criar uns milhares de postos de trabalho, o senhor engenheiro Sócrates enveredou pelo ataque cerrado, sistemático e injustificado aos pobres trabalhadores, levando muitos deles ao desemprego.

Foi exactamente o que aconteceu a um humilde empregado da Refer (empresa pública criada para gerir a infra-estrutura da rede ferroviária nacional), por acaso seu presidente, o Dr. Luís Braamcamp Sobral.
Braamcamp Sobral, até há pouco tempo para além de presidente da Refer, e porque o seu vencimento não dava para grandes coisas era, ainda e em acumulação, presidente da Rave, responsável pela futura rede de alta velocidade (apesar do projecto do TGV não estar, ainda, definido). Ou seja, era um bi-Presidente que tinha direito a dois ordenados.

E era um Presidente à séria, ao que sabemos. Muito embora no ano passado a Refer tivesse apresentado prejuízos da ordem dos 150 milhões de euros, e a Rave tivesse tido, também, resultados negativos, o que importa aqui salientar é que o Senhor Presidente, apesar desses maus resultados, conseguiu pagar prémios de "produtividade" a 540 dos mais de 5 mil trabalhadores, no valor de 600 mil euros. E, para os colaboradores próximos, o prémio de "produtividade" foi para cada um superior a 5 mil euros.

Sempre defendi que a boa gestão deve ser recompensada. E, neste caso, parece evidente que houve uma excelente gestão, pois mesmo tendo em conta que estas empresas tiveram défices tão significativos, mesmo assim, o homem, perdão o Senhor Presidente, ainda arranjou umas massas para premiar “os que conseguiram ser mais produtivos”.

Mas Braamcamp Sobral fez muito mais. Sob a sua gestão, admitiu, na Refer e na Rave, mais de 200 pessoas, muitas das quais amigos e colaboradores do ex-ministro da tutela, António Mexia, e de Carmona Rodrigues. Esta medida, a de criar mais de duzentos novos postos de trabalho, deveria ser citada por si, Sr. Engenheiro, como um bom exemplo de criatividade empresarial.

Perante isto, Senhor Engº. Sócrates, vai mandar o ex-bi-presidente para o desemprego? Assim, do pé para a mão?

Entretanto, alguém me confidenciou que Braamcamp Sobral, sendo um homem previdente, arranjou maneira de não ir para o desemprego. Com um grupo de personalidades (de que faz parte) que ocupa lugares nos conselhos de gestão de várias empresas públicas (Refer, CP, Metro...) fez contratações cruzadas (numa fantástica troca de cadeiras...), pelo que agora estão em condições de ocupar as prateleiras de luxo que inventaram para si próprios.
Desta forma, o presidente da Refer e da Rave, o Dr. Braamcamp Sobral, foi contratado pela CP, como assessor da administração, tendo acordado um ordenado de 4.700 euros, a que acrescem 995 euros para despesas de representação. Nada mal!

Bem, agora falando a sério. Resta-me dizer que toda esta aldrabice poderá não ficar assim. FELIZMENTE.
É que a Inspecção-Geral de Finanças, que já detectara a situação durante a vigência do anterior governo, propôs a exoneração dos membros dos conselhos de gestão das empresas públicas que se envolveram nestas manobras.
Até o magistrado do Ministério Público, que exerce as funções de auditor jurídico do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, não teve dúvidas em considerar, há dias, que "foram seriamente atingidas a credibilidade, o prestígio, a boa imagem e a fé pública da administração e das instituições públicas", pelo que, em sua opinião, se verifica "a existência de fundamento válido para a hipótese de exoneração das pessoas em apreço sem direito à percepção de qualquer indemnização".

Vamos ver o que isto dá …