Foram felizes os meus Natais enquanto criança. É certo que não havia muitos brinquedos e que abundava a falta de dinheiro (é verdade, minha gente, já naquela altura havia uma crise profunda) mas sentia-se o espírito da época e, diga-se de passagem, a nossa ambição também não era exagerada. Aliás, não havia, então, a febre consumista que se verificou mais tarde. E os brinquedos (poucos em quantidade e variedade) ou as prendas (que muitas vezes eram meias, camisolas ou pijamas) eram-nos dadas pelo Menino Jesus depois da meia-noite ou, às vezes, na manhã seguinte dentro do sapatinho que deixávamos (cheios de esperança) na chaminé da cozinha. O deslumbre e a ansiedade do rasgar do papel dos presentes via-se bem no olhar feliz das crianças. E isto para falar apenas nas crianças que tinham essa ventura porque muitas nem sequer sentiam o prazer de ter um presentinho de Natal deixado pelo Menino Jesus.
Jesus e não - ainda - o Pai Natal. Esse entrou muito mais tarde na vida dos portugueses depois de um "golpe de Estado" sobre o Menino Jesus. Desde então, começou a adoptar-se o Pai Natal como fonte da bondade natalícia e rapidamente o Menino Jesus foi relegado para figura (embora principal) do Presépio. A tradição portuguesa esfumou-se e o velhinho Pai Natal tomou conta do imaginário das crianças.
Isto até ao dia da descoberta - através de coleguinhas de escola ou pela explicação dos pais ou familiares - de que, afinal, o Pai Natal não existe. Toda a ilusão, toda a fantasia, que iluminavam os seus poucos aninhos acabava de forma trágica. A revolta era inevitável como inevitável eram as lágrimas por tamanha frustração. Essas crianças viram chegar ao fim o sonho em que sempre acreditaram e que, de certa forma, lhes foi incutida com a melhor das intenções pelos familiares mais próximos ou que elas próprias criaram. Uma fantasia que, apesar de tudo, continuo a considerar muito importante para o crescimento e formação dos miúdos.
Para as crianças, ao longo das diversas gerações, esta descoberta bem pode ter sido a sua primeira desilusão ...
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