Eu sei que já tenho idade mais do que suficiente para ter juízo, para não acreditar piamente em tudo o que nos dizem, mas, que querem, a minha ingenuidade ainda me trai de quando em vez.
Estou a lembrar-me, naturalmente, da triste situação daqueles deputados que na véspera da Páscoa foram à sua vida, sem dar cavaco a ninguém, e sem fazerem aquilo que era a sua obrigação – a de estarem presentes na Assembleia da República e trabalharem. E não me deveria admirar com esta situação, tanto mais que nem sequer é a primeira vez que as “baldas” dos deputados são descobertas. Ainda há poucos anos, os jornais publicaram fotografias que mostravam alguns deputados a apanhar o comboio em Santa Apolónia, mesmo com o relógio da estação por cima da cabeça deles, onde o mostrador do relógio indicava que àquela hora eles deveriam estar no Parlamento e não ali em Santa Apolónia. Devo ter pensado, nessa altura, que esses deputados eram a excepção e esqueci o assunto.
Mas agora, foi demais. Na quarta-feira da semana passada, em vésperas das mini férias da Páscoa, 120 deputados (e não 119 como anunciaram no início) decidiram ir de férias mais cedo e faltaram às votações parlamentares, que, assim, não puderam realizar-se por falta de quórum. Não contando com as 13 ausências que estavam justificadas, 107 deputados (50 do PSD, 49 do PS, 5 do CDS, 2 do PCP e 1 do BE) acharam que seria muito mais agradável apanhar um calorzito lá pelos Brasis ou beber uns copos junto dos amigos num qualquer sítio do país, do que ouvir os discursos chatíssimos dos seus companheiros e adversários, sentados ali nas bancadas de S.Bento, para onde, afinal, todos eles foram eleitos e pelo qual são pagos.
Mas se já é muito grave que esses deputados tenham faltado ao seu dever, isto é, não tenham cumprido com as suas obrigações, parece-me igualmente grave que na hora das votações não se registasse quórum quando, de manhã, a lista das presenças estava totalmente (para além dos tais 13) assinada.
O que me leva a questionar se esses baldas chegaram a ir à Assembleia nessa manhã e depois “desenfiaram-se” (como se dizia na tropa), ou se nunca chegaram a pôr lá o pé e alguém assinou por eles.
Para além da falta de vergonha, outra coisa que me irritou imenso foi o de, sem qualquer pudor, quererem alijar responsabilidades. Segundo o líder do PSD, a culpa de tudo isto deve-se à maioria porque, se os seus deputados lá estivessem já haveria quórum e poder-se-iam aprovar as leis agendadas. Ou o homem está a passar por um período de grande cansaço psicológico ou, então, está a gozar com todos nós. Para mim, a responsabilidade deve ser imputada, de igual forma, a todos os faltosos, independentemente dos partidos. Ou estarei a fazer confusão?
E são estes senhores, em que nós votámos, que fazem as leis deste país, que discutem e promovem acesos debates sobre produtividade e competitividade. Mas, para quem é que eles estão a falar, se eles são os primeiros a prevaricar, a abandonar as suas obrigações, dando o pior dos exemplos, quando se aproxima um fim-de-semana prolongado? O que é que nós podemos concluir de tudo isto?
O mínimo que se poderia dizer é que esses senhores deputados não respeitam nem a lei nem a ética. Não cumprem com o que lhes é exigido, ou seja, que trabalhem em prol dos cidadãos e do país. Em vez disso, o país assiste atónito e envergonhado à existência de uma certa camada política que contraria aquela velha máxima que sempre ouvimos “o exemplo deve vir de cima”.
Ainda que venham a ser multados, o sentimento dos cidadãos continua a ficar defraudado. Esses senhores para além da multa que a lei prevê, deveriam ser imediatamente expulsos da Assembleia. Se não pela força da Lei, pelo menos pela vontade de quem foi enganado, ao elegê-los.
UMA VERGONHA, meus amigos. Uma verdadeira VERGONHA!
2 comentários:
Viva
Escasseando-me o tempo, urge aplaudir três vezes, contundente crítica que neste Sítio floresce.
Quanto ao tema do dia de acordo estamos portanto, na mordaz insinuação de que (des)ilustres personagens muito folgam e lá vão à conta do Zé Povão.
Propondo daqui de baixo, eu me atrevo em dizer, que diariamente se podem dispensar tantos quantos faltaram, na tão digna votação pró prestigio da nação.
A proposta assim seria, para país tão pequeno, cem deputados eleitos e mais um “absentista” por grupo parlamentar, num parlamento pequeno a condizer com o tal. Pois a vantagem seria descomunal. Poderíamos ouvir assim, todos dignos prelectores em todos os assentos reservados, e não ficaríamos angustiados, porventura algum gago estará por lá sem que o tal país o saiba.
A non domino
Puxa vida, estafei-me a procurar o significado de “A non domino”. Confessada publicamente a minha ignorância, lá consegui apurar que a expressão latina significa (espero eu) “De um não proprietário”. Estamos sempre a aprender, não é Vaxata. Ou será Vá … chata? (sem ofensa). Mas é que a língua portuguesa tem destas coisas…
Quanto ao texto (que é, afinal, o que devemos comentar), aplaudo a coragem e concordo que esses senhores deviam ir à vida.
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