Durante anos e anos fizeram-me esta pergunta. E, certamente, que à maioria das crianças.
A resposta foi variando conforme os anos iam passando. Depois da fase em que quis ser bombeiro ou polícia, acalentei a ideia de vir a ser revisor dos comboios. Mais tarde, tive muita vontade de ser um cantor famoso e, mais tarde ainda, jogador de futebol.
Tudo sonhos de crianças, cujas motivações tinham a ver com os momentos que se viviam e com a projecção na cena social, de certas actividades e figuras. Sonhos comuns a tantas crianças, os quais, na maioria, se vão desvanecendo à medida que crescem e a vida os conduz para outras direcções.
Há tantos anos atrás, porém, eu não podia ter sonhado em ser uma coisa que só muito mais tarde foi inventada. Agora, é a vez das crianças de hoje responderem - e suponho que com toda a convicção - que quando crescerem vão querer ser gestores. E se eu pudesse recuar uns anos, eu também quereria responder da mesma forma
“quando for grande quero ser gestor”.
E não teria razão para querer?
Claro que depois de termos vindo a assistir às escandalosas indemnizações que as empresas públicas e semi-públicas pagam aos seus gestores, quando eles deixam os seus postos, todos gostariam de ser gestores.
Veja-se o caso da Portugal Telecom que pagou a quatro dos seus administradores executivos, pela não renovação do contrato, quase dez milhões de euros.
Na EDP, empresa onde o Estado é ainda o maior accionista, os administradores cessantes da equipa liderada por João Talone receberam, em 2006, um total de 6,375 milhões de euros. Só o presidente da comissão executiva (Talone) recebeu cerca 1,3 milhões de euros.
Perante esta realidade abjecta e imoral, que as crianças (felizmente) não têm, por enquanto, a devida percepção de tal enormidade, resta-me observar que parece haver gente no nosso país que ainda gosta de proporcionar e assistir à felicidade dos outros, fazendo com que haja quem receba indemnizações de milhões, ao deixar de trabalhar numa empresa.
A verdade, porém, é que tanta sorte - de tão poucos - causa inevitavelmente a revolta do País inteiro, onde a maioria não recebe um cêntimo que seja, quando se vê na contingência de ficar sem trabalho.
Não se estranhe, por isso, que quando fazemos a tal pergunta sacramental às nossas crianças, elas respondam com toda a naturalidade
“quando for grande quero ser gestor!”.
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