quinta-feira, dezembro 28, 2006

Parabéns a Você

Hoje sinto-me completamente à-vontade. Como anunciei que só regressaria no dia 8 de Janeiro, tenho a certeza que ninguém se lembrará de espreitar este cantinho para ver se, entretanto, houve alguma novidade. Porque é que haveria?

Posso, portanto, escrever o que me apetecer, sem sequer me preocupar com o estilo ou com o conteúdo. Hoje, e porque FAÇO ANOS, escrevo apenas para mim e a mim dedico uma poesia do poeta João de Deus.

Aliás é uma poesia cujos versos, sobretudo os primeiros, se costumam declamar (declamar é capaz de ser exagero, talvez dizer) sempre que um amigo “cai na asneira” de aniversariar.

É uma poesia que, de alguma forma, todos conhecemos (pelo menos os mais velhos), e que, se calhar, alguns de nós até a souberam de cor e a declamaram alguma vez.

A minha mãe adorava-a e, invariavelmente, em todos os dias 28 de Dezembro, recitava-a entusiasmada - dedicando-a a mim, naturalmente - com uma alegria bem patente nos seus olhinhos envelhecidos mas brilhantes, que reflectiam toda a felicidade.


Então, de João de Deus,

“Dia de Anos”


Com que então caiu na asneira
De fazer na quinta-feira 25 anos,
Que tolo
Ainda se os desfizesse
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo

Não sei quem foi que me disse
Que fez a mesma tolice
Aqui no ano passado
No que vem agora aposto
Como tomou o gosto
E faz o mesmo coitado

Mas anos não caia nessa
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira
E fá-los queira ou não queira


Parabéns, demascarenhas, por mais um aniversário. Não, certamente, os 25 anos que refere a poesia mas, o que é que isso interessa? Ao fim e ao cabo, o que tem piada, para além do dia propriamente dito (que já aqui disse que gosto muito de comemorar, e de receber cumprimentos, e de receber prendas e de brindar a mim e a todos os que me são próximos), é que nunca me tinha dado Parabéns a mim mesmo. Alguma vez teria que acontecer. É a vida!

terça-feira, dezembro 19, 2006

As maiores Árvores de Natal



Em 2005 já tivemos a maior árvore de Natal da Europa, então com 72 metros de altura.

Talvez influenciados por aquela que é, ainda, a maior do mundo, a do Rio de Janeiro, (ambas construídas, aliás, pelos mesmos técnicos), que todos os anos vai sendo um pouco mais alta, a nossa árvore, localizada na belíssima Praça do Terreiro de Paço, em Lisboa, também cresceu um bocadinho e, este ano, tem 75 metros de altura (mais três metros do que em 2005) e continua a ser a


Árvore de Natal mais alta da Europa





Mas como não nos era suficiente tal feito, este ano temos também,
na secção de árvores verdadeiras,
uma das Árvores de Natal mais altas do Mundo

Uma árvore à séria, uma araucária excelsa, de 49 metros de altura, que está plantada e toda iluminada, no Jardim dos SLAT, em Viana do Castelo.



Nós somos assim, ou tudo ou nada. Quais megalómanos, metemos na cabeça que temos que estar no topo da classificação das maiores (em altura) árvores de Natal do mundo, artificiais ou verdadeiras.
Apesar das Árvores de Natal serem um símbolo pagão, elas constituem, desde há muito, uma tradição do nosso Natal.

A todos, desejo


BOM NATAL

FESTAS FELIZES

FELIZ ANO DE 2007




Estarei de volta no próximo dia 8 de Janeiro de 2007. Até lá!

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Fora de prazo

Eu “ainda sou do tempo” em que os produtos não indicavam os prazos de validade. As águas, as manteigas, os fiambres, os yogurtes quando apareceram, as bolachas, todos, mas TODOS os produtos que consumíamos estavam seguramente em óptimas condições, porque não havia indicação em contrário que nos dissesse que a partir de determinada data, os produtos estavam (ou estariam) presumivelmente estragados.

Mas, enfim, os especialistas entenderam que era
imprescindível dar melhor informação aos consumidores sobre o estado dos alimentos, e hoje poucos produtos estarão isentos dessa indicação. Que me lembre, os whiskies terão passado ao lado dessa necessidade, talvez, digo eu, porque estão conservados em álcool.

Passados vários anos após esta inovação, hoje, todos estamos muito melhor informados, sem dúvida mais protegidos relativamente à ingestão das bactérias putrefactas mas, sobretudo, estamos amarrados ao cumprimento de consumir o que quer que seja até àquela data que lá está indicada, mas nem um dia a mais.

Eu confesso que não sou tão radical como isso. Se um yogurt ultrapassou um ou dois dias e se a embalagem não está opada, se o conteúdo não cheira mal nem tem mau aspecto e mau sabor, eu como-o na mesma. E aplico idêntico princípio a outros alimentos. Mas eu sou um cidadão anónimo que faço da minha privacidade o que me der na realíssima gana.

O que já não deve acontecer quando se trata de organismos públicos, quer sejam privados ou do Estado.

Não deve, mas acontecem. E para que se saiba, vejam o que sucedeu no passado dia 17 de Novembro, com o voo da TAP para Angra do Heroísmo, voo que estava muito atrasado e que, por isso, em vez do jantar, os passageiros tiveram que se contentar, lá por volta das onze da noite, com umas sandes que a TAP lhes serviu.

A data de validade das ditas sandes era precisamente 17 de Novembro (o próprio dia do voo), portanto, estavam ainda dentro do prazo, embora no limite. Mas suponham que o voo em vez de ir para Angra se destinava a Copenhaga que tem mais uma hora que Lisboa. Nesse caso, as sandes já estariam fora do prazo de validade. Aliás, como estavam fora de validade as sandes distribuídas a dois passageiros do voo em questão, Lisboa-Angra do Heroísmo, cuja data-limite indicada era de dia 16 de Novembro.

Podemos argumentar à vontade, mas a realidade é esta, se existem regras bem definidas nesta matéria, elas têm que ser cumpridas.

domingo, dezembro 17, 2006

Será que é desta?

Ao que parece o Governo vai aprovar um decreto-lei sobre as habilitações indispensáveis para o exercício da docência: todos terão que, para além de outras especificações, ter um mestrado e saber português. Neste particular, requere-se que os candidatos a professores demonstrem “domínio oral e escrito da língua portuguesa”. Bravo, já é alguma coisa.

Não que eu esteja convencido que só com essas medidas, quero dizer, só com o professor dominar (mais ou menos) bem o português, se consiga o desejado aproveitamento escolar, mas se temos que começar por algum lado ... vamos a isso.

Contudo, e sendo realmente importante esta medida, já agora, gostaria de ver professores com vocação para ensinar, que fossem criativos, que conseguissem cativar os alunos, que estivessem actualizados e que dominassem as últimas tecnologias por forma a tornar interessantes (e desejadas) as suas aulas. Porque aquilo que mais afasta os formandos é o tormento de aturarem professores “chatos” e que eles, formandos, percebam perfeitamente que os “profes” não se sentem seguros do que estão a tentar transmitir. Um professor tem que gostar de ensinar e o ensinar para ele não pode ser um simples emprego, uma forma de ganhar a vida.

Mas há ainda uma coisa que, a meu ver, poderia ajudar, e muito, o sucesso que agora se pretende começar a desenhar. Refiro-me aos conteúdos dos programas. Deveriam ser mais interessantes e, particularmente em certas disciplinas, mais virados para a prática e para o mundo empresarial.

Enfim, este poderá ser um bom começo, o domínio da língua portuguesa por quem tem a obrigação de ensinar.

É que ouve-se e vê-se por aí cada calinada que é de bradar aos céus!

sexta-feira, dezembro 15, 2006

Podem “Bazar”

Já aqui temos falado por diversas vezes em publicidade, e sobre o mau gosto e a falta de ética existentes em certas campanhas publicitárias.

Passa neste momento nos vários canais de televisão um anúncio patrocinado pela TV Cabo, em que um homem chega a casa e, consoante a versão do anúncio, ele depara com bilhetinhos deixados pela mulher, pelo filho, pela filha e até pela empregada, todos a dizer que o abandonavam porque ele era grandessíssimo unhas de fome, porque não tinha querido gastar uns míseros 15,50 euros, que lhes permitiria terem mais uns quantos canais de TV espalhados pela casa.

Na minha opinião, aquele anúncio é de um profundo mau gosto. Não vejo ali nem criatividade nem sequer humor, por muito subtil que ele pretendesse ser.

Na verdade, o que eu consigo ver é o apelo puro e simples à descaracterização do padrão familiar, em que todos os que “bazaram”, como diz o filho, preferem trocar a estabilidade familiar, a partilha, pelo prazer de estarem sós diante de mais uns canais de televisão em casa.

Eu sei que muitos discordarão da minha opinião, que os mais chegados à criação publicitária repetirão que a publicidade apenas retrata, ou vai buscar inspiração à própria sociedade (o que é verdade, infelizmente) mas temos que ser honestos. O apelo a valores e princípios não vende e, daí, que se recorra a estratégias como esta, que vão minando e provocando a separação cada vez maior das famílias e levam cada um de nós, inevitavelmente, ao isolamento social.

Um anúncio de mau gosto, em suma!

terça-feira, dezembro 12, 2006

No calor da noite



Como estamos numa época em que ficamos particularmente sensíveis, decidi contar-vos hoje uma história de amor, uma linda história de amor. E, como todas as histórias, esta também começa por
“Era uma vez...”.


Era uma vez uma jovem, de seu nome Carolina Salgado, que, para conseguir o sustento de todos os dias para ela e para os seus dois filhos ainda pequenos, se empregou como “alternadeira” num bar muito lindo chamado “O Calor da Noite”.

Um dia, quero dizer, uma noite, nesse bar tão acolhedor, a jovem Carolina conheceu Jorge Nuno, um garboso homem, bonito de figura, próspero nos negócios e, ainda por cima, presidente do maior clube de futebol lá da terra.

E como tantas vezes acontece, surgiu entre eles algo que os deixou perdidamente apaixonados um pelo outro. E, porque foi um amor à primeira vista, tão intenso e tão abrasador, logo ali, no “Calor da Noite”, decidiram unir os seus destinos. E Carolina e Jorge Nuno viveram um belo romance de amor.

Mas, e há sempre um mas, mesmo nas histórias de amor, o casal desentendeu-se e a briga feia foi subindo de tom, até que se separaram.

Despeitada por ter sido rejeitada, Carolina decidiu escrever um livro em que denunciou uma série de ilegalidades do seu ex-companheiro. Acusou-o de ter comprado árbitros que iam dirigir os jogos do seu clube, pagando-lhes com viagens, dinheiro e “alguns favores” de certas senhoras, acusou-o de evasão fiscal, de agressões, de perjúrio e fuga à justiça. Tudo acusações muito graves, que mais não foram que os desabafos mais íntimos e sofridos de Carolina. Mas esses desabafos tão sentidos foram ainda mais longe e Carolina para além de apontar o dedo ao seu antigo amor, acusou também nomes importantes ligados ao clube e ao futebol da região e até à pessoa da Polícia Judiciária que avisou Jorge Nuno que ia ser detido, o que os levou a fugir para Espanha.

A coisa ficou muito feia. Jorge Nuno não deve ter gostado nada do que Carolina disse sobre ele, que, a provar-se, o colocaria em maus lençois e o poderia levar à prisão. A ele e aos outros que, com ele andavam envolvidos em todas estas andanças. Aquilo que um senhor que tinha sido presidente de um clube rival do de Jorge Nuno, tantas vezes dissera que “o futebol estava como estava porque a culpa era do sistema”. E nunca ninguém disse o que era o sistema ou quem é que fazia parte do sistema. Como o povo costuma dizer “não se dava os nomes aos bois”.

Carolina, porém, chamou os bois pelos nomes, com a vossa licença, e ao escrever o livro, certamente por despeito, ingenuidade, ou mau aconselhamento, também ela ficou exposta aos rigores da lei, podendo ser constituída arguída por co-autoria moral de crimes efectuados pelo seu ex-companheiro. Mas, pelo menos, teve o seu momento de glória. A comunicação social apareceu em peso, entrevistou-a, deu publicidade à sua “obra”, coisa que a maior parte dos nossos bons escritores nunca conseguiram.


Mas a história ainda ainda vai no princípio e vai, seguramente, prosseguir brevemente na justiça.



No que respeita ao livro, ele teve o mérito de pôr a nú muitas das suspeitas que a maioria das pessoas tem desde há muito sobre o mundo do futebol e sobre as personagens que Catarina acusou (e outras), e teve igualmente o mérito de obrigar a justiça a mexer-se e a investigar mais a fundo com base não só na avaliação do próprio livro mas, interligando as várias acusações com o que já foi investigado no âmbito do processo “Apito Dourado”.


Do ponto vista literário, este livro não passará de um lixo, onde se misturam acusações, com pormenores das vidas privadas dos ex-amantes, alguns deles publicados com destaque nas páginas de certos jornais e que foram alvo da chacota geral, nomeadamente, aquela declaração de Catarina relativamente a Jorge Nuno:

“Tendo problemas de flatulência [...] de vez em quando descuidava-se [...] em cerimónias oficiais, levando-me a acender, de imediato, um cigarro para disfarçar o odor”.


Os ingleses chamam a este género de livros ‘kiss and tell’. Beijar e contar. Um género que não obriga a boa escrita, só a fraco carácter.


O certo é que uma história que parecia uma bela história de amor, ainda mais acobertada pelo calor do “Calor da Noite” está em vias de acabar muito mal.


Como na canção do Jorge Palma poderíamos dizer que, afinal, Catarina e Jorge Nuno estavam “no lado errado da noite”...

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Em bom português

O que pensariam os meus amigos se ao acederem ao blog deparassem com uma frase como esta:
oje porque chuvia muito, fiquei em casa a ver televisão e entretiveme com pogramas culturais e outros a fins. Por isso, a muleza foi tão grande que não me apeteceu escrever o testo para o blog”.


Eu sei o que pensariam de mim, escusam de o dizer.



E o que pensariam ao saber que o Teatro Nacional de D. Maria II colocou à venda um DVD em francês sobre o comediante, coreógrafo e pedagogo Jacques Lecoq, com legendagem em português – paga, aliás, pelo próprio D. Maria II – que foi tão mal feita, mas tão mal feita, que se revelou uma verdadeira desgraça e que de português tem quase nada?

Não há pedagogia nem pachorra que resistam, quando se assiste a um documentário com legendas num português tão correcto como indes, senti-lo, prolungamento, descubrir, espetáculo, estilisado, fisestes ou viagam.


Quem escreve assim ...

domingo, dezembro 10, 2006

De centro esquerda


“Sou de Centro Esquerda”, esta a frase, proferida pela Drª. Maria Cavaco Silva, em entrevista à revista Visão, que tem provocado sucessivas ondas de choque no Partido Social Democrata.

Mais, diz-se até que a posição pública assumida por Maria Cavaco Silva embaraçou o PSD de tal modo, que os dirigentes, deputados e militantes do partido, chegaram a duvidar de que a frase tivesse saído com grande destaque na capa da revista (mas foi mesmo, como prova a fotografia anexa). Fala-se já em levá-las a tribunal. Às duas, à Visão e à Drª. Maria.

Confesso que a mim também me chocou que a esposa do Presidente da República, ao que parece um homem conotado com a direita (o que está ainda por provar) e por ela apoiado para a eleição à Presidência da República, primeiro ministro justamente de um governo PSD, durante 10 anos, se tivesse assumido como sendo de esquerda, embora ao Centro.

Aliás, a minha atitude (a de choque) foi muito idêntica à que tive quando soube que a minha filha é adepta do Sporting, quando eu sou um benfiquista convicto. Neste caso particular, acho até que a notícia me poderia ter provocado um ataque cardíaco, tão forte foi o choque. E só não a levei a tribunal, porque era minha filha mas, de qualquer forma, para lhe fazer sentir o meu desgosto e o meu embaraço, decidi deserdá-la.


Ora, meus amigos, agora falando a sério, será que um mosquito vindo sei lá de onde, vos tirou a inteligência e os impede de raciocinar? Ainda que o Presidente fosse um homem de direita, o que é que impede que a esposa tenha uma opção política diferente? Será anti-constitucional? Será uma infidelidade conjugal?

A senhora, pensasse o que pensasse, podia até ter ficado caladinha e tudo estaria na paz do Senhor. Mas não, a Drª. Maria Cavaco Silva decidiu dizer publicamente que, em termos políticos é de centro esquerda. Muito bem, revelou coragem e demonstrou claramente que não tem medo de manifestar as suas opiniões, até em questões, como esta, que poderiam “chamuscar” a sua condição de Primeira Dama. Muito bem, uma vez mais.

Para além de uma pequena notícia de jornal, ainda não vi nem ouvi qualquer reacção por parte dos dirigentes do PSD. Mas, estou convencido que depois do primeiro embate, e já com a cabeça fria, ninguém se atreverá a dizer uma palavra que seja, sobre a tomada de posição da Drª. Maria Cavaco Silva, num país livre, onde as pessoas podem, livremente, expressar as suas opiniões.

Não me recordo, de resto, que os dirigentes, deputados e militantes do PSD tivessem ficado tão indignados quando, há uns anos, Roberto Carneiro era Ministro da Educação (pelo PSD) e, a esposa, deputada pelo Partido Socialista.
Enfim, outros tempos!

quarta-feira, dezembro 06, 2006

A ilusão

O homem não teria mais do que um metro de altura. Talvez nem tanto, noventa centímetros, quando muito. Trajava uma calça beije, casaco e camisa azuis e gravata entre o vermelho e o bordeau. Muito embora o vestuário conjugasse na perfeição, o semblante do homem destoava claramente. Tinha um ar triste.

Já me cruzara com ele momentos antes e fixara-o justamente pela sua pequena estatura. Aliás, cruzámo-nos duas ou três vezes, para ser mais preciso.

A determinada altura, num dos pequenos corredores do pequeno centro comercial, sentei-me quase em frente de um painel que ostentava, em cada um dos lados, como motivo decorativo, dois espelhos. Espelhos esses que refletiam imagens distorcidas das pessoas e que tanto as faziam gordas como magras, como altas como baixas, mas quase sempre horrendas e desproporcionadas em relação à realidade. Como aqueles espelhos que tanto nos faziam rir na velha Feira Popular, na conhecida “Casa dos Espelhos”, também conhecida pela “Casa dos Horrores”.

Dei, então, com o homem a deambular de um lado para o outro do corredor, parando por momentos em cada um dos espelhos, para, logo de seguida, continuar a andar. E fez isto uma infinidade de vezes. Chegava ao pé de um dos espelhos, mirava-se de frente, colocava-se de perfil e seguia até ao outro espelho do outro lado do painel.

Só ao fim de algum tempo, julguei perceber a verdadeira intenção do homem. Ajustar o nó da gravata, estava fora de questão, pois estava no lugar certo. Compor o casaco, também não seria o caso, muito embora o tamanho fosse um pouco excessivo para uma pessoa com a sua altura. Alinhar o penteado, tão pouco, os escassos cabelos estavam irrepreensivelmente penteados. Alimentar a sua vaidade com a miragem de um homem esbelto, muito menos, porque aquele tipo de espelhos são públicos inimigos da vaidade humana.

O que, portanto, o homem tanto procurava junto daqueles espelhos - e só podia ser isso - era a tentativa de conseguir que um qualquer ângulo desses espelhos, pudesse reflectir não os seus oitenta ou noventa cêntimetros bem medidos, mas, quem sabe, a altura que sempre desejara ter, de um metro e noventa, quem sabe se um pouco mais.

terça-feira, dezembro 05, 2006

A verdade nua e crua

A Rádio Pax, de Beja, desde há muito que nos habituou às excelentes crónicas escritas por Alberto Matos.

O texto que se segue foi transmitido hoje, 05.12-2006. E, porque está muito bem escrito, porque se trata de um assunto extremamente actual e porque a questão é séria e deve merecer a nossa melhor reflexão, achei que devia partilhá-lo convosco. Vale a pena pensar neste momentoso problema.


“O Presidente da República marcou para 11 de Fevereiro o referendo sobre a IVG (interrupção voluntária da gravidez), apelando aos participantes na campanha para que procurem “um debate sério, informativo e esclarecedor para todos aqueles que irão ser chamados a decidir uma matéria tão sensível como esta”.
A primeira condição para um debate sério e esclarecedor é partir da realidade concreta da sociedade portuguesa que, em matéria de aborto clandestino como noutras, nos coloca na cauda da Europa.
Todos podemos invocar os mais variados conceitos filosóficos, éticos e/ou religiosos (ou ainda a ausência deles) para sustentar o SIM ou o NÃO. Mas uma teoria que não se sustenta na experiência prática não passa de especulação, livre mas infecunda. E é sobre a realidade nua e crua da sociedade portuguesa, neste início do século XXI, que faz todo o sentido colocar aos cidadãos a seguinte pergunta: “Concorda com a despenalização da IVG se realizada por opção da mulher, nas primeiras dez semanas de gravidez, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”.
E qual é a realidade portuguesa em matéria de aborto? Todos os anos vão parar ao hospital mais de mil mulheres devido a complicações resultantes de abortos feitos clandestinamente, por curiosos ou mesmo pelas próprias mulheres, em desespero de causa. Algumas morrem, muitas sofrem lesões irreversíveis que as impedem de ser mães para o resto da vida. Outras ainda são conduzidas à barra dos tribunais, juntando esta humilhação ao sofrimento do corpo e do espírito que as marcará para sempre. Lembram-se que, no referendo de 1998, os partidários do NÃO garantiam que não haveria mais julgamentos de mulheres vítimas de aborto clandestino? É o que se tem visto…
O aborto é, evidentemente, um último recurso numa situação desesperada. Por isso mesmo, a sua prática não deve constituir mais um castigo ou uma vergonha para a mulher. Não é, evidentemente, um método alternativo de planeamento familiar. Mas, apesar de todas as campanhas de prevenção e mesmo com o recurso à pílula do dia seguinte há sempre, estatisticamente, milhares de mulheres obrigadas a recorrer ao aborto, pelas mais variadas razões. Esta é a verdade nua e crua e não vale a pena enterrar a cabeça na areia. Cabe aqui recordar outra promessa de 1998 – um investimento sério no planeamento familiar – furada, por exemplo por Bagão Félix que, uma vez no governo, tudo fez para travar uma educação sexual saudável e descomplexada nas escolas.
Um argumento habitual do NÃO é que uma decisão de tal gravidade não pode depender unicamente da vontade da mulher, devendo envolver o seu marido ou namorado. É desejável que isso aconteça. O problema é que, em muitos casos, já não há parceiro: ou porque este fugiu ás responsabilidades; ou porque a mulher, por razões do seu foro íntimo, entendeu não lhe comunicar que está grávida; ou ainda em situações mais graves, como a violação. Nestes casos (que estão entre as principais causas de aborto), onde está o parceiro? Infelizmente, é em profunda solidão que muitas mulheres são obrigadas a decidir.
E é por isso que elas devem dispor de todo o apoio médico e psicológico, em estabelecimento legal de saúde, onde ninguém chega e faz um aborto sem passar por uma consulta. Neste processo, com a devida informação, é possível até que algumas destas mulheres ou adolescentes mudem de ideias e descortinem alternativas que lhes permitam assumir a maternidade. Pelo contrário, se for à curiosa ou à clínica de luxo, num bairro fino, o aborto é para já! Desde que pague… E até pode lá encontrar um desses hipócritas que se declara objector de consciência à IVG… mas apenas no SNS, tentando sobrepor um qualquer corporativismo aos direitos de cidadania e à saúde das mulheres.
No debate que agora se (re) inicia, iremos assistir à invocação casuística da ciência, numa mistura perversa com a religião. Convirá recordar Galileu – “no entanto, ela move-se”, as rodas dos conventos, a condenação do preservativo e da pílula do dia seguinte. Os diversos “ayatollahs” são livres de pregar aos fiéis mas, por favor, não nos obriguem a viver numa sociedade confessional. Parece que o fundamentalismo não está só na Turquia nem do outro lado do Mediterrâneo. É que se o SIM vencer no referendo de 11 de Fevereiro, como estou convicto, ninguém fica obrigado a violar os seus conceitos éticos ou religiosos. Será apenas o triunfo do direito à livre escolha.
O debate ainda está no princípio, mas é importante colocar em cima da mesa a verdade nua e crua, pondo de lado toda a hipocrisia”.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Nem tudo o que luz ...

O ano passado, quando visitavámos o Palácio Imperial de Petrópolis, no Brasil, conhecemos um casal de portugueses, um pouco mais velhos do que nós, que também andavam por ali em turismo. Durante a visita, enquanto passávamos pelos salões e íamos ouvindo as explicações do guia, de quando em vez trocávamos impressões sobre aquilo que nos iam dizendo, alongando-nos um pouco mais sobre alguns aspectos mais significativos da nossa História.

E, conversa puxa conversa, não tardou que falássemos de política, mais propriamente da política que nos levou a permanecer portugueses e não sermos hoje espanhois.

“Como nós seríamos mais felizes se fizéssemos parte de Espanha. Como estaríamos melhor em termos de ordenados e pensões” dizia o meu companheiro de passeio. Ainda tentei argumentar mas senti, da parte dele, uma atitude bastante intransigente que roçava o confronto, pelo que decidi deixar morrer aquela e as outras conversas a partir dali.

Mas, a verdade, é que este sentimento pró-espanhol nem sequer me causou alguma admiração. Lembram-se que há bem pouco tempo uma sondagem do Semanário Sol, a que dei aqui o devido destaque, indicava que 28 % dos portugueses gostariam de ser espanhois. Por isso ...

Claro está que, como é hábito, pelo menos nos portugueses, normalmente, “vê-se o vinho que os outros bebem, mas não se vê os tombos que dão”. É, portanto, natural que os nossos compatriotas vejam que Espanha tem uma das mais elevadas taxas de crescimento da União Europeia, tem o emprego e os salários em alta (sobretudo este item é muito valorizado entre nós) e tem as contas públicas mais do que equilibradas.

Só que, como diz o Professor Daniel Bessa, nem tudo o que luz é ouro...

E assim, alertados que somos para o problema, temos forçosamente que olhar para o outro prato da balança e constatar que o crescimento de Espanha é quase totalmente assegurado pelo mercado interno e a inflação é das mais altas da UE. As exportações crescem muito lentamente e as importações crescem também, mas a um ritmo louco. O défice da balança de transacções correntes é o segundo maior do mundo, excedendo já os 8% do PIB.

Mesmo olhando para o fiel da tal balança onde se aferem os ganhos e as perdas, quase que juraria que os mesmos portugueses que afirmaram querer ser espanhois, permaneceriam fieis à sua crença. O vil metal, traduzido em melhores vencimentos, continua a ser um chamamento muito forte.

Mas, não esqueçam aqueles que pensam deste modo que, e volto a citar o Professor Miguel Bessa,

“Em Economia não há resultados definitivos. Estamos e estaremos, eternamente, no intervalo que separa a primeira de uma segunda parte”.

domingo, dezembro 03, 2006

Novamente à volta da gramática

Já em Setembro tinha aqui feito algumas considerações sobre o TLEBS, a “Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário”. Referi-me então, nomeadamente, às grandes alterações que estavam a ser introduzidas já no ano lectivo em curso ao nível da gramática, e às enormíssimas confusões e falta de preparação para essas alterações, por parte de professores, pais e da população em geral.

E o reflexo disso tem-se vindo a sentir um pouco por toda a parte. E com aspectos psico-somáticos e depressivos que urge atacar quanto antes.

Miguel Sousa Tavares, por exemplo, reflectia há dias sobre o futuro do seu cão. Dizia ele que, até há pouco tempo, pelo menos do ponto de vista gramatical, o seu cão era um substantivo. Ora, neste momento, MST só tem a certeza que o cão continua a ser cão, mas substantivo é que ele tem a certeza que ele já não é. Passou a ser um “nome comum, contável, animado e não humano”, o que nos leva a pensar que ou o cão não é o mesmo ou alguém lhe deu qualquer coisa estragada para comer, ou que, se calhar, estamos perante um caso de polícia. Não por causa do cão, mas pelos génios que se lembraram de complicar aquilo que sempre foi fácil e acessível.

Mas o que me deixou mais abazurdido, foi conhecer a razão que levou este grupo de linguístas a mexer tão profundamente na nossa gramática:
é que a gramática (esta mesma gramática que nos acompanha há tantos anos) já não era alterada desde 1976, calculem.
Acho que é uma razão plenamente justificável. De facto, não se compreende como, durante tantos anos, ninguém se lembrasse de lhe fazer uma alteração, pequena que fosse, permitindo, deste modo, que um cão continuasse a ser – indevidamente - durante todos estes anos, um substantivo, e não um nome comum, etc., etc., etc.
São coisas como estas que fazem com que nos atrasemos relativamente a todos os outros países da comunidade... é injustificável!

Mas a cereja em cima do bolo surgiu na posição pública assumida por Vasco Graça Moura, José Saramago e Eduardo Prado Coelho, entre outros intelectuais e professores, que entregaram um abaixo-assinado à Ministra da Educação. O documento pede a suspensão “imediata” da TLEBS. Consideram-na “incorrecta e abstrusa” e a sua aplicação “terá gravíssimas consequências para o país”.

Abstrusa, nem mais.

Sendo assim, resta-me a esperança que o cão do MST, quero dizer, que o cão que pertence ao Miguel Sousa Tavares, para além de cão, volte a ser um substantivo. Ele (o cão) bem o merece!

quarta-feira, novembro 29, 2006

Mário Cesariny


Morreu Mário Cesariny (1923-2006).

Poeta, surrealista e tudo – eis um retrato à medida de Mário Cesariny, o artista português que de uma forma mais plena e intensa assumiu o surrealismo no nosso país: não como método ou escola, mas como forma de insurreição permanente, na arte e na vida.

Cesariny, para além de poeta foi também pintor, actividade em que, de resto, mais se distinguiu na sua fase inicial. Mas quer numa quer noutra faceta, Cesariny foi uma figura sempre inquieta e questionadora

Para mim, no entanto, Cesariny era o poeta, embora ele próprio, se classificasse:

"Sou um poeta bastante sofrível numa época em que o tecto está muito baixo."

O humor, o recurso ao non-sense e ao absurdo, foram marcas da escrita de Cesariny, de uma ironia por vezes violenta, que incidiu sobre figuras e mitos consagrados da cultura portuguesa e ocidental.

Como homenagem a este grande vulto das nossas artes, porventura um tanto incompreendido, deixo-vos um poema, a que ele deu o nome de


Pastelaria


Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra

terça-feira, novembro 28, 2006

Coincidências

Com poucos segundos de diferença, ouvi num dos noticiários da TSF do passado sábado, dia 25, que nesse exacto dia se realizava o primeiro dia da “recolha de bens alimentares” promovida pelo Banco Alimentar Contra a Fome, e, simultâneamente, o “dia sem compras”, uma acção que é dinamizada pelo Grupo de Acção e Intervenção Ambiental de Gaia.

Convenhamos que as notícias eram um tanto ou quanto contraditórias e, por isso, deixaram as pessoas que as ouviram um pouco confusas. Se por um lado, se incitava os cidadãos a serem solidários e a ajudarem com alimentos muitas famílias que são comprovadamente carenciadas, por outro, dizia-se às mesmas pessoas que durante 24 horas não gastassem um cêntimo que fosse ... no que quer que fosse.

Embora esta última iniciativa (a de Gaia) não tenha prejudicado a primeira (a do BA), ela foi marcada, quanto a mim, numa data que, de certa forma, gerou alguma confusão.

Compreendo a lógica do Grupo de Gaia, em querer seduzir os consumidores a levarem uma vida simples, a passear com familiares e amigos, em vez de gastarem dinheiro. No limite, a fazê-los perceber como são dependentes do consumo. Tudo bem!
Mas, na verdade, o dia não foi bem escolhido. O Banco Alimentar Contra a Fome faz as suas campanhas em, apenas, dois fins-de-semana por ano. Havia, por isso, muitos outros dias disponíveis durante o ano para o Grupo de Gaia promover as suas iniciativas. Isto, naturalmente, para não falar nos aspectos sociais, humanitários e de solidariedade que estão subjacentes às campanhas do Banco Alimentar

Mas por coincidência, ou por desconhecimento o Grupo de Gaia logo fez incidir a sua acção num dos quatro dias em que Banco Alimentar está na rua.


Uma coincidência infeliz.

segunda-feira, novembro 27, 2006

Velocidades

Embora aceitando a existência de um Código da Estrada que, para além de muitas outras disposições, regulamenta quais os limites mínimos e máximos permitidos para a circulação dos veículos motorizados nos vários tipos de estradas e nos aglomerados populacionais, devo dizer que sempre defendi que as velocidades estabelecidas pelo CE são apenas referenciais, e que, portanto, devem ser respeitadas, tanto quanto possível. No entanto, penso que não devemos fazer dessa lei um dogma, uma obrigatoriedade absoluta e cega, muito embora as autoridades possam não estar de acordo com esta tese e daí a pregar-nos uma valente multa é um esfregar de olho.

Contudo, e independentemente do que pensem sobre o assunto, têm que admitir que há para aí tantas estradas onde se rola mal a 100 quilómetros e outras onde o carro até nem se sente quando vamos a 120/130 quilómetros à hora.

Também nos podemos questionar se a velocidade estabelecida deve ser rigorosamente a mesma quando o piso está “quase-molhado”, molhado ou seco.

E podemos, ainda, pensar se o tipo de viatura tem alguma coisa a ver com isto. Ou seja, se um BM novo tem a mesma segurança que um “chasso” de um Fiat 600 já com mais de 30 anos em cima. Em nome do Código da Estrada e das suas regras, dever-se-á multar um BM que vai numa auto-estrada acima dos 150 e ficar impávido e sereno se o Fiat circular a 119 à hora?

E quanto aos condutores, o que dizer? Dever-se-á tomar em consideração a sua idade, o tempo de encartado, a experiência de ter conduzido mais de meio milhão de quilómetros ou apenas dois ou três mil?


Há muitos anos que “prego” estas ideias mas não consigo fazer-me ouvir. Ou pior, oiço, por vezes, atirarem-me sobranceiramente à cara que “o Código é para se cumprir”!

Por isso, achei imensa piada a um bocado de prosa que o Miguel Sousa Tavares incluiu numa sua crónica publicada no “Expresso” e que, com a devida vénia, passo a citar:


“... em nenhum outro lugar vi uma auto-estrada tão boa e tão deserta. Mas é aqui, precisamente, onde nada se passa e só uma besta consegue ter um acidente, que já fui apanhado duas vezes em excesso de velocidade.

Mas percebe-se: 90% das mortes na estrada, em Portugal, acontecem fora da auto-estrada, e 90% das multas por excesso de velocidade são cobradas na auto-estrada – chama-se a isto “prevenção rodoviária” ...”.


Mas, agora pergunto eu, as autoridades são sempre tão rigorosas como o Miguel Sousa Tavares insinua? Nem sempre, depende dos casos. Que se saiba, quando o Ministro da Economia, Manuel Pinho, foi apanhado na A1 a 212 quilómetros à hora, as autoridades não autuaram o condutor com as penalizações previstas pelo Código da Estrada.

Atrever-me-ia, então, a dizer que o Ministro não foi multado não por ser titular daquele cargo, mas sim porque a GNR considerou que o potente automóvel oferecia suficientes condições de segurança para circular àquela velocidade.

Como vêm, as disposições do Código da Estrada não são verdades absolutas, mas sim, como eu dizia, apenas referenciais que, como tal, podem ser apreciadas consoante os casos (ou as pessoas) em apreço.

domingo, novembro 26, 2006

Ser fã vai-nos custar 16 milhões de euros

Para mim, e desde sempre, a Caixa Geral de Depósitos é um banco como os outros, um tanto ou quanto antiquado nos processos e na postura dos seus empregados, é certo, mas um banco comercial que vende praticamente os mesmos produtos dos outros bancos, e comercializa as mesmas operações bancárias, praticamente com o mesmo nível de comissões dos outros bancos. Mas há, de facto, uma diferença substancial. A Caixa é um banco de capitais públicos, cujo o único accionista é o Estado, enquanto que os outros são privados.

Pois o problema é o de sempre, o das instituições de capitais públicos que gastam o dinheiro dos contribuintes (o nosso, portanto) de uma forma pouco clara e, na maioria das vezes, no mínimo, duvidosa.

Li no Diário Digital que a Caixa Geral de Depósitos decidiu fazer uma campanha publicitária, provavelmente com o intuito de angariar mais clientes (sobretudo clientela jovem), abrir mais contas, vender mais produtos, mais crédito à habitação, campanha essa que tem como protagonista o nosso seleccionador nacional de futebol, o Sr. Scolari. Até aqui, nada a dizer.

Aliás, há uma pequena coisa a dizer, é que essa campanha vai custar qualquer coisa como 16 milhões de euros.

Dir-se-á que a Caixa apenas está a empregar a mesma estratégia que o Banco Espírito Santo teve quando contratou o Cristiano Ronaldo, ou a do Milenium BCP com a Sara Tavares, mas, em minha opinião, dir-se-á mal. O BES e o BCP são privados e o dinheiro que eles entendam gastar é lá com eles, é um problema que só diz respeito às respectivas Administrações e aos seus accionistas.

No caso da Caixa é diferente. Os 16 milhões saem do nosso bolso e, ainda por cima, nós não temos a certeza que o retorno desse dinheiro venha a ser conseguido. Isto porque apesar do Sr. Scolari ser uma pessoa simpática e até carismática, a Caixa Geral de Depósitos continua a ser um banco envelhecido e incapaz de atrair a tal clientela jovem. O que nos faz questionar se este não será um dinheiro mal gasto e, portanto, desperdiçado?

quinta-feira, novembro 23, 2006

Banco Alimentar Contra a Fome



Gostaria de lhes recordar que no próximo fim-de-semana, dias 25 e 26 de Novembro (sábado e domingo) vai haver uma nova recolha de alimentos em 127 estabelecimentos comerciais. Os bens alimentares serão distribuídos a partir da próxima semana, por 265 Instituições de Solidariedade Social previamente seleccionadas, a cerca de 55.200 pessoas com carências alimentares comprovadas.

E não é nada difícil. Para aderir a esta campanha basta aceitar um saco de plástico entregue pelos voluntários do Banco Alimentar Contra a Fome de Lisboa, devidamente identificados, (localizados à entrada de cada um dos estabelecimentos comerciais), colocando no seu interior bens alimentares de preferência não perecíveis, tais como leite, conservas, azeite, bolachas, açúcar, farinha, massas, óleo, etc.

Mas este ano, poderemos continuar a ser solidários por mais uns dias. É que, para além da campanha tradicional do próximo fim-se-semana, será realizada até 3 de Dezembro uma nova modalidade de recolha, mais flexível e adaptável a estabelecimentos de menor dimensão, designada “Ajuda-Vale”.
A Campanha-Vale permitirá a recolha de alimentos em que o cidadão possa decidir quais os produtos que pretende destinar ao Banco Alimentar Contra a Fome (apenas 5 qualidades de produtos em cada estabelecimento, e de marca própria), tendo unicamente o cliente de apresentar o Vale na caixa para pagamento. Os produtos que terão um código de barras, tornarão possível um controlo informático efectivo e serão entregues no BA pelo próprio estabelecimento, o qual entregará entregará também no BA uma certificação de auditoria desta campanha. Este sistema, foi especialmente pensado para pequenas superfícies em que por razões de espaço é difícil a presença de voluntários, e será levado a cabo nessas pequenas superfícies e, por vontade solidária de outros grupos, em todas as lojas de das cadeias Jumbo⁄Pão de Açúcar, Pingo Doce, Feira Nova, Dia⁄Minipreço e Lidl.

Vamos, então, todos ajudar a ALIMENTAR ESTA IDEIA.

quarta-feira, novembro 22, 2006

A Rapariga de Olhos Fixos

E, já que recordei Tim Burton, aqui está mais uma das suas preciosidades



Conheci uma miúda
Que se punha a olhar fixamente
Para tudo o que via à frente;
Era-lhe indiferente.

Olhava para o chão,
Olhava para o alto,
Olhava para ti longamente
Se te apanhasse incauto.
Mas depois de ter ganho o concurso local de olhar fixamente,
Levou os olhos a banhos
Para descansarem finalmente.

terça-feira, novembro 21, 2006

Juntos ... mas separados


Quando em Março deste ano publiquei aqui uma coisita de um dito produtor de cinema e escritor chamado Tim Burton, confessei que conhecia muito pouco dessa personagem. Tinha visto um filme e lido um livro feitos por ele e sabia, apenas, que era um excêntrico e um criador de um universo fantástico, não acessível a todas as pessoas. Não lhe conhecia sequer o rosto.

No entanto, uma notícia saída recentemente numa revista, fez o favor de mo apresentar, a ele a á mulher, a actriz Helena Bonham Carter.

Mas o que mais me chamou a atenção, não foi a postura desgrenhada que fica sempre bem a um excêntrico. O que mais me fascinou foi que ambos assumiram uma forma muito original de casamento, que, ainda por cima, e segundo ambos asseguram, é excelente.

É que os dois vivem em casas separadas mas contíguas, ligadas unicamente por um corredor. E a explicação é simples, diz a actriz: “O lado dele é desarrumado, o meu é bonito e ele gosta de visitá-lo, mas não existe qualquer hipótese de ele ir para lá morar”

Uma excelente ideia que poderia ser a solução ideal para tanto casamento que há por aí ...


Ah, o Tim Burton é o que está à esquerda ... quando estamos a olhar de frente para a fotografia.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Turquia, ainda mais longe

Quando há cerca de um ano escrevi neste espaço que a abertura das negociações para a entrada da Turquia na União Europeia se tratava apenas um primeiro passo, disse na altura que a Turquia tinha ainda grandes problemas por resolver, nomeadamente, o gravíssimo problema com os curdos, o do não reconhecimento do Chipre e as violações dos direitos humanos.

Só que, um ano depois, a Comunidade, agora dos 25, está a ser mais severa na avaliação que faz das condições que a Turquia necessita ter para entrar no clube.

As limitações à liberdade de expressão, a continuação dos casos de tortura e de maus tratos, a discriminação das minorias, a preponderância dos militares em assuntos civis, as relações com o Chipre e o desrespeito dos compromissos assumidos com a União, são factos de peso que podem vir a determinar a suspensão total ou parcial das negociações com Ancara.

Embora Bruxelas reconheça a existência de alguns (poucos) progressos, existem alguns dossiers que causam grande preocupação no seio da Comunidade. E, um dos que mais incomoda, é a constatação que a Turquia continua a negar o acesso aos seus portos a navios com bandeira da República do Chipre ou cuja última escala tenha sido em Chipre, restrições que violam claramente os acordos anteriormente firmados entre as partes.

Relativamente ao Código Penal Turco, algumas das suas disposições causam grande preocupação e podem contribuir para criar um clima de auto-censura interna generalizada.

Quanto à liberdade de culto, continua a ser “geralmente respeitada” mas as comunidades religiosas não-muçulmanas continuam a deparar-se com dificuldades no terreno.

O sentimento geral dos turcos é que, independentemente dos esforços que a Turquia faça, a Europa nunca os aceitará e, por isso. vai crescendo, cada vez mais no país, o sentimento anti ocidental.

Sente-se, de facto, que a dinâmica reformista demonstrada inicialmente abrandou significativamente. A onda de liberdade que surgiu quando as negociações começaram, foram, a pouco e pouco, perdendo o ânimo.

Mas, como disse então, se a Europa fechar as portas à Turquia, poder-se-á perder a ponte que permita o diálogo entre o Ocidente e o mundo muçulmano e estar-se-á, porventura, a empurrar os turcos para se juntarem às fileiras dos fanáticos muçulmanos que pretendem, por qualquer meio, derrubar a civilização ocidental.

Será bom não esquecer que o fundamentalismo muçulmano turco está cada vez mais activo, muito embora se compreenda que a Comunidade não pode aceitar a inclusão de um qualquer país, a qualquer preço. E a Turquia há muito que sabe quais são as condições de acesso.

quinta-feira, novembro 16, 2006

Afinal, há ou não prioridade nas passadeiras para peões?

Para quem, até agora, julgava que o atravessar de uma passadeira constituía um seguro de vida, devidamente autenticado e oficializado, porque ali o peão tinha a prioridade absoluta sobre esse inimigo público chamado carro, ou camião ou outro qualquer veículo motorizado (ou não), desengane-se de vez.

As passadeiras, pelo menos a maioria delas estão mal sinalizadas e uma percentagem importante das mesmas quase não se vê porque a tinta (de certeza de má qualidade) já se apagou pelo efeito do sol, da chuva e do próprio rodar dos pneus. Portanto, na prática, elas não existem de facto, e as que ainda resistem, são confusas e, como disse, mal sinalizadas. E, quando existem, elas não são prioridade para quem nelas circula. Mas porque circula está mal dito porque as pessoas não andam às voltas em cima das passadeiras, a não ser as que vão a falar ao telemóvel, o melhor será dizer que as pessoas que atravessam as passadeiras têm que ter um cuidado redobrado porque, ao contrário do que muita gente julga, a passadeira não dá qualquer prioridade ao peão.

Pelo menos é o que diz um parecer jurídico do ACP, produzido pelo Gabinete Jurídico daquele clube e que veio publicado na sua revista de Outubro.

Para não me alongar demasiado, porque os pareceres jurídicos são normalmente longos (e confusos), tentarei resumir as conclusões a que chegaram os causídicos chamados a opinar.

Assim, os peões devem atravessar a faixa de rodagem nas passadeiras, mas atenção, essas passagens, repito, não conferem prioridade aos peões. Destinam-se, apenas, a indicar o local onde deve ser efectuada a travessia e devem ser sempre utilizadas quando o peão se encontre a cerca de 50 metros do local onde pretende atravessar.

Ora bem, deste primeiro artigo, já se poderá concluir o seguinte. A passadeira não confere qualquer prioridade ao cidadão. Por isso, várias coisas podem acontecer: ou o peão ao atravessar a passadeira olha muito bem para todos os lados, assegurando-se que pode passar sem perigo, ou corre o risco de ser passado a ferro por um carro mesmo em cima da dita passadeira. Agora, se houver uma passadeira a menos de 50 metros do local, e se o peão atravessar fora dela, naturalmente que está sujeito a ser novamente passado a ferro pelo mesmo carro e, ainda, de ser multado por atravessar fora da passadeira, porque violou a lei que estabelece claramente que as travessias das ruas devem ser efectuadas nas passadeiras, quando elas existem.

Portanto, se não sabiam, ficam agora a saber que as passadeiras se destinam única e exclusivamente a indicar o local da faixa de rodagem onde se pode atravessar. Não pela segurança do cidadão, claro, mas porque a utilização da via pública não pode ser caótica e é necessário discipliná-la. Ou seja, os peões devem saber onde podem ser tranquilamente atropelados por um carro.

Há, no entanto, uma excepção. Se o peão estiver a atravessar uma passadeira que tenha sinalização luminosa, e ela mostrar o homenzinho vestido de verde, aí o peão pode avançar tranquilo e em segurança porque a prioridade lhe assiste. Prioridade que continua a ter, mesmo que durante a travessia as luzes se alterem e o homenzinho mude de roupa para vermelho, porque o condutor tem a obrigação de aguardar que a travessia se complete.

Resumindo, atravessar uma zebra significa “ter um olho no burro e o outro no cigano”, porque mesmo nos casos em que exista sinalização luminosa, não devemos embarcar em excessos de confiança, porque, infelizmente, todos conhecemos casos de atropelamentos em passadeiras, mesmo naquelas em que a prioridade dos peões é inquestionável.

Mas o parecer do ACP deixou-me algumas dúvidas quando diz que “o condutor deve moderar a velocidade do veículo e se necessário parar, a fim de permitir a passagem (nas passadeiras sem sinalização luminosa) dos peões que já iniciaram a travessia”. E diz mais “a obrigação de parar existe mesmo que não haja uma passagem própria para peões e estes já tenham iniciado o atravessamento da faixa de rodagem”.

A conclusão, portanto, parece óbvia. A lei diz que os peões só têm prioridade nas passadeiras com sinalização luminosa e, como tal, os condutores devem abrandar ou mesmo parar. Contudo, parece haver alguma contradição na própria lei, ao dizer que os condutores também devem afrouxar a velocidade ou mesmo parar, quando os peões atravessem as faixas de rodagem nas passadeiras sem sinalização luminosa ou fora delas. Ou seja, os condutores devem sempre afrouxar a velocidade ou mesmo parar com passadeiras ou sem passadeiras, com prioridade dos peões ou sem ela.

Com pareceres jurídicos tão claros como este só vos posso sugerir que não facilitem. Quando atravessarem uma rua, pelo sim pelo não, olhem bem para todos os lados para não serem surpreendidos.

quarta-feira, novembro 15, 2006

Auto-Retrato

Há uns tempos, terminei um texto com um verso do Bocage que me pareceu adequado ao que tinha escrito. Pelos vistos nem texto nem verso tiveram grande saída, uma vez que ninguém se dignou fazer qualquer comentário. Nem os “habitués” vieram a terreiro nesse dia.

Mas, voltando ao poeta, será bom recordar que Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805) é uma personagem intemporal, um poeta da liberdade, umas vezes erótico, outras lírico, mas sempre irreverente.

Com efeito, da sua pena contundente saíram sátiras impiedosas, críticas ao modelo de sociedade, ao governo e aos poderosos de uma maneira geral. O novo–riquismo, a mediocridade, as convenções sociais, o clero, os médicos, os avarentos e os literatos, entre outros, foram, também, objecto da sua observação rigorosa e da sua crítica corrosiva.

Apesar de tudo, Bocage ficou conhecido principalmente por ser um poeta jocoso e anedótico. Por isso os seus versos satíricos são os mais conhecidos.

Hoje, deu-me para recordar Bocage e para lembrar uma poesia que mostra a forma como o poeta se retratava, como se via a si próprio, poema a que ele chamou Retrato Próprio.
_________________________________
Magro, de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste da facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno.
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Incapaz de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos por taça escura
De zelos infernais letal veneno:
______________________________________
Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades:
_______________________________
Eis Bocage, em quem luz algum talento;
Saíram dele mesmo estas verdades
Num dia em que se achou mais pachorrento.

terça-feira, novembro 14, 2006

O que não se disse ...

Na semana passada esteve em Lisboa o maior Porta-Aviões nuclear do mundo. O “Enterprise” (O Big E, como também é conhecido o navio), é tão grande, tão grande, que devido à sua dimensão, teve que ficar ancorado ao largo de Lisboa, pois não conseguiu entrar no estuário do Tejo.

Com uma tripulação superior a 5 mil pessoas, este navio, com mais de 93.500 toneladas, é uma verdadeira cidade flutuante. Através do labirinto de corredores que percorrem o Porta-Aviões, existe de tudo um pouco: lojas, ginásios, gabinetes jurídicos e tudo o mais que costuma haver numa cidade em terra firme.

E a capacidade bélica deste “monstro” é de tal ordem que tem a possibilidade de lançar cada um dos 72 aviões que compõem a frota em cada 30 segundos.

Por isso, a beleza e a grandiosidade da estrutura mistura-se com a sensação de angústia provocada pelo seu poder destrutivo.

Mas esta foi a notícia que a generalidade dos portugueses deu conta através dos jornais e, principalmente, das televisões. O que não se disse é que, a exemplo, aliás, do que acontece sempre que um navio norte-americano vem a Lisboa, independentemente da qualidade e da grandeza do navio, é que a embaixada dos Estados Unidos oferece gratuitamente um determinado número dos seus “marines” a diversas entidades, para trabalho comunitário durante um dia.

Desta vez, 30 desses “marines” foram “oferecidos” à Entrajuda (que ainda dispensou uns quantos a outras Instituições de solidariedade social), onde durante um dia inteiro de trabalho, rebocaram e pintaram os muros exteriores do Banco Alimentar Contra Fome de Lisboa.

Deste trabalho solidário e voluntário, nada veio a público. Por isso, eu achei que devia ser devidamente publicitado.

Estamos habituados a que dos “States” nos chegue o pior e o melhor e, como é costume, desancamos sem dó nem piedade os americanos quando as coisas más que por lá se passam nos chegam aos ouvidos. Quando sabemos das boas, como é o caso, muitas vezes nem damos por elas.
Como se vê nunca se deve confundir a árvore com a floresta, se é que me entenderam!

Ai não que não sabem ...

Depois do Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, ter deixado claro que a partir de 2007, os juros obrigacionistas pagos a investidores de sucursais no estrangeiro vão ser sujeitos a IRC e IRS, João Salgueiro, Presidente da Associação Portuguesa de Bancos, afirmou:

“A Banca sabe muito bem como pode deixar de pagar impostos”.

Oh, como sabe. Como se alguém tivesse dúvidas sobre isso ...


A verdade é que, quer João Salgueiro quer os banqueiros em geral, seguem aquela conhecida teoria de Stephen Covey:

“Se continuarmos fazendo o que estamos fazendo, continuaremos conseguindo o que estamos conseguindo”.

domingo, novembro 12, 2006

Até quando?

Encerra hoje a secular Feira de S. Martinho da Golegã e, simultaneamente, a XXXI Feira Nacional do Cavalo e a VIII Feira Internacional do Cavalo Lusitano que, durante uma semana, constituíram o ponto de encontro de todos os aficcionados do mundo equestre.
A importância deste certame é de tal monta, que é hoje um dos mais importantes eventos nacionais conhecidos mundialmente e que atrai milhares de pessoas vindos dos cinco continentes.
Como resultado deste facto, a Golegã foi designada oficialmente desde 1998 a Capital do Cavalo e, a partir do ano passado, passou a integrar as capitais europeias do cavalo na rede Euroequus, juntamente com Jerez de la Frontera (Espanha), Warengen (Bélgica) e Pardubice (República Checa).
Mas, para além da festa dos cavalos e dos cavaleiros, a maioria deles garbosos e vaidosos na sua apresentação, não faltaram, também, a água pé e as castanhas assadas próprias da época, os inúmeros "tascos" e restaurantes, roulotes e barracas de comes e bebes e a massa imensa de uma multidão que, presumo, tem vindo a aumentar de ano para ano.
E se, como parece, faz parte da festa a união tão próxima entre visitantes e cavalos, ambos em constante movimento nas estreitas ruas e ruelas da vila, festa, aliás, de características únicas, acho que chegou a altura dos respectivos promotores começarem a pensar menos nesse aspecto tão castiço e tradicional e reflectirem um pouco mais sobre a segurança que tal evento exige, tudo isto, sem que se perca a beleza e a pureza de uma festa que é tão bonita.
Definitivamente a complacência dos visitantes em serem "atropelados" por cavalos impacientes com tanta gente à sua volta, conduzidos por cavaleiros, alguns já com uns copos a mais ou, aqueles outros que fazem questão de mostrar a sua jactância montada em cima de um bicho a rondar os dois metros de altura, deve terminar.
Eu vi no passado sábado, dia 11, um cavalo escorregar na calçada e cair em cima de umas quantas pessoas que estavam mesmo ao lado do animal. Eu vi uma disputa entre cavaleiros que circulavam em sentido contrário e que impuseram a sua passagem à custa das esporas, e que levaram os pobres cavalos a empinarem-se e a assustar a multidão. Eu vi um cavalo ficar tremendamente assustado com o rebentar de um balão de uma criança e que, para além de se empinar, "disparou" uns quantos coices que só por milagre não atingiram quem estava por perto.
Sem que se perdesse a imensa beleza que é a festa do cavalo, os técnicos podiam equacionar a possibilidade de fazer circular as montadas por ruas exclusivas para elas até ao picadeiro central e deixar as outras artérias apenas para a multidão que deambula pela vila. Ou, não sendo possível, ou não querendo ser tão radicais para que não se perca a simbiose entre o público e os cavalos e cavaleiros, criar nas ruas mais largas, uma separação a meio da rua para que, de um lado, andassem as pessoas e do outro os cavaleiros.
A continuação da situação actual, porque é tradição ou porque sempre foi assim, não justifica nem beneficia quem quer que seja. Certamente que teremos todos melhores condições para admirar com muito mais detalhe e um olhar mais crítico, um bonito alazão, bem aparelhado e arranjado, montado por uma amazona vestida a rigor, que passe a três metros de nós, do que sentir o bafo quente do cavalo já nas nossas costas, ansioso por abrir caminho e empurrando e assustando quem segue no mesmo sentido. E há que não esquecer os milhares de crianças e idosos que se encontravam presentes na Golegã.
Até quando, pergunto? Será necessário que por ali aconteça um acidente que provoque males maiores, quem sabe se alguma morte? Deixem-nos gozar uma festa que é tão bela e que fascina milhares e milhares de visitantes vindos de todo o lado. Usem a imaginação e ponham em destaque o que, na verdade, nos leva ali.
Deixem-nos admirar a verdadeira essência da festa mas com os cuidados necessários para salvaguardar a segurança de quem, afinal, também faz parte dessa mesma festa, as pessoas.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Quem confessa o seu pecado ...

Uma carta deliciosa, escrita em Novembro de 1871, pelo poeta Cesário Verde (1855 - 1886) ao seu amigo João de Sousa Araújo


Meu prezadíssimo amigo

O princípio das minhas cartas devia-o mandar imprimir (à laia das circulares), para me tirar o trabalho de lhe estar sempre a dizer a mesma coisa, pedindo-lhe desculpa de não ter escrito mais cedo, e alegando para isso razões falsas. Ora como eu não sou mentiroso por gosto, e como a franqueza nos crimes veniais é circunstância muito atenuante, quando o juíz é indulgente e honra com a sua amizade o pobre réu, contrito lhe confesso quem é o cúmplice no meu delito.
É a preguiça a causa principal dos meus crimes, e se o amigo não estivesse tão longe, ver-me-ia corar de vergonha pelo meu desleixo.

Espero ansioso a sua absolvição. (...)

quarta-feira, novembro 08, 2006

Mesmo assim conseguimos sobreviver

Já há uns tempos que a ideia não me sai da cabeça. À medida que vou ouvindo jovens papás a fazer recomendações atrás de recomendações às suas crianças, não posso deixar de me interrogar como é que a rapaziada da minha geração conseguiu sobreviver?
Eu sei que a intenção deles é a melhor, mas será que não se está a exagerar um pouco?

Quem nasceu nas gerações de 60, 70 e até mesmo 80 do século passado (esta coisa de termos vivido no século anterior pode, provavelmente, explicar muita coisa) teve com toda a certeza muitas noites de insónia só de pensar como é que conseguimos fintar a sorte, já que:

- os carros não tinham cintos de segurança, nem apoios de cabeça, nem sequer airbags para o condutor, quanto mais para o passageiro do lado, os ocupantes de trás e os outros airbags laterais; pequenos ou já grandotes íamos soltos sem cintos de segurança e ninguém nos ralhava porque não era perigoso;

- as camas de grades e os brinquedos (eles eram tão poucos e nem todos os meninos tinham a sorte de ter brinquedos) eram pintados com tintas muito duvidosas, que continham chumbo e outros venenos;

- andávamos de bicicleta para lá e para cá e não havia capacetes de protecção;

- brincávamos à vontade nas ruas até as nossas mães nos chamarem já de noite escura;

- bebíamos água da torneira, de uma mangueira, de uma bica ou de uma fonte em vez de beber águas minerais, em garrafas esterilizadas e com datas de validade;

- não havia telemóveis e os nossos pais, a maior parte das vezes, não faziam qualquer ideia onde é que nós estávamos;

- tínhamos aulas só de manhã ou só de tarde e íamos almoçar a casa. Não tínhamos explicações se havia más notas, o que havia era um ralhete, às vezes uma tareia e fazíamos um esforço redobrado para termos mais aproveitamento;

- cabeças partidas e joelhos ensanguentados, alguém se queixava disso ou alguém ficava preocupado?

- comíamos à vontade doces e pão com manteiga e ninguém andava obsecado com obesidades ou colesterol;

- Nem sei se vão acreditar, mas não havia playstations, Nintendos, jogos de vídeo, CD’s, computadores e chats na net. Não havia sequer Net, só amigos;

- na escola quando reprovávamos (embora ainda ninguém se preocupasse com o insucesso escolar) os papás não iam a correr consultar um psicólogo ou um psicoterapeuta. Quando muito davam-nos um valente par de bofetadas e punham-nos a trabalhar no emprego mais ranhoso que houvesse perto de casa, durante os três meses de férias, para aprendermos;

- não se falava em dilexia, problemas de concentração e hiperactividade;

- tínhamos liberdade, fracassos, sucessos, deveres e aprendíamos a lidar com cada um deles;

E a pergunta que tanto nos atormenta é, afinal, como conseguimos, apesar de tudo, sobreviver e, acima de tudo, como conseguímos crescer, desenvolver a nossa personalidade e ter valores morais e éticos.

Podia ser uma grandessíssima chatisse mas, no fundo, lá bem no fundo, nós éramos muito felizes, oh se éramos!

terça-feira, novembro 07, 2006

Os nomes que dão nome à nossas ruas


Os nomes que dão dados às ruas das grandes cidades, estão normalmente associados a muitas histórias e em especial à mudança de regimes políticos. Uma rua que tenha hoje um determinado nome, pode amanhã, se houver uma revolução, ostentar um nome completamente diferente.

Foi assim com o 28 de Maio, com o 25 de Abril mas, sobretudo, com a mudança do regime monárquico para a República. Como se tivesse havido um sismo, varreram-se as placas com os nomes de personalidades, de santos e até de acontecimentos que estavam ligados à monarquia.

A Avenida António Maria de Avelar é hoje a Avenida Cinco de Outubro, a Avenida D. Amélia passou a chamar-se Avenida Almirante Reis, a Avenida Ressano Garcia mudou de nome para Avenida da República e a Ponte Salazar passou a Ponte 25 de Abril. Isto só para dar alguns exemplos.

Mas outra característica da atribuição de nomes de ruas é marcada pelas datas. São a Rua Primeiro de Maio, Rua Primeiro de Dezembro, Rua Nove de Abril, Avenida Vinte e Quatro de Julho e a Avenida Cinco de Outubro, por exemplo, mas muitas outras existirão por esta cidade.

Independentemente dos critérios de atribuição dos nomes que vão constar nas placas, um pouco como se disse, ao sabor dos acontecimentos políticos de cada época e/ou da relevância na vida nacional de certas personalidades do mundo das artes ou da ciência, existem dois graves problemas nesta matéria que, aparentemente, não há grande vontade em resolver.

O primeiro tem a ver com a colocação das próprias placas com a indicação do nome das ruas e avenidas que, normalmente, só se encontram no início e no fim de cada artéria e, apenas, de um dos lados, e isto, quando essas ruas são identificadas, o que nem sempre acontece.

Ora, se uma rua ou avenida tem uma grande extensão e é atravessada perpendicularmente, e por diversas vezes, por outras ruas, acontece que só sabemos o nome dessa rua ou avenida quando entramos nela ou quando já vamos de saída. Muito raramente e só nas ruas com muitos quilómetros, como é o caso da Av. Almirante Reis, o nome da rua principal é indicada mais do que uma vez em toda a sua extensão. Por isso, o normal quando saímos de uma rua secundária é não sabermos em que rua nos fomos meter. Bem podemos olhar para as esquinas dos prédios que não vemos qualquer indicação, o melhor é mesmo perguntar.

O segundo problema tem a ver com a informação, neste caso com a falta dela, sobre quem foi aquele nome ali plantado na placa ou que data é que se pretende comemorar. Uma explicação simples que fosse, ajudar-nos-ia a perceber melhor a nossa História e não seria por colocar mais umas quantas letras em cada placa que os cofres camarários iriam à falência.

Alguns exemplos talvez ajudem a perceber o que quero dizer:

- Rua Tomás Ribeiro
Olhamos para a placa, que ainda por cima está suja que se farta, como, de resto, a esmagadora maioria das restantes, e o que é que aquele nome nos diz? Nada, provavelmente. Mas se a seguir ao nome pusessem
1831 – 1901 - Advogado, Político, Poeta e Dramaturgo Português;

- Rua Andrade Corvo
Quem teria sido e em que época viveu?
Mas se a seguir viesse a indicação
1824 – 1890 - Escritor e Político Português

- Av. Duque de Loulé
Bem, era um Duque, logo da monarquia. Mas como qual seria o seu nome? Bastava que a placa indicasse
1804 – 1875
Nuno José Severo de Mendonça Rolim de Moura Barreto
9.º conde de Vale de Reis, 2.º marquês e 1.º duque de Loulé
General, Deputado e Conselheiro de Estado

- Avenida Fontes Pereira de Melo
Todos sabemos que é a avenida que vai do Marquês de Pombal ao Saldanha. O que não sabemos é quem foi o homem que dá nome à Av. Uma pequena indicação e ficaríamos esclarecidos.
1819 – 1887 - Estadista e Engenheiro Militar

E, tantas e tantas outras ruas e avenidas que careceriam de uma pequena informação que nos ajudasse a perceber quem estávamos a homenagear. Para já não falar naquelas outras ruas, becos, azinhagas e outros, cuja explicação se perderá na bruma dos tempos e que terão a ver com factos passados e que, provavelmente, nunca se saberão os porquês como, por exemplo, o “Largo do Cabeço de Bola”, ali para o lado dos Anjos.

Admito que este tipo de toponímica custaria uns quantos euros e levaria um certo tempo a compor a nova imagem, mas o resultado final seria, tenho a certeza, muito positivo. Datas e personagens ficariam identificados e, para quem tivesse interesse e curiosidade em saber um pouco mais sobre quem somos, isso poderia constituir um motivo de pesquisa e, consequentemente, de cultura.

Senhores presidentes das autarquias deste país, vamos a isto!

Um novo Blogue

Embora eu não costume fazer publicidade à concorrência, não posso deixar de aconselhar a leitura, em princípio às quartas-feiras, de um novo blogue “Filhos de uma ursa menor”, a que pode aceder pelo endereço http://www.vejocaras.blogspot.com/. Vai, certamente, ser um espaço diferente e engraçado.

segunda-feira, novembro 06, 2006

Supermercados


Nos supermercados há duas coisas que sempre me intrigaram e, por muito que pense, acho que nunca chegarei a perceber porque é que elas acontecem.

A primeira tem a ver com os empregados das caixas dos ditos supers. Já se aperceberam que aqueles empregados só cumprimentam, só dão os bons dias, tardes ou noites, à primeira pessoa que passa por eles? Ou seja, se um casal está na caixa para pagar, só a primeira das pessoas do casal que passa junto ao empregado da caixa é que é cumprimentado. O que vem a seguir é como se nem existisse, passa pela caixa mas é totalmente ignorado. Porque será?

A outra questão tem a ver com um objecto, normalmente uma placa em acrílico ou em qualquer outro material que diz, mais coisa menos coisa, “o cliente seguinte”. Já alguma vez repararam na ganância de alguns clientes em ir buscar "a coisa" para fazer a separação entre os produtos que pertencem a quem já está a pagar e os que fazem parte da lista do cliente que está imediatamente a seguir? Ganância, é o termo, sofreguidão, se quiserem. Essa gente chega mesmo a empurrar as pessoas que estão à sua frente para alcançar a tal placa, como se de um troféu se tratasse. Ainda não há muito, num dos supers da capital, houve uma pessoa que se agastou comigo só porque eu não coloquei a placa entre os produtos finais do cliente que me antecedia e os meus próprios que, por acaso, nem estavam na passadeira porque eu só tinha ido comprar um pão e tinha-o nas minhas mãos. Só queria que vissem, ou melhor que ouvissem, o tal senhor. “Então o sr. não põe aí a placa?” “Para quê?”, perguntei. Para o caixa saber onde deve parar de fazer a conta do outro cliente. “Mas eu só venho comprar um pão e nem sequer está ali na passadeira, retorqui”. Mas o homem insistiu que mesmo assim eu devia lá pôr a placa, porque era assim que devia ser. E acrescentou “e devia-se chegar mais à frente porque não há necessidade de haver mais que meio metro de distância entre os clientes da fila”.

O “porquê?” ficou-me na garganta e limitei-me a olhar vagamente para o senhor como se nem tivesse reparado bem na sua presença, como se nem sequer o tivesse ouvido. Porque será que a placa do “cliente seguinte” é desesperadamente necessária para algumas pessoas?

domingo, novembro 05, 2006

Pequenos Enganos ...

É muito frequente ouvir-se, sobretudo em certas repartições públicas, aquela estafada frase “só não se engana quem não trabalha”, que é o mesmo que dizer ao parolo que chamou a atenção para uma coisa mal feita “se tu trabalhasses, logo vias, se calhar eras mais compreensivo ...”.

O que me leva a admitir que o rigor nem é assim uma coisa tão importante como isso, já que existe uma desculpa oficial, institucionalizada, para a existência dos erros e, por inerência, de quem os cometeu.

Seguindo esta mesma lógica, se eu mandasse neste país, imporia uma política laboral que só deixasse trabalhar pessoas com profissões mais ou menos braçais, quando muito administrativos ou quejandos, cujos erros que, eventualmente, viessem a cometer não trouxessem grande mal ao mundo. Pelo contrário, nunca deixaria que trabalhassem médicos, controladores aéreos e motoristas de transportes públicos, porque nunca se sabe até onde poderia ir a gravidade dos seus erros.

Relativamente aos GNR era um caso para pensar. Se em relação aos agentes poderia pensar na possibilidade de que alguns desses agentes pudessem vir a disparar uns tiros que viessem a ferir ou a matar alguém, aí certamente que não os deixaria trabalhar. Já com os seus responsáveis, ao nível do comando, provavelmente não veria qualquer inconveniente em que eles trabalhassem porque, qualquer erro, falha, omissão, ou resultado de incompetência, não constituíria um desastre de monta.

Aliás, ainda recentemente, a GNR enganou-se a comprar umas quantas armas e só quando elas chegaram ao país, é que se aperceberam que os lança-granadas não podiam ser montados nas lanchas da Brigada Fiscal, onde era suposto serem instaladas. Mas, desse engano, morreu alguém? Resultaram quaisquer prejuízos pessoais? Não, ninguém se magoou ... a não ser os bolsos dos contribuintes portugueses (nós) que, ao fim e ao cabo, já estamos habituados a que desbaratem o nosso dinheiro.

Pois o que aconteceu é que a GNR gastou em 2004 cerca de meio milhão de euros na compra de 12 lança-granadas para equipar as lanchas rápidas da Brigada Fiscal, mas nunca chegaram a ser montadas porque – calculem – a estrutura das lanchas não permite a sua colocação. Trata-se, como se vê, de um pequeno pormenor, nada que nos preocupe em demasia. Mesmo assim, não posso deixar de perguntar “e ninguém viu isso antes?”, “e ninguém é reponsabilizado?”.

Assim como assim, como o dinheiro já estava gasto e os canhões já estavam em Portugal mas não podiam ser instalados, o que havia a fazer era guardá-los para não se estragarem. Afinal, o erário público tinha desembolsado meio milhão de euros.

Mas o que eu achei verdadeiramente escandaloso neste caso, e que segue a mesma linha de pensamento do “só não se engana quem não trabalha”, foi a declaração pública do porta-voz da GNR que, embora sabendo que as armas estão guardadas há dois anos sem qualquer utilidade, mesmo assim, teve o desplante de dizer o seguinte: “uma aquisição deste género é sempre útil”.
“Para quê?”, pergunto eu.

Ah!, convém dizer que duas dessas armas foram usadas no Iraque mas “agora estão de reserva”. Na mesma situação de reserva, presumo eu, em que está uma ambulância blindada, adquirida também há dois anos por 62 mil contos e que nunca chegou a ser usada.

Que se danem os 62 mil contos. O que é preciso ver é que “uma aquisição deste género é sempre útil”.

E não há que pedir contas a quem cometeu estes pequenos enganos? Ou este crime já prescreveu?