quinta-feira, maio 31, 2007

Um "concurso" desumano


Quando pensamos que à medida que vamos ficando mais velhos, a vida nos ensinou a estar melhor preparados para enfrentar as coisas mais absurdas ou cruéis, verificamos que nem sempre estamos tão preparados como julgávamos.

Foi o que me aconteceu quando soube que na Holanda vai realizar-se um reality show cujo prémio é constituído por, pasmem-se ... uma doação de órgãos. É absolutamente inacreditável!

É verdade, um canal de televisão holandês está prestes a estrear um concurso em que uma doente terminal vai decidir qual de três pessoas merece receber os seus rins.

E o grande prémio, a escolha da vida ou da morte, será feita em directo na televisão, tendo por base as conversas com os familiares, a análise do perfil de cada um dos doentes, bem como as mensagens de SMS enviadas pelos telespectadores.

Nunca um reality show foi tão longe.


Como é possível que uma televisão, para conseguir ganhar a guerra das audiências, pense e realize um programa em que a votação irá decidir quem tem direito a receber os órgãos do doador e, consequentemente, a ficar vivo, e quem fica de fora do concurso e, eventualmente, da vida.

E o espectáculo é tão maquiavélico que nem a votação por SMS foi esquecida, como se de um concurso banal se tratasse.

Será que alguém – responsáveis pelo canal e produtores do concurso - pensou na ansiedade e na angústia que os três concorrentes a este concurso macabro vão sentir, enquanto esperam pela decisão final?

É que nesta ideia de loucos, a vitória no concurso equivale à possibilidade de continuar a viver, mas a derrota significa o fim da esperança e, quem sabe se da vida, de dois seres humanos.

Até onde chegámos! Será que já batemos no fundo?

quarta-feira, maio 30, 2007

A afronta


Já vão longe os tempos em que se gritava por tudo o que era sítio, “salário igual para trabalho igual”.

Os tempos eram, de facto, outros, influenciados em grande medida pelas brumas pós-revolucionárias que ainda se viviam, mas igualmente fruto de uma conjuntura bem diferente da que temos hoje, em que funciona a lógica de mercado, num mundo todos dias mais globalizado.

Ainda assim, e mesmo tendo passado mais de 30 anos, continuo a pensar que os que fazem mais ou menos a mesma coisa, deveriam auferir salários mais ou menos idênticos, ressalvando, naturalmente, as especificidades e capacidades próprias de cada trabalhador. Como compreendemos, nem todos são igualmente bons e há sempre trabalhadores que se destinguem mais, quer pela competência quer pela dedicação.

Como é evidente, nem todos somos iguais, uns nascem altos, outros baixos; uns fortes, outros fracos; uns mais inteligentes, outros menos ... é assim!

Por isso, tenho alguma dificuldade em perceber como é que os administradores executivos do BCP, que ganharam cada um, em média, 2.995 milhões de euros em 2006, têm vencimentos cinco vezes superiores aos seus congéneres dos restantes bancos cotados.

Será porque os administradores do BCP são incomensuravelmente melhores que os seus colegas dos outros bancos? Não sei se isso será verdade, custa-me a crer. O que sei é que os 4 maiores bancos privados (BCP, BES, Santander Totta e BPI) cresceram no primeiro trimestre deste ano 24% e foi o BES, e não o BCP, que liderou esse crescimento com um aumento de 33%. O que deita por terra a teoria de que os altos executivos do BCP são os maiores, e por serem os maiores merecem as enormes fortunas que ganham.

Mas, como aqui já tenho manifestado por diversas vezes, neste país pobre em que vivemos, em que a maioria dos trabalhadores ganham muito mal e são cada vez mais explorados, parece-me que as chorudas remunerações dos administradores do BCP são um atentado imoral, indecoroso e obsceno à dignidade dos trabalhadores em geral, e constituem um avolumar significativo do fosso salarial entre uns quantos que ganham muitíssimo e a maioria que não ganha o suficiente para viver.

E para que percebamos melhor o que estou a dizer, basta olhar para a imensa discrepância entre os salários dos administradores do BCP e os restantes colaboradores do Grupo. Em 2006, como se disse, cada executivo do BCP recebeu, em média, 2.995 milhões de euros. Para conseguir amealhar uma verba de tamanha dimensão, os colaboradores do Grupo necessitariam de trabalhar, também em média, durante uns míseros 164 anos.

Para que não restem quaisquer dúvidas, aos administradores do BCP bastou-lhes um ano de trabalho para ganhar o mesmo que os outros trabalhadores da casa ganhariam em 164 anos.

Repito, isto é imoral e constitui um gravíssimo atentado à dignidade dos outros trabalhadores que dão, seguramente, o seu esforço, a sua dedicação e a sua inteira disponibilidade para o engrandecimento da instituição em que trabalham e que lhes retribui da forma como vimos.

E pensar que a esperança de vida em Portugal, anda à volta dos setenta e tal anos!

terça-feira, maio 29, 2007

O deserto da margem sul



Embora não estivesse em Lisboa na semana passada, fui acompanhando, na medida do possível, o que se ia acontecendo no país.

E foi com um enorme espanto que, num dos telejornais, ouvi o ministro das Obras Públicas, Mário Lino, numa intervenção num almoço-debate com economistas, em Lisboa, dizer que

“... Fazer um aeroporto na margem sul seria um projecto megalómano e faraónico porque, além das questões ambientais, não há gente, não há hospitais, não há escolas, não há hotéis, não há comércio, um deserto para onde seria necessário deslocar milhões de pessoas ... ".

Ora, o governo fará o aeroporto onde entender e onde os estudos que estão feitos há muito assim o recomendarem (estudos que foram aprovados pelos vários governos ao longo de décadas), seja o local escolhido a Ota, o Poceirão, Rio Frio, Faias ou Alguidares de Baixo.

Pelo contrário, o que o governo não pode, nem tão-pouco os seus ministros, é dizerem barbaridades destas que, obviamente ninguém entende nem aceita.

Então, o senhor ministro acha que não há gente, não há hospitais, nem escolas nem hotéis em todo o território para além do Tejo, nomeadamente no Barreiro, Setúbal, Montijo, Alhos Vedros e Moita? Ou, pelo contrário, será que a Ota terá todas essas estruturas em quantidades industriais e os tais milhões de pessoas que referiu?

Não admira, por isso, convenhamos, que os autarcas da Margem Sul tenham reagido tão prontamente e com tanta indignação contra o senhor ministro!
Mas Mário Lino não se quedou por aí e não resistiu também a comparar a opção sul do Tejo a um doente aparentemente de boa saúde, mas "com um cancro nos pulmões, o que é fatal".

Meu caro ministro, como não tinha ficado satisfeito com a bojarda anterior, vá de meter-se com as pessoas que, infelizmente, têm cancro e que, certamente, não gostaram nada da piada. O senhor fez-me lembrar aquele seu ex-colega ministro do ambiente do PSD - Carlos Borrego - que pretendeu fazer humor com os alentejanos à conta do alumínio elevado na água, a qual vitimou vários doentes que faziam hemodiálise, no hospital de Évora. E, por isso, foi demitido de imediato.

Veja lá, senhor ministro, há piadas que saem caro ...

Já no outro dia pôs uma plateia a rir à gargalhada ao dizer que era engenheiro e que estava inscrito na ordem. O seu chefe é que não deve ter gostado lá muito dessa graça e nem sequer deve ter mostrado qualquer esgar que se parecesse com um sorriso, por pequeno e amarelo que fosse.

Nós sabemos que o senhor é voluntarioso e que gosta de dizer umas chalaças, mas parece-nos, também, que, muitas das vezes, as palavras saem-lhe da boca a uma velocidade muito maior do que são pensadas.

E depois delas ditas, é difícil fazer acreditar a rapaziada que a sua declaração foi retirada do contexto pela comunicação social. Qual contexto, não me dirá? Se eu próprio ouvi, palavra por palavra, tudo aquilo que disse?

A não ser que quisesse utilizar uma metáfora. Mas isto das metáforas tem dois problemas associados. O primeiro é que nem toda a gente as entende. O segundo é que é necessário explicar convenientemente o que essa metáfora pretende significar.

Só que o senhor ministro disse claramente que não há condições para se fazer um aeroporto na margem sul porque é um deserto. O senhor disse isso e isso não me parece uma metáfora. Pelo contrário, tenho a certeza de que foi uma afirmação e os autarcas desse deserto têm todos os motivos para estarem zangados consigo.

Se aceita uma sugestão, tenha alguma moderação nas palavras e não se deixe entusiasmar por elas.

No fundo o que me admira é que o primeiro-ministro não chame a si a tarefa da comunicação do governo, enquanto um todo. Deste modo, evitaria que ministros como o senhor e o seu colega Manuel Pinho não se metessem em tantas confusões e contradições, que dão a ideia duma certa desorganização do governo a que pertencem.

E se o Engenheiro Sócrates, estiver preocupado com outras preocupações e não puder coordenar a comunicação externa do governo, peçam ajuda ao Pinto da Costa que já deu sobejas provas de que apenas ele, e só ele, fala pelo Futebol Club do Porto.




quinta-feira, maio 17, 2007

Um pequeno intervalo

De vez em quando é necessário intervalar. Para descansar, para arejar a cabeça e, neste caso específico, para dar algum repouso aos amigos que me acompanham nesta aventura quase diária.
Será por pouco tempo.
Espero voltar na próxima terça-feira, dia 29 deste mês.
Até lá!

Ovos


Nem toda a gente tem a sorte de ter a habilidade ou o gosto de cozinhar. Para muitos o simples facto de passar perto do fogão é um declarado acto de tortura.

Assim, e para dar resposta a milhares e milhares de sofredores, o mercado preparou-se devidamente e pôs à venda comida já cozinhada, enlatada ou não, yogurtes, gelados, amendoins, bolachas e similares que, para além de evitar as desnecessárias perdas de tempo que o acto de cozinhar comporta, impede o avolumar de frustrações que o não saber cozinhar quase sempre provoca.

Para além disso, existem umas máquinas que resolvem muitos dos problemas das tais pessoas que não sabem ou não gostam de cozinhar, os chamados “microondas”, talvez uma das maiores descobertas dos finais do século passado.

No entanto, há sempre quem insista e queira aprender a fazer umas “especialidades”, quanto mais não seja para impressionar os amigos. Simples, para começar e, a pouco e pouco, cada vez mais elaborados, com a ajuda das mães, das colegas e da aquisição de revistas de culinária.

Normalmente principia-se pelo básico. Pela abertura de umas latas de atum para acompanhar uma saladita de tomate, ainda que, por estarem no princípio, ainda não saibam condimentar devidamente a salada com uma série indeterminável de especiarias que são vendidas por todo o lado. Para lá, é claro, de terem alguma dificuldade em abrir as próprias latas.

Depois, aventuram-se um pouco mais e começam a fazer um arrozito que serve de acompanhamento aos ovos mexidos.

Os ovos estrelados e escalfados são o passo seguinte. Muitas vezes, no entanto, são o último passo, porque a partir daqui, muitos milhares desses aspirantes a cozinheiros decidem inverter o caminho e voltar aos yogurtes, aos gelados e às bolachas.

Mas é exactamente para essas pessoas que chegaram ao degrau dos ovos estrelados e escalfados, e nomeadamente para estes últimos, que eu quero hoje trazer uma palavra de esperança.

É que, uma empresa britânica promete tornar mais fácil a tarefa de escalfar ovos, estando para isso a desenvolver uma tecnologia que indica quando os ovos estão no ponto certo de cozimento.

O chamado “ovo auto-cronometrado” tem um selo especial impresso na sua casca, que é invisível quando o ovo está cru mas que aparece em cor preta quando ele já está cozido.

Com esta inovação, os consumidores começarão a ter três opções de ovos: mole, médio e duro, que equivalem, respectivamente, a cozimentos de três, quatro e sete minutos.

Como vêem, esta nova tecnologia que está já em fase de teste, promete facilitar a vida de muitos. E, quem sabe se, uma vez ultrapassada esta “barreira”, alguns se entusiasmem a ir um pouco mais longe e, com o tempo, chegarem a ser mestres na difícil arte de cozinhar.

Tanto mais que, finalmente - e isto para as pessoas que se preocupam com os problemas metafísicos - foi dada a resposta à eterna dúvida de saber quem nasceu primeiro, se o ovo se a galinha. Agora já se pode afirmar com toda a segurança, que Deus criou primeiro o ovo, mas com instruções detalhadas e todas as coordenadas para, depois, se tornar galinha.

quarta-feira, maio 16, 2007

O Suspiro


Quando relia aquela história que aqui publiquei há uns tempos sobre o garoto que almoçou com um senhor a quem pedira auxílio e que acabou por concluir que também esse senhor tinha uma vida virtual, lembrei-me de uma outra história que eu presenciei há um bom par de anos.

Entre as duas somos capazes de achar que há alguma coisa em comum.


Era um dia frio e enevoado e a humidade, muita, fazia-se sentir de tal forma que apetecia aconchegar os agasalhos.

Dentro da pastelaria, a temperatura era naturalmente superior à que se fazia sentir lá fora, e fazia-nos esquecer, por momentos, esse dia de inverno, ainda mais depois de nos aquecermos com uma bebida bem quente.

De repente, junto ao Balcão, surgiu do nada uma figura que destoava claramente dos demais. Era uma pessoa pouco mais que andrajosa, nada agasalhada e um ar de infeliz bem patenteado no rosto, fruto do estado do dia mas, sobretudo, do estado da alma.

Percebi depois que era um internado num estabelecimento psiquiátrico que ficava ali próximo mas que, com frequência, e com outros colegas seus, deambulava pelas ruas ali perto, pedindo cigarros a uns e dinheiro a outros.

Ali estava ele, junto ao Balcão, fixando-o insistentemente.

Uma senhora que estava a tomar o pequeno-almoço, constrangida com a cena, perguntou se ele queria comer alguma coisa.

“Um suspiro”, exclamou o homem. E o olhar desesperado transformou-se em esperança, perante a possibilidade de que aquele enorme suspiro branco, que também olhava para ele, lhe pudesse ser oferecido por aquela senhora.

“Um suspiro”, repetiu. E olhou para a senhora.

A senhora terá estremecido. Então, com um dia tão frio e o homem tão mal agasalhado, ele queria comer um suspiro? E de imediato perguntou:

“Não quer antes um croissant e um galão? Ia ficar mais quentinho e ia sentir-se melhor. Então, o que é que acha, olhe que ficava muito melhor!”

O homem desviou os olhos da vitrina e daquele suspiro monumental que lhe estava tão próximo, e cada vez mais longe, olhou desencantado para a senhora e exclamou: “Está bem” e esperou que lhe fossem servidos o croissant e o galão quentinho que, suspeito eu, os tomou sempre virado para a vitrina do balcão e para aquele enorme, branco e apetitoso suspiro dos seus sonhos!

segunda-feira, maio 14, 2007

Mais ou Menos


É demasiado frequente recebermos como resposta ao nosso
“Bom dia, como estás?” um desanimado
“Mais ou menos”.

Não menos frequente, é quando perguntamos
“Então, as férias foram boas, correu tudo bem?”, ouvirmos um inexpressivo
“Ah!, mais ou menos”.

Um povo que é “mais ou menos” não chega a ser um povo. Não é nem mais nem menos, é apenas uma espécie de “assim-assim” que, por ser isso e não mais do que isso, não tem expressão, não tem alma e não tem sentimento.


Mas não tem que ser assim! Por isso, e para que de algum modo sejamos levados a alterar a postura deste modo de estar na vida, vos trago um poema de Chico Xavier denominado, precisamente




Mais ou Menos



Podemos morar numa casa mais ou menos,
Numa rua mais ou menos,
Numa cidade mais ou menos,
E até ter um governo mais ou menos.


Podemos dormir numa cama mais ou menos,
Comer um feijão mais ou menos,
Ter um transporte mais ou menos,
E até ser obrigado a acreditar mais ou menos no futuro.


Podemos olhar em volta,
E sentir que tudo está mais ou menos,
Tudo Bem!


O que não podemos mesmo,
Nunca, de jeito nenhum ...

É amar mais ou menos,
Sonhar mais ou menos,
Ser amigo mais ou menos,
Namorar mais ou menos,
Ter fé mais ou menos,
E acreditar mais ou menos.


Se não, corremos o risco
De nos tornarmos
Uma pessoa mais ou menos!




Pouco conhecido em Portugal, Chico Xavier (de seu nome Francisco Cândido Xavier, (2 de Abril de 1910 a 30 de Junho de 2002) foi um médium brasileiro e célebre divulgador do Espiritismo no Brasil.

domingo, maio 13, 2007

É intolerável!


O desaparecimento da criança inglesa na Praia da Luz, no Algarve, qualquer que fosse o móbil do crime, é um episódio muito infeliz e que a todos nos deve deixar preocupados.

Não sabemos se as autoridades que estão a investigar o crime, nomeadamente a Polícia Judiciária, fez ou está a fazer tudo o que podia e o que devia. Não sabemos, mas acreditamos que sim. Mas o que ninguém pode negar é que neste caso foram postos de imediato e em quantidade, recursos que normalmente nunca estão disponíveis em casos semelhantes ocorridos com cidadãos nacionais.

Daí que me revolte com o que a imprensa inglesa, e não só os chamados tabloides, andam a propagar na opinião pública do seu país e, quiçá, noutros países, sobre a falta de competência da nossa polícia criminal e sobre a qualidade de um povo menor, atrasado e incapaz – nós – um exótico bastião da selvajaria mediterrânica, para onde, de resto, eles não se limitam a vir passar férias, mas já aqui estabeleceram as suas comunidades fechadas, guetos onde são acolhidos apenas os da sua nacionalidade, onde vendem e comem os seus produtos e onde a única língua escrita e falada que se usa é a inglesa. Comunidades, colónias diria, que vivem à margem do país que os acolhe e onde pretendem (muitas vezes de forma directa e descarada) inverter as posições de soberania internacionalmente aceites. Vivem em Portugal que é um país independente, que tem as suas leis e as suas instituições próprias e a que eles têm que se sujeitar.

E essas insinuações da comunicação social inglesa, por injustas e deselegantes, demonstram claramente aquele reflexo imperial de outros tempos, em que os ingleses sempre olharam para os portugueses, e para os outros povos, convenhamos, com uma sobranceria e arrogância insuportáveis.

A propósito do desaparecimento da criança, os ingleses começaram por mandar os seus polícias, supostamente para colaborar com a PJ mas na verdade com a vontade de orientar os provincianos dos nossos polícias, mandaram batalhões de jornalistas que na falta de notícias, vão-se entretendo a inventar e a maldizer os nativos. E nós, vamos, também, ajudando à festa, entrevistando todos os supostos especialistas que nos aparecem pela frente, numa atitude de assumida saloiice.

Só gostaria de saber se uma criança portuguesa fosse raptada em terras de Sua Majestade, se os jornalistas de lá perderiam um minuto que fosse a entrevistar qualquer enviado especial de um órgão de comunicação nacional.

Mas os ingleses deveriam ser um pouco mais inteligentes, sobretudo antes de começarem a achincalhar-nos por não termos conseguido, ainda, resolver este caso. É que eles não podem esquecer-se que, segundo a ONU, a Grã-Bretanha continua a ter uma das mais altas taxas de criminalidade dos países desenvolvidos, sendo particularmente expressiva – e particularmente ineficaz na sua resolução – no rapto dos seus menores.

sexta-feira, maio 11, 2007

É uma estrada, apenas uma estrada ...

Se, por vezes, penso que já nada me consegue surpreender, nem sequer os insultos e as grosserias vindos de Alberto João Jardim, confesso que, apesar de tudo, ainda vou ficando boquiaberto com notícias que nos chegam do Reino da Madeira.

Todos assistimos nas televisões Alberto João inaugurar uma estradita de uns escassos dois quilómetros, que se destina a servir uma população de menos de uma centena de pessoas, mas que foi construída, apenas e só, porque naquele lugar mora uma senhora que, em tempos, o ajudou a tomar conta dos filhos.

"a Maria cuidou dos meus filhos, não conseguiria dizer-lhe que não faria a estrada", declarou Jardim com o maior dos descaramentos e imensamente comovido, digo eu, com a nossa generosidade, com a generosidade dos contribuintes portugueses.

E acredito que ficámos todos muito satisfeitos por ter contribuído com o nosso dinheiro para que fossem pagos os favores do senhor Alberto à senhora Maria. É bom saber-se que neste país, ainda há pessoas que pagam as suas dívidas.

Não foi, como se percebe, o interesse da região, tão pouco o interesse de servir os cidadãos anónimos (quaisquer que eles fossem) que levou à construção da tal estrada. O interesse foi, única e exclusivamente, o de pagar uma promessa feita em tempos à tal senhora com quem Jardim tem um dever de gratidão.

Mas como se isto não fosse o suficiente, o que me deixou completamente “abazurdido”, incrédulo, desnorteado e completamente sem palavras, foi o facto da tal pequena estrada de cerca de dois quilómetros e que vai servir menos de uma centena de pessoas, ter custado à volta de dois milhões de contos por cada quilómetro, mais do que custou o Túnel do Marquês, com a mesma extensão, mas feito debaixo da terra e com um trabalho de engenharia infinitamente mais complexo.

Como contribuinte não posso deixar de ficar indignado.

Alberto João sabe bem que esta e muitas outras obras com que modernizou a Madeira, têm sido suportadas, fundamentalmente, pelas transferências feitas pela Governo da República, aquele mesmo Governo da República que está instalada no rectângulo com que ele tanto goza. E essas verbas absolutamente extraordinárias que obteve, aos gritos com Lisboa e a zurzir todo o mundo com uma falta de respeito e de educação imperdoáveis, vão acabar quer ele queira ou não.

Alberto João bem pode espernear à vontade. A teta que o alimentou durante três décadas, secou de vez. Chegou a hora de vermos como é que ele vai governar e como é que vai continuar a modernizar a Madeira, sem os milhões a que estava habituado.

quinta-feira, maio 10, 2007

Onde se fala, uma vez mais, do ensino que temos ...


Já por diversas vezes tenho aqui manifestado a minha opinião sobre a qualidade do ensino em Portugal, tendo mesmo afirmado que, na minha perspectiva, não estamos a formar da melhor forma os nossos jovens. Apesar de termos cada vez mais licenciados, o que é bom, esses números servem, muitas vezes, apenas para alimentar as estatísticas e as inevitáveis comparações com os demais países, mas, francamente, pouco mais valem.

Como disse em tempos, o que provocou, na altura, um exacerbado coro de protestos

“... no actual sistema educativo, ser licenciado não representa um atestado de competência, mas uma mera credencial em como um indivíduo frequentou o ensino durante uns quantos anos e cumpriu certas formalidades legais ... regista-se uma grande discrepância entre as competências transmitidas pelas escolas e universidades e aquilo que é exigido pelas empresas. Isto porque o sistema não consegue ajustar os programas escolares às exigências do mercado de trabalho e da sociedade...”


Afinal, uns meses depois, é a própria Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, que vem admitir que alguns programas e manuais escolares poderão ser demasiado extensos e não ter qualidade.

E para ser totalmente clara, Maria de Lurdes Rodrigues afirmou:

"Pode acontecer que nem sempre a qualidade dos programas e dos instrumentos de ensino esteja assegurada e pode acontecer também que alguns programas não tenham a dimensão adequada e que seja necessário pôr em prática mecanismos de controlo da qualidade dos currículos e dos livros escolares”.
Mas não foi só a Ministra que criticou o actual sistema de ensino, também o Reitor da Universidade Aberta, Carlos Reis, teceu duras críticas à qualidade dos programas e dos manuais, considerando que muitos "servem para infantilizar os jovens". A preocupação, disse, "origina-se na situação que estamos a viver. O desempenho dos nossos alunos, a todos os níveis, está longe de ser satisfatório”.



Na verdade, se queremos ter mais e melhores técnicos alguma coisa tem que ser alterada. Os programas dos cursos, os conteúdos dos manuais, a exigência do cumprimento dos objectivos por parte de alunos e professores e a definição do perfil dos próprios professores, parecem-me aspectos fundamentais para que se consigamos chegar a um patamar de competência que todos desejamos.

Vamos ver se, face às declarações da Ministra e do Reitor da Universidade Aberta, não vão chover, desta vez, os protestos indignados de quem acha que tudo isto, afinal, não é tão mau como se quer pintar ...

quarta-feira, maio 09, 2007

Outra forma de dizer a coisa ...


Consta que havia um cego sentado numa calçada em Paris, com um boné a seus pés e um pedaço de madeira escrito com giz branco, que dizia:

"Por favor, ajudem-me, sou cego".

Um jovem publicitário, que passava junto a ele, parou e viu que o boné apenas recebera umas poucas moedas. Sem pedir licença ao cego, pegou no cartaz, virou-o e escreveu um outro texto no pedaço de madeira.

Voltou a colocá-lo aos pés do cego e foi-se embora.

Pela tarde, o publicitário voltou a passar em frente ao cego que pedia esmola. Agora, o seu boné estava cheio de notas e moedas.

O cego reconheceu as pisadas e perguntou-lhe se havia sido ele quem tinha reescrito o seu cartaz e, sobretudo, o que ele lá tinha escrito.

O jovem respondeu: "Nada que não estivesse de acordo com o que lá estava escrito, mas com outras palavras.
Sorriu e continuou seu caminho.

O cego nunca chegou a saber, mas seu novo cartaz dizia:

"Hoje é Primavera em Paris, e eu não posso vê-la".

segunda-feira, maio 07, 2007

Do zíper ao fecho éclair

É sabido que as invenções surgem quando menos se espera e que resultam, quantas vezes, da observação das situações mais inesperadas e mais banais do dia-a-dia.

Foi o que aconteceu, vejam bem, quando um senhor, de seu nome Whitcomb Judson, um inventor norte-americano de Chicago, cansado de amarrar os cordões dos sapatos e cansado, também, de ouvir as queixas diárias de sua mulher sobre a fastidiosa tarefa de amarrar os cordões dos espartilhos que usava, pôs-se a magicar como poderia resolver tão momentosos problemas.

E tanto pensou que um belo dia do longínquo ano de 1891, teve a brilhante ideia de criar um sistema de fecho que era feito de ganchos e fendas que se agarravam para abrir e fechar. Era, ainda um esboço do que conheceríamos mais tarde como um zíper (ou um fecho éclair).

O primeiro protótipo do fecho zíper foi exibido em 1893, em Chicago, mas foram necessários mais 20 anos (1913) e que aparecesse um sueco chamado Gideon Sundback para que desenvolvesse as ideias de Judson e produzisse um fecho semelhante - sem os ganchos pontiagudos mas com "dentes" de metal – para que se chegasse ao modelo prático que conhecemos hoje, fecho esse que, no início, era usado em bolsas para guardar tabaco ou dinheiro.


E o sucesso foi tão grande que em 1917 a marinha americana começou a fabricar casacos que usavam o ziper na frente e no início década de 30 “a moda” aderiu de alma e coração à nova moda.

Em Portugal, numa época em que a língua francesa tinha grande influência, o ziper deu lugar ao nosso conhecido “fecho éclair”(fermeture éclair, sendo que o “éclair” resultava do nome da sociedade detentora do registo da marca).

E por cá como em todo o mundo o uso do fecho éclair generalizou-se, democratizou-se e é hoje utilizado não só na roupa como nas mais diversas áreas.

Mas essa habituação não foi assim tão fácil, pelo contrário, ela deu-se lentamente ao longo dos anos. Basta verificarmos, por exemplo, que em 1959, nas principais cidades do Brasil, apenas 20% dos homens usavam fecho éclair em vez dos usuais botões de braguilha.

Aliás é curioso que em contraponto aos tais 20% que usavam o fecho éclair, porque achavam o sistema mais prático, os opositores argumentavam que o fecho não era um artigo próprio para homens ... e, 29% dos que nem queriam ouvir falar nele, diziam que não ficava bem, 18% que era feio e indecente e 3% que o achava ridículo.

Desde então, o hábito e a moda tornaram obrigatório o uso do fecho éclair e as mentalidades evoluíram, e de que maneira!

E pronto, é altura de fechar o tema, com ... fecho èclair, já se vê!








sexta-feira, maio 04, 2007

Contamos convosco


A PRÓXIMA CAMPANHA DE RECOLHA DE ALIMENTOS
em supermercados e superfícies comerciais realiza-se
nos dias 5 e 6 de Maio de 2007
(Nos próximos sábado e domingo).

OBRIGADA A TODOS QUANTOS APOIAM A LUTA

BANCO ALIMENTAR:
ALIMENTE ESTA IDEIA !

quinta-feira, maio 03, 2007

Ser feliz ou ter razão?


Vale a pena “perdermos” um bocadinho para pensarmos na pequena história que hoje vos trago, e que mostra bem quanta energia nós gastamos constantemente, apenas para demonstrar que temos razão em determinada discussão ou conversa, independentemente de tê-la ou não.

“São oito da noite numa avenida movimentada. Um casal já está atrasado para jantar em casa de uns amigos. Não conhecem bem onde fica essa casa nem os caminhos que os levarão até lá.
Ele conduz o carro e ela orienta, pedindo-lhe que vire à esquerda na próxima rua. Só que ele tem a certeza de que é à direita.

Discutem.

Percebendo que, além de atrasados, ficariam também mal-humorados, ela deixa que ele decida. Então, ele vira à direita e imediatamente se apercebe que não era aquele o caminho e que, portanto, ele estava errado.

Embora com dificuldade, admite que insistiu no caminho errado, enquanto faz o retorno. Ela sorri e diz que não há nenhum problema se chegarem alguns minutos atrasados.

Mas ele ainda quer saber: “Se tinhas tanta certeza de que eu estava a ir pelo caminho errado, porque é que não insististe um pouco mais?...”

Ao que ela respondeu: “Entre ter razão e ser feliz, prefiro ser feliz. É que estávamos à beira de uma discussão, e se eu insistisse um pouco mais, teríamos estragado a nossa noite”!

Perante esta história, que pode muito bem ter acontecido com qualquer de nós, a verdadeira questão pode colocar-se de uma forma extremamente simples

"Afinal, o que é que nós queremos da vida, insistir na razão que julgamos ter ou sermos apenas felizes?"
Tão simples como isso!

quarta-feira, maio 02, 2007

A denúncia, de novo?

Quando dei pela coisa pensei que já tinha visto este filme em tempos idos, provavelmente com outros actores e realizadores, de certeza sem os efeitos especiais que agora existem, mas com o mesmo argumento ou com um muito parecido.

A verdade é que, em tempos, tivemos quem, a troco de um prato de lentilhas ou de uns certos favores por vezes inconfessáveis, denunciasse qualquer cidadão que tivesse dado um suspiro que fosse, e o mesmo tivesse sido interpretado como o prenúncio ou a senha de um golpe de estado contra o poder instituído.

Tempos já passados, esperava eu.

Trinta e poucos anos depois, aparece um governo que foi livremente eleito pelo povo, que vem agora exortar toda a gente e, em particular, os funcionários públicos a denunciar casos de corrupção.

Se bem que perceba a preocupação do governo e da sociedade em geral, em continuar, de forma permanente, a luta contra a corrupção e também esteja ciente da dificuldade tremenda em a combater e a vencer, o certo é que me atormenta aquela dúvida existencial de saber se os fins justificam os meios. Ou seja, que por falta de meios de controlo do próprio Estado, tenhamos mesmo de voltar ao tempo da denúncia para conseguir acabar com tal desgraça.

Mas o governo, achou que deveria esclarecer melhor os cidadãos sobre aquilo que lhes pedia e, através do Ministério da Justiça, publicou um guia de recomendações para prevenir a corrupção no seio da Administração Pública. O documento refere vários casos de actos ilícitos, por exemplo, a não tirar partido da sua posição para servir os seus interesses pessoais, ou, a não aceitar quaisquer vantagens (prendas, p.e., sejam elas de que natureza forem) para si ou para terceiros, como contrapartida do exercício das suas funções.

E porque o combate contra a corrupção é, de facto, difícil,
o Ministério da Justiça apela à denúncia perante as autoridades competentes, salientando tratar-se de um “dever legal".

Bom, já aqui enunciada a minha dúvida quanto aos princípios, umas quantas dúvidas mais não deixam de me atormentar. E vejam se seguem a minha linha de pensamento. É que várias situações podem acontecer:

- e se um funcionário honesto denuncia um funcionário corrupto a uma autoridade corrupta;
- ou se um funcionário honesto denuncia um funcionário honesto a uma autoridade corrupta;
- ou se um funcionário corrupto denuncia um funcionário honesto a uma autoridade honesta;
- ou se um funcionário corrupto denuncia um funcionário corrupto a uma autoridade corrupta;
- ou se, finalmente, um funcionário corrupto denuncia um funcionário honesto a uma autoridade corrupta.

Estas, para já, as principais questões. Mas, porque pode acontecer, também, que um funcionário corrupto denuncie um funcionário corrupto a uma autoridade honesta, é lícito que questionemos o que irá acontecer neste caso?

E o que irá acontecer se um funcionário honesto denunciar um funcionário honesto a uma autoridade honesta?

Ao fim e ao cabo, fico bem mais tranquilo, e sem dúvidas (a não ser a tal), se um funcionário honesto denunciar um funcionário corrupto a uma autoridade honesta.






terça-feira, maio 01, 2007

Amador sem coisa amada

De António Gedeão

"Amador sem coisa amada"

Resolvi andar na rua,
com os olhos postos no chão,
quem me quiser que me chame,
ou que me toque com a mão.
Quando a angústia embaciar,
de tédio os olhos vidrados,
olharei para os prédios altos,
para as telhas dos telhados.
Amador sem coisa amada,
aprendiz colegial,
sou amador da existência,
não chego a profissional.

Rómulo Vasco da Gama de Carvalho

(Lisboa, 24.11.1906 - Lisboa, 19.02.1997)

Foi professor, pedagogo, investigador de História da Ciência em Portugal, divulgador da ciência e poeta sob o

pseudónimo de António Gedeão.

"Pedra Filosofal" e "Lágrima de Preta" são dois dos seus mais célebres poemas.