quinta-feira, junho 28, 2007

"Pão, Bolos,Torga e Poesia"


Duas pastelarias/padarias da região de Bragança aceitaram associar-se às comemorações do centenário do nascimento de Miguel Torga, considerado o maior escritor transmontano. Assim, quem comprar pão ou bolos durante todo o Verão naqueles dois estabelecimentos do Nordeste Transmontano, vai levar para casa também alimento para o espírito, isto é, vai levar poesia de Torga nas embalagens.

Desta maneira, caixas e sacos de plástico ou de papel passam a ser veículos literários da obra do escritor.

Quem sabe se numa dessas embalagens alguém virá a ter como presente este magnífico poema de Torga, que se chama precisamente



“UM POEMA”


Não tenhas medo, ouve:
É um poema
Um misto de oração e de feitiço...
Sem qualquer compromisso,
Ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Poderás decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar
Ao levantar,
Ou nas restantes horas de tristeza.
Na segura certeza
De que mal não te faz.
E pode acontecer que te dê paz...



Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Correia Rocha, nasceu em São Martinho de Anta em 12 de Agosto de 1907 e faleceu em Coimbra a 17 de Janeiro de 1995. Para além de médico, foi um dos mais importantes escritores portugueses do século XX.


Considerado por muitos como tendo um trato difícil e carácter duro, sempre fugiu das elites pedantes e a sua postura perante a vida fê-lo estar sempre mais perto dos mais desfavorecidos, dando consultas médicas gratuitas a gente pobre.
É lembrado por quem o conheceu como um homem de bom coração e de boa conversa. Foi o primeiro vencedor do Prémio Camões.

quarta-feira, junho 27, 2007

"Sai mais uma imperial!"


No anúncio que passa frequentemente na televisão, a nossa querida campeã Rosa Mota afirma que, pelo facto de tomar diariamente um iogurte de uma marca muito conhecida, o colesterol que andava um pouco alto, baixou significativamente..

Mas, o colesterol não se dá mal só com o tal iogurte. Ao que parece, e a ser verdade a conclusão de um estudo noticiado pelos telejornais, a cerveja também faz baixar o colesterol.

Esse estudo, juntou três freiras, de conventos diferentes, que aceitaram beber apenas de cerveja. O resultado foi que numa das irmãs, o seu colesterol baixou de 300 para 110. Apenas com a cerveja e nada mais!

É um resultado animador, sem dúvida, sobretudo para quem gosta de cerveja.

Mas enquanto esperamos que comecem a aparecer anúncios em que freiras venham sugerir as cervejitas anti-colesterol, é bom recordar que para além de fazerem diminuir o colesterol, a cerveja ajuda a fixar o cálcio e, especialmente nas mulheres, o consumo regular de cerveja, pode prevenir doenças como a osteoporose e o cancro da mama.

Mas já que falamos em estudos, um outro efectuado desta vez na Faculdade de Ciências da Alimentação e Nutrição da Universidade do Porto, refere que a cerveja pode prevenir várias doenças (cancro, cardiovasculares), devido ao alto teor de vitaminas do complexo B, fibra solúvel, polifenóis, minerais e álcool, bem como ao fraco conteúdo de lípidos e açúcares, sendo, por isso, essencial para uma dieta saudável.


Vamos, então, esquecer aquela história da “barriguinha de Cerveja” e, sem abusar, naturalmente (o aconselhado é 1 a 2 copos por dia para as mulheres; 2 a 3 para os homens), tenhamos presente que, afinal, beber cerveja pode mesmo fazer bem à saúde.

Brindemos, então, à saúde ... da saúde. “Sai mais uma imperial!”



terça-feira, junho 26, 2007


Finalmente, e com a pompa e circunstância que o momento exigia, inaugurou-se ontem no Centro Cultural de Belém, o Museu Colecção Berardo.

O numeroso acervo de arte contemporânea foi visitado por cerca de 800 convidados, num fim de tarde que reuniu figuras da política, da cultura, das finanças e das artes.

Um dos presentes, o primeiro-ministro José Sócrates, felicitou o facto de um coleccionador privado ter colocado a sua colecção "à disposição de todos os portugueses". Com a inauguração do Museu Colecção Berardo, acrescentou, Portugal "fica um país mais rico" e Lisboa "uma cidade mais competitiva, mais atraente e com uma maior oferta cultural". José Sócrates terminou afirmando que "antes, o roteiro da arte contemporânea terminava em Madrid. Hoje começa aqui, em Lisboa".
Em resposta o Comendador Berardo agradeceu ao primeiro-ministro e à ministra da cultura o desfecho feliz de dez anos de negociações.


Berardo está na ordem do dia. Conseguiu até ofuscar a figura do ministro Mário Lino, que até há pouco dominava todos os noticiários, as conversas de café e era um dos temas principais do anedotário nacional.

Berardo está em todas, na PT, no BCP, no Benfica, enfim, em tudo aquilo em que ele anteveja a hipótese de ganhar milhões. E, é justo reconhecer isso, o homem é um artista nessa área, tem uma habilidade inata para ganhar dinheiro. Ele não cria riqueza para o país, ele não cria postos de trabalho, ele não é um investidor, ele é apenas (e não é pouco) um especulador que compra, vende e factura.

E nesta coisa do Museu Colecção Berardo mais uma vez ele ganhou. Tinha, pois, bastos motivos para agradecer aos ministros que foram na sua conversa. E qual foi ela? Simplesmente, pôs à disposição as suas obras de arte, como já o tinha feito em Sintra, e daqui a uns anos logo se vê se elas ficam por cá ou se as vai vender a quem lhe der mais dinheiro.

Se eu, que sou um tipo perfeitamente inábil para o negócio, tivesse uma colecção de pintura com milhares de quadros, teria ficado com uma dor de cabeça dos diabos. Onde os iria guardar, como os iria expor?

Num país a sério, ou os doava ao Estado ou criava um museu privado. Não era assim tão difícil de arranjar uma saída.

Mas, cá na aldeia, o problema que deveria ser do coleccionador passou a ser do Estado, porque os senhores que mandam no Estado ficaram aflitíssimos quando o Comendador ameaçou que meteria os quadros no bolso e os levaria para o estrangeiro se não lhe garantissem uma solução.

De aterrorizados, os nossos governantes passaram a bajuladores do futuro Presidente do Banco do Benfica e dono do próprio clube e reservaram-lhe uma parte significativa do Centro Cultural de Belém para os quadros ficarem lá expostos, garantiram-lhe que ele ainda poderia gozar do direito vitalício de vetar o nome do director escolhido pelo próprio Estado para gerir a área do CCB exclusivamente reservada para a colecção e, como cereja no topo do bolo, as despesas seriam pagas na íntegra, cá pelos contribuintes até ... 2017.

E com isto, o país garantiu algum direito sobre as obras? NÃO, um rotundo NÃO!

Em 2017, Berardo voltará a pensar no assunto e decidirá então se vai vender tudo ao Estado, se vai voltar a ameaçar que se vai embora ou se vai mesmo embora para vender a sua colecção a quem lhe acenar com mais dinheiro.

Há quem seja acérrimo defensor de Berardo, pela forma ousada e desabrida de dizer as coisas sem rodeios. Pois para mim, já chegava o Alberto João Jardim que, como tenho dito, já não há pachorra para o aturar. Agora, apanhar com mais um ...

Ainda ontem foi a inauguração e, ainda ontem já Mega Ferreira, Presidente do Conselho de Administração do CCB e, simultaneamente, Presidente do Conselho de Fundadores da Fundação Colecção Berardo, enviara uma carta a Berardo a demitir-se deste último cargo.

E porque teria sido? Por divergências anteriores com o coleccionador, por discordar com esta grande “fraude” que nos tapou os olhos em troca do privilégio de podermos admirar os seus quadros até 2017, por achar que tinha, de facto, “falta de empenho” como o acusou Joe Berardo ou por já não estar para aturar tanta arrogância do madeirense que publicamente anunciou que tinha tido a amabilidade de oferecer aquele lugar a Mega Ferreira?

Ou será que Mega Ferreira já tinha conhecimento que o Comendador estava a ponderar a hipótese de, ele próprio, presidir ao Conselho de Fundadores, lugar que Berardo tinha prescindido em Junho do ano passado?



Resta saber se em 2017, os governantes e entusiastas de agora com este mega negócio (para Joe Berardo, evidentemente), continuarão a pensar que “Portugal ainda será um país rico” e “Lisboa uma cidade muito competitiva, muito atraente e com uma grande oferta cultural”, ou se, pelo contrário, “o roteiro da arte contemporânea” voltou a terminar em Madrid e Lisboa saiu definitivamente do mapa.


domingo, junho 24, 2007

A Prova


Não sei como descrever toda a emoção que senti naquele momento. Sei, apenas, que estava a chegar a um ponto de exaustão total - físico e psicológico - muitos foram os lugares que visitei, tantas foram as bibliotecas e os museus que vasculhei e por onde espalhei a minha curiosidade e ansiedade.

Há anos que tentava descobrir uma prova, um indício, uma pista, um papel, um reles papelucho amarelado e rasgado que fosse, que constituísse uma prova inequívoca de que os espanhois constituíam um perigo real para o nosso país. Tudo em vão. E o desânimo instalara-se, perfeitamente perdido no labirinto dos meus pensamentos.


Não me bastava ouvir vezes sem conta “De Espanha nem bons ventos, nem bons casamentos”. Não me chegava ver os espanhois tomarem conta dos melhores comércios e das mais prósperas indústrias por cá existentes.

Cada vez mais, eu desconfiava deles. Aliás, sempre estive mais alerta com os espanhois do que com os chineses, que, como se sabe, também estão a tomar conta de Portugal e do Mundo, com excepção da Madeira do Alberto João, evidentemente.

Eis, senão quando, desesperado por não obter quaisquer resultados que me dessem, pelo menos, alguma esperança, dou de caras com uma prova inequívoca e irrefutável – A Prova que me faltava – para afirmar com toda a propriedade de que os espanhois são de facto uns piratas.

Ou, pelo menos, foram-no em mil seiscentos e vinte e tal, como consta no testemunho que encontrei.

E, cesteiro que faz um cesto ...








quinta-feira, junho 21, 2007

Os gémeos



Guardarei para outra ocasião falar de duas bonitas terras minhotas, ambas com o mesmo nome – Gémeos – uma pertencente ao Concelho de Celorico de Basto e outra ao concelho de Guimarães.
Tão-pouco vos falarei hoje sobre o signo do zodíaco Gémeos, bem assim como sobre a constelação Gémeos.

Hoje quero referir-me em concreto aos outros Gémeos, àqueles irmãos (dois ou mais) que nascem numa mesma gestação. E apesar de não haver uma estatística precisa, estima-se que uma em cada 85 gravidezes é gemelar.
Como se vê, a existência de gémeos não é assim tão invulgar como isso.

O que é mesmo invulgar, porventura único no mundo e, quem sabe, desde sempre, é que dois gémeos ocupem, ao mesmo tempo, dois dos mais altos cargos políticos e de maior destaque num país, a Polónia: presidente e primeiro-ministro.

Quase impossíveis de os distinguir à primeira vista, Jaroslaw Kaczynski (o mais velho e presidente) e Lech Kaczynski (primeiro-ministro), de 57 anos, evitam aparecer juntos em público para não correrem o risco de serem confundidos.

“Os políticos são todos iguais”, costuma dizer o povo. O ditado assenta que nem uma luva ao presidente e ao primeiro-ministro polacos. Além do mesmo apelido, Lech e Jaroslaw Kaczynski têm muito (quase tudo) em comum: gémeos idênticos (formados de um mesmo óvulo), praticamente impossíveis de distinguir à primeira vista, são vistos pelos analistas como “o par mais bizarro da política europeia”, com um percurso profissional e político demasiado semelhante e com os mesmos ideais conservadores, católicos, ultra-nacionalistas, homofóbicos e intolerantes.

Na escola, os gémeos confundiam professores e colegas fazendo-se passar um pelo outro: Jaroslaw substituía Lech nos exames de Ciências e o irmão retribuía o favor quando a matéria era Língua e Literatura. Logo na adolescência, os papéis ficaram bem definidos na relação entre os dois irmãos: 45 minutos mais velho, Jaroslaw sempre foi o líder, o estratega, aquele que tem as ideias, enquanto Lech, mais submisso, era e é o executante.
Ainda hoje, é muito complicado distinguir os dois políticos. Os mais atentos notam que Lech tem um sinal bem visível na bochecha e outro no nariz. Além disso, o presidente usa aliança, sinal do seu casamento com a primeira-dama Maria Kaczynski, enquanto o irmão é solteiro e vive com a mãe.
A escolha da formação académica também foi partilhada: ambos estudaram Direito na Universidade de Varsóvia.

Além de quase nunca aparecerem juntos, os gémeos Kaczynski (conhecidos como “patos”, por causa da sua baixa estatura e aparência física) também não dão entrevistas conjuntas. “As pessoas acham graça ao facto de sermos gémeos, mas os cargos de responsabilidade que ocupamos são uma coisa muito séria”, defende Jaroslaw, ao que Lech contrapõe: “O meu irmão não gosta, mas o facto de sermos gémeos atrai mais as atenções para a Polónia e isso é bom”.


Mas, achando-se ou não graça a esta invulgar situação, o que pode verdadeiramente preocupar os povos polaco e europeu é o facto acima referido, de ambos serem considerados como conservadores, católicos, ultra-nacionalistas, homofóbicos e intolerantes. E não é caso para menos!

quarta-feira, junho 20, 2007

Mas, afinal, aqueles ganharam o quê?


Depois de andados uns bons quilómetros a pé, o calor, a distância e o cansaço obrigavam-me a que descansasse um pouco e, se possível, acompanhado de uma bebida fresca.

Entrei na primeira quitanda que me apareceu pela frente. “Leitaria Lyz”, assim se chamava. Um nome muito sugestivo e que me pareceu, aparentemente, protector. Duas montras estreitas (decoradas com pacotes de bolachas Maria e com garrafas de vinho barato como, aliás, uma leitaria que se preze deve ostentar), ladeavam uma porta também estreita que dava acesso a uma sala igualmente estreita, com um balcão ao fundo.

Junto ao tecto, não podia faltar, naturalmente, um televisor de ecrã pequeno, para não destoar. A única coisa que sobressaía daquela pequenez toda era o som do televisor que estava aberrantemente alto, muitos decibéis acima do que seria adequado ao tamanho da casa.

Pedida a imperial fresquinha, olhei de soslaio para quem estava sentado na mesa do lado, por acaso completamente encostada à minha.

Contudo, nem necessitaria disfarçar o olhar, porque o meu vizinho, homem de mais de setenta anos, estava absorto por completo nas imagens que a televisão passava e sorria permanentemente perante o que ia vendo.

Olhei também e vi que estava a ser transmitido um directo com as claques afectas ao Futebol Clube do Porto, que comemoravam a conquista do campeonato nacional de futebol.

As pessoas pulavam sem cessar e gritavam num coro que prometia durar pela noite dentro ... “ganhámos, ganhámos, ganhámos ...”

Foi então que o meu companheiro de mesa, virando lentamente o rosto na minha direcção, mas mantendo o sorriso, me perguntou “mas, afinal, aqueles ganharam o quê?”

Expliquei-lhe que o clube deles, tinha ganho o campeonato de futebol e toda aquela euforia era por isso mesmo, por serem campeões.

“Eu sei”, disse o homem, “o clube ganhou, ganhou o treinador deles, ganharam os jogadores, eu isso percebo. Mas aquela gente toda que está para ali aos pulos e a gritar, ganharam o quê, isso é que eu não entendo”.

Estive tentado a falar-lhe das minhas teorias sobre os fenómenos metafísicos que são subjacentes ao que ao futebol diz respeito mas, também por respeito por um homem já muito vivido e que durante anos e anos fez parte de um país em que “Fátima, Futebol e Fado” constituíam a única razão da sua felicidade, preferi perguntar-lhe se me acompanhava em mais uma imperial, ao que ele, sem nunca perder o sorriso, respondeu “só se for para fazer um brinde àqueles que dizem que ganharam”

Feito o brinde, despejados os copos, despedi-me do senhor e saí da Leitaria, dando uma última espreitadela às garrafas de vinho expostas nas montras.

Enquanto completava a minha caminhada, não me saía da cabeça a expressão e o sorriso daquele senhor, nem a pergunta que ele tão genuinamente me fizera “mas, afinal, aqueles ganharam o quê?”

terça-feira, junho 19, 2007

O essencial é a fruta


Provavelmente por já não haver vagas disponíveis nas centenas de "dias internacionais de qualquer coisa" espalhados pelo ano, alguém teve a brilhante ideia de se começar a comemorar o “Dia Nacional da Fruta”, por agora, apenas em Portugal.

Neste momento vêm-se por toda a parte, qual epidemia, cartazes a informar uma coisa que, com toda a certeza, nunca ninguém tinha reparado e que os médicos e as várias campanhas de saúde que se fazem pelo país, devem ter esquecido de informar: “que a fruta é essencial na nossa alimentação”.

E vai daí, uma conhecida marca de sumos de fruta, tratou de publicitar convenientemente (e sem qualquer interesse, já se vê...) que a fruta é tão essencial à nossa saúde, que seria bom que fosse instituído oficialmente o “Dia Nacional da Fruta”, pelo que se propõe recolher mais de 4 mil assinaturas e entregá-las na Assembleia da República.

Estamos, pois, a um passo de ser aprovado pelo Parlamento Português, o “Dia Nacional da Fruta”. Da fruta, genericamente falando, não interessa se estamos a comemorar, o dia dos morangos, das peras ou dos melões.

Embora avesso aos dias “Internacionais” ou “Nacionais”, devo, contudo, louvar a iniciativa desinteressada da tal marca de sumos de ... fruta, que apenas pensou na saúde e no bem estar da nossa população em geral e das crianças em particular. Aquelas mesmas crianças que não param de puxar pela roupa dos papás nos supermercados, para pedir que levem mais umas embalagens de sumos ... daquela marca.

Mas a ideia veio em muito boa altura. Primeiro porque o verão está mesmo a chegar e os sumos bebem-se sempre bem; depois porque a Portugal está a poucos dias de começar a exercer a Presidência da Comunidade e, nunca se sabe, se os outros países parceiros não ficarão interessados em aderir ao “Dia Português da Fruta”, e talvez daí possam surgir umas quantas encomendas à tal marca e, no limite, forçar o Presidente Durão Barroso a determinar que o Dia Nacional (o nosso, o português), passe a “Dia Internacional da Fruta”, comemorado em toda a Europa e, quiçá, no Mundo.

Ocorrem-me duas palavras para classificar tal iniciativa. Uma, é empreendorismo. A outra também termina em ------ismo, mas é melhor não dizê-la para não ser mal interpretado.

Elogio ao Amor


O Miguel Esteves Cardoso brinda-nos frequentemente com maravilhosos textos. O de hoje, que gostosamente transcrevo, trata de um sentimento a que sou particularmente sensível, o amor. Uma magnífica crónica, escrita com o brilhantismo de sempre, com humor, com um humor cáustico, por vezes, mas cheio de verdades e de desesperos. Um elogio ao amor que se insurge com a falta dele, com a passividade, com o deixa andar, com o desencanto mas, também com a esperança e a vontade de amar.

Entre o vaivém de contradições emocionais, Miguel, no fundo, ainda que de forma ténue, luta desesperadamente pelo amor verdadeiro, pelo que é sofrido, pelo conquistado e, daí o Elogio ao Amor, muito embora se sinta aqui e ali a sua angústia e desencanto, mais parecendo que o que escreve é a Elegia do Amor que, como se sabe, é a composição poética consagrada ao luto e à tristeza. Provavelmente porque sente, com amargura, que os apaixonados de hoje têm dificuldade em perceber que o amor é fogo que arde sem se ver...
Um belo texto de Miguel Esteves Cardoso.



Quero fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.

Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.

Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática.

O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.

Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há! Estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje.
Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "Tá! Tudo bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, banalidades, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?

O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto.

O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição.

Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não dá para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.

Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir.

A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.

domingo, junho 17, 2007

A bailarina mais-que-estranha


Roman Dirge é ilustrador de numerosas publicações underground. Quando um belo dia se cruzou em Los Angeles com Tim Burton, este, ter-lhe-á dito que o seu estilo era “belo” e “eterno”.

Do livro “está alguma coisa a arranhar à janela”, pequenos versos para meninos travessos, de Roman Dirge


A bailarina mais-que-estranha



Juro que não é nenhuma patranha,

Ter visto uma bailarina mais-que-estranha,

Dançava muito mal, como um velho mecanismo,

E deixou de dançar depois de cair no abismo.



sexta-feira, junho 15, 2007

Palavras para quê ...

Quem não se recorda daquele anúncio “Palavras para quê… é um artista português!” ... que publicitava a “Pasta Medicinal Couto” e que passava a toda a hora na televisão?

Sem pretender fazer publicidade à marca (mas já estando a fazer, como diriam os nossos amigos brasileiros), não quero deixar de assinalar o aniversário de um produto que nos acompanhou durante uma boa parte da vida e ajudou a criar hábitos de higiene oral em Portugal.

Fez anteontem 75 anos (13 de Junho de 1932) que a “Pasta Medicinal Couto” foi registada. Tinha nascido, então, a pasta que andava "na boca de toda a gente", como dizia o anúncio televisivo dos anos 70, e onde um artista moçambicano rodopiava num palco uma cadeira de madeira presa nos dentes.

Em 2001, por imposição comunitária, a marca deixou de ter a palavra “medicinal” mas, ainda hoje, continua a manter a fórmula, a qualidade e a imagem de sempre.

Mas a “Couto, SA” para além de produzir a “Pasta Couto” também fabrica o inesquecível “Restaurador Olex”, o tal que passava até à exaustão um anúncio que dizia:

“Um preto de cabeleira loura ou um branco de carapinha não é natural. O que é natural e fica bem é cada um usar o cabelo com que nasceu”. Lembram-se?

Duas marcas “clássicas”, cujos anúncios, intemporais, constituem verdadeiras relíquias da publicidade de outros tempos.

Para os mais saudosistas ou para quem, apenas, tenha curiosidade em revisitar a história, sugerimos que visitem o sítio da Couto, SA, através do endereço

http://www.couto.pt e, depois, em audiovisuais, clicar em ver todos.
Deliciem-se!

quarta-feira, junho 13, 2007

Quando dois mais dois eram quatro


Ainda há dias manifestei aqui mesmo a minha perplexidade sobre os processos de avaliação dos exames de português. E fi-lo, por não concordar que, em certas provas, os examinadores apenas levem em consideração se os alunos entenderam ou não o texto, sem sequer se preocuparem se nas respostas dadas, o português está bem ou mal construído e se tem ou não erros ortográficos. Ao que parece, isso não interessa nada, pelo menos, nesse momento.


Pois agora, processo idêntico se passa no reino da matemática, em que nas provas do 4º. e do 6º. anos, as respostas incorrectas vão ser pontuadas como se as mesmas estivessem certas.

E se há coisas que me custam muito a perceber, esta é uma delas. Por exemplo, se um aluno do 4º. ano responde que o dobro de 6 dl são 120 dl, a sua resposta pode ser considerada correcta e ter a pontuação máxima. Porque a resposta está certa? Não, ela não pode estar mais errada mas, segundo o critério do Ministério, o resultado apurado pelo aluno pode tratar-se, apenas, de um “erro de transcrição”, porque o raciocínio do problema foi elaborado correctamente.


Nos meus tempos de estudante, e no que à matemática diz respeito, passei por dois tipos de avaliação. Uma, a que embora o raciocínio do problema estivesse correcto mas que tinha o resultado errado, os professores consideravam que o aluno tinha percebido a lógica, tinha apresentado algum trabalho aproveitável e, por isso, davam alguma pontuação pelo desenvolvimento desse raciocínio, mas nunca os 100%.

A outra avaliação era mais radical. Considerava que estando o resultado final errado, a pergunta não tinha direito a qualquer pontuação, ainda que o desenvolvimento do problema estivesse impecável até quase à ponta final.

Podem crer, no entanto, que se algum aluno respondesse que 2 + 2 era igual a 5, a pontuação que teria só poderia ser a de um zero muito redondo ... e muito grande.


Tenho consciência que não conheço as técnicas de avaliação que hoje norteiam o ensino, nem sequer disponho das noções básicas sobre os actuais processos de aprendizagem.

Mas sei, em contrapartida, que a matemática é, por natureza, uma ciência rigorosa e exacta e que não admite duas respostas correctas quando existe apenas uma. E isto sempre foi assim e, espero, que assim continuará para sempre. Ou estarei errado?

segunda-feira, junho 11, 2007

As teias da justiça


Em 2004, um homem considerado como um dos maiores traficantes de droga da Europa, foi julgado e condenado pelo Tribunal de Sesimbra à pena máxima de 25 anos de prisão.

No entanto, graças a um “Habeas Corpus” habilidosamente interposto pelo seu advogado, consegue ser solto e, fugindo a um outro mandato de captura pendente, escapa-se para o Brasil onde, é, finalmente, capturado em Outubro passado.

Repetido o julgamento, agora no Tribunal da Boa-Hora, o veredicto foi-lhe favorável. Desta vez, foi absolvido.

Perante a nova resolução, a grande questão que se coloca é como pode um homem passar tão rapidamente de condenado a 25 anos de prisão a absolvido?

Ou a Polícia Judiciária, o Ministério Público e o Tribunal de Sesimbra cometeram todos um tremendo erro judicial ou, pelo contrário, foram os Juizes do Tribunal da Boa-Hora que, depois de tantos anos de investigação, mandaram um culpado em liberdade.

Qualquer das alternativas nos faz pensar e, no mínimo, ficar apreensivos ...

domingo, junho 10, 2007

O descontrolo das despesas das obras públicas


Francamente não me recordo se já escrevi sobre este assunto, mas é muito provável que o tenha feito, uma vez que o tema é tão recorrente que se arrasta há um ror de anos e, infelizmente, não se prevê que venha a ser resolvido alguma vez.

Aliás, é tão frequente que aconteça que os próprios portugueses já demonstram alguma indiferença perante o caso, uma vez que ele entrou rotineiramente no seu dia-a-dia. Daí que não se importem demasiado com essas situações (embora lhes saia do bolso), e constitua, apenas, mero motivo para breve conversa em que se aproveita para dizer mal do governo e dos políticos em geral.

Estou a referir-me, como é obvio, aos enormes desvios verificados entre os orçamentos apresentados para a execução das obras públicas e o custo final dessas obras, desvios esses que são verdadeiramente chocantes e que, na verdade, numa época em que se evoca continuamente o rigor e a transparência, ninguém pode admitir.

Diz o bom senso, e é assim que as coisas acontecem quando fazemos alguma obra na nossa casa, que feito um orçamento pelo mestre de obras, pelo arquitecto, pelo trolha, seja lá por quem for, essa verba tem que ser cumprida escrupulosamente. Ou dito por outras palavras, temos que estar prevenidos com um determinado montante para custear a obra que nos propusemos fazer, e esse montante tem que dar para cobrir o que está estipulado no tal orçamento. Orçamento ou folha de encargos que tem que prever, obrigatoriamente, o que vai ser feito, quanto é que isso vai custar e a data em que essa obra terminará.

Mas se é assim (ou deve ser) nas obras particulares, quanto às obras públicas as coisas mudam definitivamente de figura.

Primeiro porque as obras públicas são, em regra, sujeitas a um concurso público, o qual para ser ganho por um dos diversos concorrentes, todos sabemos, irão apresentar propostas com preços inferiores ao custo real da obra. O princípio está de tal forma generalizado que ninguém desconhece que a proposta apresentada apenas se destina a ganhar o concurso. Ela não é, de todo, vinculativa nem existem quaisquer penalizações por serem entregues mais tarde, outras propostas que substituem as primeiras, essas sim, que apresentam um preço muito mais alto do que o inicial e bastante mais aproximado do que a obra irá custar de facto.

Segundo, porque toda a gente sabe que não existe uma fiscalização permanente e exigente que os obrigue a cumprir o orçamento inicial aprovado nem o tempo determinado para a execução da obra. Isto, naturalmente, se não existirem alterações à obra inicial ou haja qualquer outro factor inesperado que impeça a concretização da obra dentro dos parâmetros aprovados.

Como resultado de toda esta bagunça, temos que em Portugal as obras públicas custam, em média, o dobro do inicialmente previsto. Houve até obras que “derraparam” uns míseros 724%. É obra!

E isto quando se consegue apurar o valor real da obra, porque na maioria dos casos nunca se sabe quanto é que foi realmente gasto.


A construção dos estádios do Euro 2004 são um bom exemplo de tão má gestão. O custo final dos seis estádios a cargo do Estado, ficou mais de 200 milhões de euros acima do valor considerado na decisão.

Maiores que esse desvio, porém, podemos dizer que a construção do Parque de Material e Oficinas III do Metro, passou de 14 milhões de euros orçamentados, para um custo final de 115,36 milhões de euros. Uma derrapagem desta grandeza em apenas 7 anos de construção.

Nas Linhas da Baixa/Chiado e Cais do Sodré, as estimativas iniciais apontavam para 52,5 milhões de euros, tendo-se gasto no final 355,5 milhões de euros.



Sem haver rigor técnico na avaliação das propostas apresentadas, sem haver controlo adequado por parte do dono da obra, sem que sejam definidas regras completamente claras e penalizantes para quem as não cumpre, é difícil travar este estado de coisas que suga ao Estado, todos os anos, milhões de euros.

Mas se, eventualmente, todas estas medidas fossem asseguradas é possível, de acordo com a opinião do Professor Luís Valadares Tavares, que o nosso país poupasse cerca de 20%, ou seja, 2,8% do PIB, o que seria suficiente para eliminar o défice orçamental.
Então, do que é que o governo está à espera?

quarta-feira, junho 06, 2007

"Pela boca morre o peixe"



Não é do provérbio que hoje vos venho falar, aliás um provérbio que se aplica muitas vezes e pelo qual eu tenho uma especial simpatia.


Não, hoje o que pretendo é sugerir-vos a leitura de um livro de João Pombeiro, jornalista e editor do suplemento de sábado do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias, livro que tem um título muito interessante, justamente “Pela Boca Morre o Peixe”.


Trata-se de uma compilação de ditos dos nossos mais ilustres políticos contemporâneos, uns mais espirituosos, outros mais ingénuos, outros ainda reveladores da evidente falta de talento para prever o futuro, proferindo “sentenças” que a realidade, mais tarde, iria contradizer.


É um livro que nos diverte e que, ao mesmo tempo, apela para o nosso bom senso, por forma a que não digamos coisas que mais tarde nos venhamos a arrepender.


Só para “abrir o apetite”, algumas dessas passagens:

- Corria o ano 2000, e José Sócrates ainda era ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território. Perguntam-lhe um dia: “vamos vê-lo, um dia, primeiro-ministro?

«Não! Primeiro, porque não tenho o talento e as qualidades que um primeiro-ministro deve ter. Segundo, porque ser primeiro-ministro é ter uma vida na dependência mais absoluta de tudo, sem ter tempo para mais nada. É uma vida horrível e que eu não desejo. Ministro é o meu limite.»


- ou este, de Marques Mendes, em 1999:

Tem esperanças de um dia passar a ser o número um [do PSD]?

«Não! Nem pensar! Essa perspectiva está completamente fora do meu horizonte.»

Por que o diz de forma tão determinada?

«Porque não tenho qualquer tipo de dúvidas. Tenho noção das minhas qualidades e das minhas limitações.»

- Agora um exemplo da arte inimitável que o nosso ex-presidente da república, Jorge Sampaio, tem de falar de modo a que ninguém o entenda:

«Não é justo nem razoável que persistam enviesamentos masculinocêntricos tão acentuados nas questões políticas agendáveis.»
Bonito, não é?

- Segue-se uma tirada espirituosa de Santana Lopes:
«Não sou Maria-vai-com-as-outras, mas gosto imenso que elas venham comigo.»


- Avelino Ferreira Torres, inconfundível, corria o ano de 2003:
«Quem pensa que há promiscuidade entre a política e o futebol é um estúpido.»


- O famoso pragmatismo de Mário Soares, em 1999:
«É preciso continuar a sacar dinheiro da Europa.»
Ora nem mais.


- A religiosidade fervorosa de Paulo Portas, em 2003:
«Sei que o senhor não é crente, mas tenho as provas irrefutáveis, racionais, positivistas de que Nossa Senhora existe. Que é portuguesa. E que é de Fátima.»


- seguido do apocalíptico Alberto João Jardim, em 2001:
«Eu sou o princípio e o fim. A vida. Tal como nos Evangelhos.»


- Por fim, para verem bem do que nos livrámos, o visionário Otelo Saraiva de Carvalho:
«Tenho falta de estrutura política, se tivesse essa cultura, que não tenho, poderia ter sido um Fidel Castro da Europa.»



Espero que este “cheirinho” do livro de João Pombeiro, “Pela Boca Morre o Peixe”, vos encha de curiosidade e que a sua leitura vos faça passar um bom bocado!



segunda-feira, junho 04, 2007

Às vezes passam-nos coisas pela cabeça ...


Li há dias numa sondagem do Eurobarómetro que os dinamarqueses são considerados o povo mais feliz do mundo. E porquê? Porque apesar de pagarem impostos elevadíssimos (a maioria dos trabalhadores contribui com 50% a 60% do rendimento bruto), eles confiam na gestão dos seus governantes e na correcta distribuição da riqueza e vêem as autoridades do seu país como entidades competentes, acessíveis e incorruptas. Ao mesmo tempo, não perdoam falhas a quem os dirige. Conhecem bem os seus direitos e deveres de cidadania e, quando algo corre mal nos serviços do Estado, são implacáveis a reclamar, a corrigir e a prevenir repetições.
Têm um sentido de civismo e de cidadania extremamente desenvolvidos e, como em outros povos, os dinamarqueses cultivam a responsabilidade firme e construtiva.

Por tudo isso, os dinamarqueses são considerados o povo mais feliz do mundo.


Mas, como no melhor pano cai a nódoa, aconteceu que um dinamarquês, porventura o único cidadão que não é completamente feliz no seu país, insatisfeito com uma decisão do árbitro que dirigia o jogo de futebol entre a Dinamarca e a Suécia, no passado sábado, a contar para o apuramento para o Campeonato Europeu da modalidade, não esteve pelos ajustes, desceu ao relvado e vá de esmurrar o pobre do árbitro – o alemão Herbert Fandel - no pescoço.

Uma cena bem violenta, nada de acordo com o tão propalado civismo atribuído aos dinamarqueses, e que mais parecia uma das muitas imagens a que temos assistido em jogos de futebol disputados na América do Sul.


É legítimo, pois, pensar que:

Até mesmo as pessoas que tradicionalmente têm comportamentos correctos, também podem ter os seus dias maus;

O futebol gera, de forma indiscriminada, tensões de tal forma intensas e incontroláveis, que atravessam gerações, raças, graus académicos, extractos sociais, religiões e nacionalidades,
chegando mesmo a atingir pessoas que (por fazerem parte do povo mais feliz do mundo) deveriam estar imunes à insanidade mental que um mero encontro de futebol pode, por vezes, provocar.

Está bem, não sabem escrever português, mas o que é que isso interessa?


Não pertenço ao grupo que é, vulgarmente, conhecido por “treinadores de bancada”, aqueles que não sendo uns verdadeiros especialistas, não se coibem, contudo, de dar os seus “bitaites” e de afirmar convictamente as suas teorias abalizadas de como as coisas devem ser feitas e quais a estratégias a seguir.

No entanto, e mesmo não sendo um “expert”, é claro que tenho opiniões sobre os assuntos e permito-me muitas vezes discordar das teorias que certos peritos da nossa praça entendem estabelecer como regras. Não por perceber mais do que eles, mas simplesmente porque tenho a mania de pensar e porque tenho todo o direito a não estar de acordo com as suas opiniões.

Foi o que aconteceu quando li que, nos exames de Português do 4º., 6º. e 9º. anos de 2006, os critérios de avaliação não penalizavam os alunos que respondessem à perguntas com erros de ortografia, desde que as respostas estivessem correctas. Ou seja, as respostas correctas pontuavam, mesmo que elas viessem cheias de erros nos planos ortográfico, lexical, morfológico e sintáctico.

O que quer dizer que com esta pedagogia da facilidade, o que os responsáveis do Ministério acham verdadeiramente importante é que os alunos respondam correctamente às questões de interpretação, deixando sem penalização outros aspectos igualmente fundamentais da língua, nomeadamente, a construção das frases e o escrever sem erros ortografia.

Ora aí está, separar as várias avaliações não me parece, a mim que sou um leigo na matéria, uma boa opção. Que necessidade é essa, tão imperiosa, que obriga a que a avaliação da interpretação do texto seja feita separadamente da avaliação da forma como se escreve? Será que a preocupação destes “entendidos” se situa fundamentalmente em saber se o aluno compreendeu ou não o texto e, pronto, ficamos por aí?


Tudo isto me parece um absurdo total. Permite-se que nas provas de português – da língua materna, portanto – que os erros de português não tenham gravidade alguma nem contem para o resultado final.

E assim, os alunos vão passando de ano em ano e chegarão, porventura, à universidade, sem dominarem minimamente a nossa língua.

O que me faz questionar. Afinal, com esta lógica de ensino que permite que nas provas de “língua-pátria” (como dantes se chamava) se escreva mal o português, como queremos que esses alunos venham, um dia, a falar e a escrever correctamente o português?

sexta-feira, junho 01, 2007

Vamos lá abrir a boca ...


Pode parecer que é mais uma das piadas do ministro Mário Lino mas, garanto, que não é.

Como é do conhecimento público, e sobretudo daqueles que utilizam os serviços da segurança social, os centros de saúde e os hospitais públicos não fornecem serviços de cuidados de saúde oral, que é como quem diz, nessas estruturas, os dentistas são praticamente inexistentes.

Para a totalidade do país, mesmo considerando que se trata de um pequeno país, temos disponíveis apenas 20 dentistas, 18 dos quais a exercer nos Açores e 2 em Trás-os-Montes. É pouco, praticamente nada. E, convenhamos, não é lá muito prático a quem resida em Faro ou em Leiria deslocarem-se a Trás-os-Montes ou aos Açores para irem tratar de uma cárie dentária ou extrair um dente. Não é prático e é muito caro.

E é por isso que, pela falta de dentistas nos serviços públicos, mais de metade dos portugueses adultos (60%) não tem acesso à medicina dentária, nomeadamente por falta de dinheiro, já que a quase totalidade dos profissionais do ramo trabalham no sistema privado.


Mas o governo, e repito que isto não é mais uma piada do ministro Mário Lino, promete reverter esta situação e os centros de saúde poderão vir a ter dentistas para dar resposta aos problemas básicos da saúde oral dos portugueses.
Assim sendo, o alargamento de serviços prestados nos centros de saúde é uma das apostas do governo para os próximos dois anos, muito embora o Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, avise desde já que a resolução deste problema demorará anos, muito embora não dissesse quantos...

De qualquer forma, é uma boa notícia e será muito bom que se comece a trabalhar rapidamente.

Em Portugal, o Programa Nacional de Saúde Oral existe apenas para as crianças e tem sido sucessivamente alargado dos 3 aos 18 anos. Desde que foi criado, contribuiu para uma grande evolução na saúde oral dos mais novos, mas, segundo o bastonário, ainda há muito por fazer.

Quanto ao resto da população, a oferta é praticamente nula. Não há serviços nem para a população de risco, como idosos, grávidas, doentes com HIV/sida ou pessoas que são sujeitas a cirurgias e para as quais uma simples infecção dentária é um risco..

Vamos, então, ser optimistas e imaginar que, finalmente, vamos pôr os portugueses de boca aberta (para tratar dos dentes, é claro).

Mas atenção, não comecem a pedir já o céu, pois o pacote de cuidados básicos pensado pelo governo, não contempla nem os implantes nem os branqueamentos, nem, tão-pouco, trata ... dos males de boca provocados pelas piadas e trapalhadas de ministros.
Para estas últimas, o melhor remédio continua a ser uma boa pitada de pimenta na língua ou, em último caso, a remoção (despedimento, se for caso disso) rápida desses ministros.