quinta-feira, janeiro 31, 2008

Velhos são os trapos ...


Envelhecer é um processo natural e inevitável. E se, noutros tempos, era-se velho quando se chegava ao meio século, hoje com o avanço da ciência no combate às doenças, com a alimentação mais equilibrada e a prática do exercício físico, enfim, com a melhoria da qualidade de vida, a definição de velhice passou a aplicar-se a pessoas com idades bastante mais avançadas.

Isto, claro está, pode-se aplicar genericamente mas não no que concerne às empresas, para quem um trabalhador começa a ser velho aos quarenta e também para os jornalistas que teimam em chamar idosos a pessoas que tenham mais de quarenta e cinco ou cinquenta anos.

Permitam-me um breve parêntesis para manifestar o meu interesse, a minha curiosidade, em saber como vai ser resolvida a questão que opõe os governos que querem fazer trabalhar (e descontar para os sistemas de segurança social) os pobres trabalhadores até aos 65/68 anos (por enquanto) às empresas que querem mandar embora aqueles que têm 40 anos ou pouco mais. É um problema que não sei como vai terminar. O que vão fazer aos que ultrapassem os 40? Por um lado as empresas já não contam com eles, por outro os governos obrigam-nos a estar no activo até tarde para descontarem o mais possível.

Bom, mas excepções e situações à parte, perante o aumento da longevidade humana, já se fala em terceira e quartas idades. Há 10 anos a expectativa de vida era de 65-70 anos, actualmente passou para 75-80 anos, pelo que a chamada terceira idade vai hoje até por volta dos 80 anos e só depois disso se começa a falar da quarta idade, numa altura em que as pessoas começam de facto a ser idosas.

Claro que tudo isto não passa de um mero conceito e da velha mania de se querer catalogar e etiquetar tudo. Mas, como sempre digo, é perigoso e injusto generalizar. Tudo depende da saúde de cada um, dos seus aspectos físicos, psicológicos e do nível de dependência e mobilidade. Cada caso é um caso.

Mas o que mais me preocupa é o facto dos idosos, independentemente dos anos que tiverem, estarem a ser muito maltratados. Muito mais do que antes se verificava.

Como se não lhes bastasse os desamores e os desafectos que tanto os magoam, dizem as estatísticas que o fenómeno da violência contra os idosos tem vindo a aumentar em Portugal. Consta que nos últimos cinco anos este tipo de criminalidade – física, psicológica ou por negligência - triplicou. Apesar de haver consciência que muitos casos não são sequer denunciados.

É urgente cuidar dos idosos. É urgente mudar mentalidades e condenar quem sem qualquer escrúpulo abandona à sua sorte pessoas que estão naturalmente mais debilitadas e que carecem que lhes seja prestado todo o apoio, quer no que concerne à satisfação dos cuidados primários de saúde e higiene, quer no que diz respeito ao seu acompanhamento afectivo.

Como já tenho afirmado, “Os idosos necessitam de muito pouco, mas precisam tanto desse muito pouco” .

quarta-feira, janeiro 30, 2008

Um discurso de revolta

Tive conhecimento do vídeo nos últimos meses do ano passado e, creiam, tocou-me profundamente. Depois de ouvir esta jovem proferir o discurso, neste tom e com a profundidade que emudeceu os congressistas, devo dizer que maior que a coragem e a convicção que ela teve, maior mesmo, só a falta de vontade das nações e o seu egoísmo em querer proteger apenas e tão só os seus interesses, sem qualquer respeito pelos outros e pelo Planeta em que vivemos.

Reparem que esta conferência teve lugar, se bem consegui ver a data que consta em fundo, em 1992. Passaram, entretanto, mais de quinze anos. Nem o protocolo de Quioto nem discursos deste tipo, nem campanhas devidamente preparadas por organizações ambientalistas, nem acções protagonizadas por pessoas tão conhecidas como Al Gore conseguiram fazer com que alguns dos países mais poderosos do mundo aderissem ao espírito de Quioto.

Perante a ameaça real das alterações climáticas, que vai já provocando as maiores catástrofes em todo o mundo, conseguiu-se enfim realizar há pouco a chamada “Conferência de Bali” que parece ter conseguido alguns resultados animadores, uma vez que conseguiu que todos os países lá representados “entendessem” a necessidade de uma efectiva redução de emissões de dióxido de carbono. Até os Estados Unidos assinaram este documento, cujos objectivos, no entanto, só poderão ter alguns resultados a longo prazo.

Entretanto, todos nós vamos esperando que o bom-senso dos responsáveis das nações possa, ao nível de cada país, produzir efeitos visíveis nos próximos anos.

Enquanto isso, e depois de ouvir a Seven Suzuki, penso que valerá a pena reflectir sobre as suas palavras, cujo discurso transcrevo na íntegra.

__________


“Olá, sou Seven Suzuki e represento a “ECO”, a organização das crianças em defesa do meio ambiente.
Somos um grupo de crianças canadenses, de 12 e 13 anos, que tenta fazer a nossa parte – contribuir.
Nanessa Suttie, Morgan Geisler, Michelle Quigg e eu.
Todo o dinheiro que precisávamos para vir de tão longe, conseguimos nós próprios para dizer que vocês, adultos, têm que mudar o vosso modo de agir.
Ao vir aqui hoje, não necessito de disfarçar o meu objectivo. Estou a lutar pelo meu futuro.
Não ter garantia quanto ao meu futuro não é o mesmo que perder uma eleição ou alguns pontos na bolsa de valores.
Estou aqui para falar em nome das gerações que estão por vir.
Estou aqui para defender as crianças com fome cujos apelos não são ouvidos.
Estou aqui para falar em nome dos inúmeros animais que morrem em todo o planeta porque já não têm mais para onde ir.
Não podemos mais permanecer ignorados.
Hoje tenho medo de apanhar sol por causa dos buracos na camada de ozono.
Tenho medo de respirar esse ar porque não sei que substâncias químicas o estão a contaminar.
Eu costumava passear em Vancouver com o meu pai até ao dia em que pescámos um peixe com cancro.
Temos conhecimento de que animais e plantas estão a ser destruídos diariamente e em vias de extinção.
Durante toda a minha vida eu sonhei ver grandes manadas de animais selvagens, selvas e florestas tropicais repletas de pássaros e borboletas, mas agora pergunto-me se os meus filhos vão poder ver isso tudo. Vocês preocupavam-se com essas coisas quando tinham a minha idade?
Todas essas coisas acontecem bem diante dos nossos olhos e, mesmo assim, continuamos agindo como se tivéssemos todo o tempo do mundo e todas as soluções.
Sou apenas uma criança e não tenho soluções. Mas quero que saibam que vocês também não as têm. Vocês não sabem como reparar os buracos de ozono. Vocês não sabem como salvar os salmões das águas poluídas. Vocês não podem ressuscitar os animais extintos. Vocês não podem recuperar as florestas que um dia existiram e onde hoje é um deserto. Se vocês não podem recuperar nada disso, então, por favor, parem de destruir. Aqui vocês são os representantes dos vossos governos, homens de negócios, administradores, jornalistas ou políticos mas, na verdade, são mães e pais, irmãos e irmãs, tias e tios e todos também são filhos.
Sou apenas uma criança mas sei que todos nós pertencemos a uma sólida família de 5 biliões de pessoas e, ao todo, somos 30 milhões de espécies compartilhando o mesmo ar, a mesma água e o mesmo solo. Nenhum governo, nenhuma fronteira poderá mudar esta realidade.
Sou apenas uma criança mas sei que este problema atinge-nos a todos e deveríamos agir como se fossemos um único mundo rumo a um único objectivo.
Apesar da minha raiva, não estou cega. Apesar do meu medo, não sinto medo de dizer ao mundo como me sinto.
No meu país temos tanto desperdício. Compramos e deitamos fora, compramos e deitamos fora e os países do Norte não compartilham com os que mais necessitam. Mesmo quando temos mais do que o suficiente, temos medo de perder as nossas riquezas, medo de compartilhá-las. No Canadá temos uma vida privilegiada com fartura de alimentos, água e casa. Temos relógios, bicicletas, computadores e aparelhos de televisão.
Há dois dias, aqui no Brasil, ficámos chocados quando estivemos com crianças que moram nas ruas. Ouçam o que uma delas nos contou “Eu gostaria de ser rica e, se fosse, daria a todas as crianças de rua alimentos, roupas, remédios, casa, amor e carinho”.
Se uma criança de rua que não tem nada ainda deseja compartilhar, porque é que nós que temos tudo somos ainda tão mesquinhos? Não posso deixar de pensar que essas crianças têm a minha idade e que o lugar onde nascemos faz toda a diferença.
Eu poderia ser uma daquelas crianças que vivem nas favelas do Rio. Eu poderia ser uma criança faminta da Somália, uma vítima da guerra do Médio Oriente ou uma mendiga na Índia.
Sou apenas uma criança mas, ainda assim, sei que se todo o dinheiro gasto nas guerras fosse utilizado para acabar com a pobreza para achar soluções para os problemas ambientais que lugar maravilhoso seria a Terra.
Na escola, desde o jardim de infância, vocês ensinam-nos a ser bem comportados, a não brigar com os outros, resolver as coisas a bem, a respeitar os outros, a arrumar a nossa desarrumação, a não maltratar as outras criaturas, a dividir e a não ser mesquinho. Então, porque é que vocês não fazem justamente aquilo que nos ensinaram?
Não esqueçam o motivo que os levam a assistir a estas conferências.
Vejam-nos como os vossos próprios filhos. Vocês estão decidindo em que tipo de mundo nós iremos crescer. Os pais devem ser capazes de confortar os seus filhos dizendo-lhes “tudo ficará bem, estamos a fazer o melhor que podemos”. Mas não acredito que possam dizer-nos isso. Será que estaremos mesmo na vossa lista de prioridades?
Meu pai sempre me disse “tu és aquilo que fazes e não aquilo que dizes”.
Bem, o que vocês fazem, nos fazem chorar à noite. Vocês adultos dizem-nos que nos amam. Eu desafio-vos, por favor, façam as vossas acções reflectirem as vossas palavras.
Obrigada”.

terça-feira, janeiro 29, 2008

O país da couve







Ao ler a notícia que os terrenos da antiga Feira Popular de Lisboa depois de destruídos todos os equipamentos lá existentes estão ao abandono e já servem para plantar couves, não pude deixar de pensar nas inúmeras hortas que vão crescendo um pouco por toda a parte. Ladeando as estradas, em terrenos planos ou nas encostas mais ou menos íngremes cultivam-se legumes e hortaliças de que o símbolo maior é, sem dúvida, a couve galega que tantas vezes chama a atenção pelo seu porte altivo.
E os agricultores urbanos lá estão empenhados no seu mester, de enxada na mão amanhando a terra onde crescem batatas, couves, tomates, espinafres e alfaces, entre outros, não esquecendo nunca a altaneira couve galega que não tardará a sentar-se à sua mesa para acompanhar um pedaço de bacalhau bem regado de azeite ou fazendo parte de um saboroso caldo verde.

Cultivar hortas em terrenos baldios, para além de alimentar o estômago de toda a família e, por vezes, de ganhar algum dinheiro com a venda dos produtos, é também em muitos casos, uma forma de ajudar a passar o tempo. Entreter o espírito com o contacto com a terra, funciona como uma espécie de terapia sobretudo para pessoas oriundas de meios rurais que conseguem, deste modo e no meio do betão das grandes cidades, um retorto às suas origens.

Mas para além de todo o ruralismo que se entranhou no seio das próprias cidades e na falta de outros espaços verdes que se oponham com determinação ao crescimento desenfreado de prédios e mais prédios, não deixo de achar um certo bucolismo e, em certos casos, até uma certa beleza, nas verdejantes filas de alfaces, couves e quejandas.

Bem se pode dizer que vivemos no país da couve!





segunda-feira, janeiro 28, 2008

A fífia de Mendes Bota




Mendes Bota, vice-presidente do PSD e líder da distrital do Algarve, durante jantar de Ano Novo que, sábado à noite, reuniu cerca de 700 militantes do partido e que teve como convidado especial Alberto João Jardim, certamente motivado pela presença inspiradora do Rei da Madeira, teceu alguns comentários sobre a ASAE que não podem deixar de irritar qualquer cidadão que tenha um mínimo de bom-senso, social-democrata ou não.

Frases como:

Salazar tinha a PIDE e hoje temos a ASAE, uma polícia de costumes e sabores que persegue os cidadãos”; ou

Salazar era ditador e não enganava, mas agora temos uma democracia formal, que é uma ditadura que oprime os cidadãos. Existe uma grande semelhança entre os Governos de Salazar e de Sócrates”; ou ainda

Só José Sócrates leva a sério a instituição (ASAE)”.

Mendes Bota, para além da idade que tem, do percurso político que consta no seu currículo e das responsabilidades políticas, e não só, que lhe cabem, deveria ser mais contido nas suas afirmações. E mais, tinha a obrigação de saber o que é que a PIDE significou para o país e para os cidadãos que não concordavam com o regime e deveria também ter a consciência que se o governo de Sócrates fosse “semelhante” ao de Salazar e a ASAE uma congénere da PIDE, os seus comentários levá-lo-iam directamente à prisão.

Donde, as suas palavras foram, no mínimo, muito infelizes.


Quanto à ASAE, não é só o primeiro-ministro que gosta da instituição. Como aqui tenho repetidamente afirmado, penso que uma instituição deste tipo, que tem por missão o controlo do cumprimento das leis, fazia falta há muito no país e acho que é fundamental em qualquer Estado de direito.
Ainda que, aqui e ali, a ASAE possa ter cometido alguns exageros que, esperamos, venham a ser ultrapassados no futuro.


As afirmações de Mendes Bota são populistas e demagógicas e em nada ajudam o bom funcionamento das instituições do Estado.

Foi exactamente isso que sentiram algumas figuras de destaque do PSD presentes no jantar, que mostraram alguns sinais de desconforto mas que se recusaram a fazer comentarários publicamente, embora considerassem estas afirmações como “falta de sentido de Estado”.


Mendes Bota, o político que também é ou foi cantor, desta vez meteu os pés pelas mãos e acabou por desafinar.


sexta-feira, janeiro 25, 2008

Os autores, as obras e os respectivos títulos

Alguns dos livros que são lançados a toda a hora no mercado têm títulos demasiado sugestivos, digamos assim, o que leva a que muitos leitores os comprem na legítima esperança que esses mesmos títulos tenham alguma sequência visível no desenrolar da obra.

E isto passa-se com muitos autores, quer desconhecidos quer aqueles com obra já devidamente reconhecida.


Lembro-me, por exemplo, do romance que Miguel Esteves Cardoso publicou (o primeiro, se não estou em erro) ainda não há muitos anos, cujo título - “O Amor é Fodido” – andou esparramado pelas montras de todas as livrarias do país e que foi altamente contestado por muitos portugueses, por indecoroso.

De facto, num país onde existe liberdade de expressão e pese embora se possa equacionar a hipótese – por uma questão que tem a ver com o gosto de cada um – do título poder ser diferente, julgo que só a hipocrisia de alguns pôde suscitar tal movimento, muito embora eu pense que a vontade do autor era precisamente a de chocar as pessoas. E com isso vendeu até fartar.


Também o consagrado escritor Gabriel Garcia Márquez publicou, ainda não há muito, “Memória das Minhas Putas Tristes”, livro de que já falei neste espaço, um livro que eu gostei muito mas cujo título provocou alguma celeuma. Nada mais do que isso, pelo menos em Portugal.

Contudo no Irão, o respectivo governo proibiu a segunda edição da tradução persa e mandou que o título fosse alterado para “Memória das Minhas Apaixonadas Melancólicas”, após o que as primeiras cinco mil cópias foram colocadas à venda. Ainda assim, os ultraconservadores iranianos pressionaram o Ministro da Cultura para proibir a venda da novela, tendo por argumento (forte, único e definitivo) que o livro incita à prática da prostituição. Curiosa esta interpretação, mesmo imaginando que tenha havido motivações religiosas por detrás.

Mas, como sempre acontece, quando o fruto é proibido, o desejo aumenta e, assim, o interesse pela obra levou a que ela fosse vendida no mercado negro por mais do dobro do preço.

Caso para se dizer que “o feitiço se virou contra o feiticeiro”!







quarta-feira, janeiro 23, 2008

Rosa Lobato de Faria


Nasceu em Lisboa, em 1932. Poetisa, romancista, argumentista, cronista e actriz de teatro, cinema e televisão, é igualmente autora de letras de canções e fados. Começou a escrever poesia aos seis anos de idade. Letras de sua autoria foram premiadas, por quatro vezes, em festivais da canção.Tem crónicas e contos dispersos por vários órgãos de comunicação social.



De Rosa Lobato de Faria “E de novo a armadilha dos abraços”




E de novo a armadilha dos abraços.

E de novo o enredo das delícias.

O rouco da garganta, os pés descalços

a pele alucinada de carícias.

As preces, os segredos, as risadas

no altar esplendoroso das ofertas.

De novo beijo a beijo as madrugadas

de novo seio a seio as descobertas.

Alcandorada no teu corpo imenso

teço um colar de gritos e silêncios

a ecoar no som dos precipícios.

E tudo o que me dás eu te devolvo.

E fazemos de novo, sempre novo

o amor total dos deuses e dos bichos.


A verdadeira identidade de Mona Lisa





Depois de alguns séculos em que a maioria dos cidadãos deste planeta desesperava perante todo o mistério que o sorriso enigmático da Mona Lisa deixava transparecer, sem conseguir ao menos saber quem é que realmente servira de modelo a Leonardo da Vinci, eis que uns brilhantes cientistas da universidade alemã de Heidelberg anunciaram – bombasticamente, de resto - que tinham descoberto de uma vez por todas a identidade daquela que desde mil quinhentos e poucos constituiu um dos maiores mistérios da História da Arte.

De facto, nas últimas semanas, todo o mundo ficou mais descansado.


Durante anos e anos especulou-se sobre a identidade do modelo de Da Vinci. Disse-se que a mulher poderia ter sido sua amante, que seria talvez a sua própria mãe e houve até quem alvitrasse (provavelmente por má fé) que se poderia tratar do auto-retrato do pintor italiano.


Afinal, a figura da mulher mais misteriosa do mundo, cuja expressão introspectiva, tímida e sedutora era, pasmem-se, uma aristocrata de Florença Lisa Gherardini, mulher do comerciante têxtil Francesco del Giocondo.


Daí que a Mona Lisa seja também conhecida por “La Gioconda” ou, ainda, “Mona Lisa del Gioconda”.


Esclarecidas as dúvidas sobre a verdadeira identidade da Mona Lisa e acalmados os ânimos de todos aqueles que desesperavam perante tanto e tão demorado desvendar do mistério, fiquei eu a braços com as minhas recordações que envolvem, naturalmente, a distinta e fidalga esposa de Francesco del Giocondo.


A primeira recordação tem a ver com a oportunidade que tive, já lá vão longos anos, de contemplar ao vivo, frente a frente, o quadro exposto no Museu do Louvre em Paris. Ali estava ela a Mona Lisa, diante de mim com o seu sorriso restrito, mostrando timidamente os dentes, como que a tentar seduzir-me.


A segunda recordação leva-me até aos idos anos setenta do século passado e a uma empregada que trabalhou lá em casa durante bastante tempo, a Senhora Ana. E lembro-me, sobretudo, porque ela tinha um medo horrível só de olhar, ainda que de soslaio e apressadamente, para uma reprodução da Mona Lisa que eu comprara precisamente no Louvre e que compunha uma das paredes da sala. Um medo que nem eu nem ela própria conseguimos alguma vez perceber.


terça-feira, janeiro 22, 2008

Miguel, Miguel!


Miguel Beleza e Miguel Cadilhe têm várias coisas em comum. Desde logo o nome – Miguel. Mas ambos são também políticos, economistas e do Partido Social Democrata. Mas há mais, os dois foram Ministros das Finanças de Governos de Cavaco Silva.

Como se vê, coincidências são muitas mas ...

Mas ... Miguel Beleza tem uma impressão (profissional, digamos) muito pouco abonatória sobre o seu camarada de partido e nem sequer se coibiu de a expressar em público quando comentou a recente vitória de Santos Ferreira para a presidência do BCP.

Disse ele:

“Foi uma excelente lição para Cadilhe, que sabe tanto de economia como eu de costura”.


Beleza lá saberá porque é que pensa assim. Faço notar, contudo, que ao contrário do que possa parecer à primeira vista, talvez ele não estivesse sequer a injuriar Cadilhe, mas quiçá pretendesse que a sua frase fosse entendida como elogiosa, porque ele, Beleza, pode até ser um perito em costura. Quem sabe ...


O que me espanta, no entanto, é como é que Miguel Cadilhe, apesar de ter sofrido uma pesada derrota, se apresentou perante a comunicação social como vencedor daquela eleição quando, na verdade, obteve apenas 2,14% dos votos dos accionistas presentes na Assembleia Geral.

É que, para mim, que sou racional que me farto, ganhar é meter mais golos que o adversário, é ter mais votos que o opositor. E não me contento apenas com vitórias morais.

domingo, janeiro 20, 2008

O direito à indignação




Acredito que muita gente terá ficado deveras chocada, quando veio a público que o ex-presidente da Comissão Executiva (CEO) do Banco Comercial Português (BCP), Paulo Teixeira Pinto, saiu há cinco meses do grupo com uma indemnização de 10 milhões de euros e com o compromisso de receber até final de vida uma pensão anual equivalente a 500 mil euros, ou seja, qualquer coisa como trinta e cinco mil euros por mês, catorze meses por ano.

Eu sei que o dinheiro não é tudo mas quando, neste início de ano, tanto se tem falado nas reformas dos pensionistas (das reformas extremamente baixas da esmagadora maioria dos pensionistas deste país), não posso deixar de ficar indignado com esta brutal discrepância entre as reformas de uns quantos privilegiados e as dos outros, a tal repugnante assimetria que eu tantas vezes aqui tenho condenado.


Claro está que não podemos comparar o incomparável. Mas a verdade é que enquanto que qualquer profissional reformado pode ir trabalhar se quiser e ... se arranjar emprego, o que eu duvido, Paulo Teixeira Pinto ao renunciar ao lugar, que ocupava há mais de dois anos, assinou um compromisso que o impede de voltar a exercer funções em instituições bancárias ... a troco de uma indemnização de 10 milhões de euros. Ainda que tenha constado nestes últimos tempos que ele já arranjou ocupação na administração de duas entidades não bancárias.

Dirão alguns, lá está ele a falar outra vez no dinheiro que os outros ganham ou, que se o homem ganhou este belo euromilhões é porque merece mesmo toda aquela fortuna ou, ainda, que são descabidas as comparações entre as reformas dos vários trabalhadores. Talvez sim ...

Porém, mesmo correndo o risco de desagradar a quem me leia e recordando para os que andam mais distraídos que o salário do Presidente da República em exercício anda pelos 7260,00 euros, ainda assim, afirmo que não calarei a minha voz perante tão provocatória discriminação salarial entre trabalhadores (reformados ou não) deste país, ainda que Teixeira Pinto até pudesse ser considerado o maior dos gestores portugueses.

E não me calo porque, como dizia Mário Soares e recordava esta semana o jornalista Fernando Madrinha, “todos temos o direito à indignação”!




quinta-feira, janeiro 17, 2008

O amor pelo próximo foi mais forte


Jesús Manuel Córdova, de 26 anos, um mexicano entrado ilegalmente nos Estados Unidos, andava há já dois dias a ziguezaguear pelo deserto do Arizona rumo a uma vida melhor quando avistou um miúdo de pernas ensanguentadas que seguia completamente desorientado e aos tombos.

O mexicano, pai de quatro filhos, vendo a aflição da criança, correu a socorrê-la, embora não falasse uma palavra de inglês.

Muitas horas depois foram encontrados. O pequeno Christoper, de 9 anos, foi recolhido por uma ambulância enquanto que Jesús Córdova, ilegal e indocumentado, foi detido por uma patrulha fronteiriça e recambiado para o seu país.

A vida é muitas vezes injusta e, neste caso, não quis recompensar quem demonstrou tanto amor pelo próximo. Jesús salvou a vida de uma criança e foi deportado.

quarta-feira, janeiro 16, 2008

Uma atitude incomum


Através da comunicação social soube-se que na recente época natalícia os vereadores da Câmara de Lisboa, Helena Roseta e Manuel João Ramos, devolveram duas “caixas com vinhos e patés” que a administração da EMEL – Empresa Pública Municipal de Estacionamento de Lisboa lhes enviou, por acharem ridículo que uma empresa com graves problemas financeiros efectue esse tipo de gastos.

Diga-se, de resto, que a EMEL apesar das aludidas dificuldades financeiras, admitiu ter oferecido “minicabazes de Natal” a todos os vereadores da Câmara e a alguns directores municipais”.

A minha chapelada para os dois vereadores, pela enorme manifestação de integridade e de ética.

Saúde pública ou polícia de costumes?


Embora não o conheça pessoalmente, sempre tive grande simpatia por Francisco José Viegas, que descobri no programa “Falatório” que era então transmitido pela televisão. Talvez pela elegância como conversa como os seus convidados e pela forma como os sabe ouvir. Mais tarde comecei a ler os seus escritos publicados em vários jornais e a ouvir as suas crónicas na TSF e na Antena 1, e a acompanhar o seu percurso jornalístico.

Mas Francisco José Viegas é, sobretudo, um escritor versátil que já publicou obras de divulgação, de poesia, romances, contos, teatro e relatos de viagens.


Dado que ontem falámos sobre a ASAE, achei que vinha a propósito um texto que ele escreveu para o Jornal de Notícias e que, de algum modo, tem a ver com as nossas liberdades e as proibições que nos querem impor. E muito embora não esteja inteiramente de acordo com o que Francisco José Viegas disse nesta crónica, apesar disso, acho que é um texto imaginativo e de bom recorte literário, razões pelas quais não resisto a transcrever parte dele, com a vénia que é devida ao Autor:


"A saúde pública é um domínio vasto que frequentemente entra nos caminhos da moral e dos costumes. Os queijos com alto teor de gordura serão perseguidos, da Serra da Estrela a São Jorge e ao Pico. Um dia haverá fiscais vigiando o teor de sal no bacalhau. As casas de família irão, com o tempo, transformar-se em antros de pecado - aí podemos comer pastéis de massa tenra, pataniscas, "bacalao al pil pil" ou à lagareiro, feijoadas e compotas preparadas com açúcar em vez de adoçante (havendo até quem fume um charuto no final, mais perigoso do que uma "erva" simplória, muito bem admitida socialmente). Um dia, mais tarde, os inspectores de saúde pública entrarão em nossa casa e desaprovarão as migas de bacalhau ou o feijão no forno. Na escola, os institutos da saúde perguntarão subtilmente às crianças se os pais têm por hábito comer fritos e barrar o pão com manteiga, essa substância perigosa. Justificarão. Justificarão sempre. Querem o nosso bem. Nunca sei o que é melhor, se a liberdade, se o comando da nossa saúde por políticos que elegemos com outras finalidades".





segunda-feira, janeiro 14, 2008

Malhar em ferro frio


Embora muita gente a conheça, não é frequente ouvir-se nos tempos que correm a expressão “malhar em ferro frio”. Como se sabe ela significa “perder tempo” ou “não conseguir o resultado desejado”.

E ela ocorreu-me por causa das contínuas notícias sobre a ASAE. Porquê, perguntarão? Porque bem podem criticar e dizer o que de pior lhes ocorra sobre ela que isso não vai alterar em nada o seu modo de actuar, que é o de fiscalizar dentro do seu âmbito restrito de actuação.

Desde a proibição da venda das bolas de berlim, desde ser a causadora do suicídio do agricultor algarvio que produzia aguardente de medronho e que teve de interromper a sua produção por alegada falta de higiene à recente acusação que a ASAE está a entupir os tribunais com milhares de processos-crime, de tudo se tem ouvido para denegrir e desmoralizar a sua acção.

E para quem jurava a pés juntos que os miseráveis dos inspectores só actuavam para prejudicar os mais pobres, os snacks bares duvidosos e os desgraçados dos feirantes que vendiam DVD’s acabados de editar a 5 euros e dos ciganos que “trocavam” roupas de marca (contrafeitas, claro está) por meia dúzia de “aérios”, para esses mal-intencionados, a acção levado a cabo pela ASAE em grandes casas de luxo como a Cartier, a Hermès e a Louis Vuitton deve ter-lhes calado momentaneamente as vozes.

Se mo permitem (e não têm qualquer alternativa se não fazê-lo) quero tecer um pequeno aparte à intervenção nestas três casas de grandes marcas que, naturalmente, não são nada acessíveis ao comum dos mortais. É que, segundo uma lei de 1979, as lojas não podem vender produtos que não constem no respectivo alvará. O que quer dizer que a Louis Vuitton, por exemplo, tem todo o direito de vender bolsas e malas e tudo o mais que o tal alvará contemple, mas não pode vender caixas de fósforo nem saquinhos de pevides.

Dito isto, sublinho que estas empresas (que vendem produtos de luxo, não é demais insistir) e os seus departamentos jurídicos foram apanhados de surpresa porque desconheciam que neste país (logo neste pequeno país) há uma lei que impõe algumas restrições aos produtos que são vendidos nessas lojas. Pois o pequeno aparte que queria fazer diz respeito aos comentários/queixas feitos quer pela directora da Cartier, “Nem os nossos advogados sabiam que tínhamos essas limitações”, quer pela directora da Hermès “Parece uma perseguição às grandes marcas”.

Bem que essas senhoras têm alguma razão naquilo que dizem. Mesmo num mundo globalizado, ou até talvez por isso mesmo, quem tem por missão fazer leis, tem que saber que as mesmas nem sempre se aplicam a todos. Que é como quem diz, as ASAE’s desse mundo têm a obrigação de fiscalizar os tais feirantes e os restaurantes manhosos mas não as casas de comércio que têm um certo estatuto e que não deveriam estar abrangidas por regras tão mesquinhas.


Feito o desabafo e voltando de novo ao papel da ASAE, o que, na verdade, me preocupa é saber o que é que os cidadãos realmente querem? Será que gostariam, porventura, que continuasse a enorme imundície que era um apanágio de muitos restaurantes deste país e/ou que se fechasse os olhos ao comércio paralelo e ilegal que não paga os impostos que são devidos?


Não faço parte da organização nem conheço ninguém que trabalhe na ASAE. Acredito, porém, que uma autoridade deste tipo é essencial num estado de direito e que, no caso de Portugal, há muito fazia falta porque, na generalidade, as leis existem mas, toda a gente o sabe, ninguém as cumpre porque, na maioria dos casos, as autoridades não actuam. A realidade é esta, sem um polícia a olhar para nós permanentemente, se tivermos a ocasião, contornamos a lei e ponto!


Mesmo sendo, como se percebe, a favor da ASAE, acho que a organização para seu próprio bem, para que o respeito da população se reveja num lema como “faz o que te digo mas também o que eu faço” deveria levar em consideração o seguinte:

1 – O Presidente António Nunes deve pagar a coima correspondente à infracção de ter fumado num local não permitido; e

2 – Os extintores que enfeitam as paredes das instalações da ASAE, todos fora de prazo de utilização, devem ser recarregados de imediato.


São duas pequenas coisas mas, julgo eu, iriam ter um reflexo positivo na imagem da corporação e dariam maior força a uma autoridade de controlo que necessita de tudo menos que o povo lhe recorde aquele velho ditado “Em casa de ferreiro, espeto de pau”.

Ao que isto chegou ...


Eu sei que toda esta contestação dos fumadores à lei antitabaco se irá desvanecer daqui a uns meses, é só uma questão de tempo. Eles também barafustaram quando os proibiram de fumar nos transportes públicos e nos recintos desportivos fechados. Proferiram ameaças aterradoras quando lhes foi negada a possibilidade de fumarem nos aviões e sobretudo nos de longo curso e, afinal, acabaram por se habituar e hoje já ninguém fala disso.

De qualquer forma, todo este ruído que se faz sentir e os argumentos que são aduzidos parecem-me um pouco excessivos e, muitos deles, são manifestamente canhestros, ainda por cima vindo de quem vêm.

Por exemplo aquele que foi incluído na última crónica de Miguel Sousa Tavares no Expresso do passado sábado.

Dizia ele que um grupo de escolas minhotas tinha promovido um curso para os seus alunos, para que estes tentassem sensibilizar os pais a não fumar em casa. Como objectivo final, os pais – finalmente convertidos – teriam que assinar solenemente um certificado em que se comprometiam a não fumar em suas casas.

E, Sousa Tavares, chegou ao auge da sua indignação quando escreveu:

“Leiam bem, as escolas ensinam os filhos a darem ordens aos pais em casa. Para já, é a de não fumar. Que outra se seguirão?”

Realmente, a que ponto chegámos? Então agora até as escolas já fomentam a inversão de valores, fazendo com que os filhos dêem ordens aos pais quando, por natureza e tradição, deveria ser precisamente o contrário? Ao que isto chegou!



Mas, pensando bem, nada disto é novo. Eu próprio já sofri na pele este tipo de violência quando, há uns anos, os meus filhos me obrigaram a ter um cuidado especial com o lixo doméstico e me impuseram, em nome de uma tal reciclagem, a separar os vidros, os papéis, as pilhas e as embalagens dos restantes detritos. A separar e a depositar correctamente cada um deles nos diversos recipientes do ecoponto.

Na altura foi um choque enorme. Então os meus filhos já me davam ordens na minha própria casa? Recordo que nessa altura pensei exactamente como o Miguel Sousa Tavares. A partir daquele momento, o que é que se seguiria?

Vá lá, apesar de tudo, não fui obrigado a assinar qualquer certificado ...

quinta-feira, janeiro 10, 2008

Status Quo


Quando na terça-feira última, no texto a que chamei “Entusiasmos ...” falei em “status quo”, lembrei-me de ter lido algures uma “ferroada” magistral dirigida por Eça de Queiroz aos políticos da época.

A tirada que versava exactamente o "status quo" vigente nesse período, foi publicada nas “Farpas” em Agosto de 1871 e rezava assim:

“A luta partidária o que é?
Nenhum partido se distingue dos outros pelas ideias que professa.As ideias são sempre as mesmas – poucas, pequenas, mas idênticas.Os partidos têm para as ideias de seus gastos um mealheiro comum sebento de velhice, de economia e de miséria.O que estabelece as distinções, o que assinala as diferenças,o que suscita os combates, e o que resolve as vitórias, é a intriga.”



Eu não diria melhor ...


Falta de comunicação?


Quando li a notícia custou-me a acreditar, pior, fiquei extremamente chocado. E penso que não era para menos ao saber que o Secretário de Estado e da Segurança Social, Pedro Marques, anunciou à nação que os novos aumentos das pensões de reforma, a vigorar desde Dezembro passado (portanto, os aumentos do próprio mês de Dezembro e do Subsídio da Natal), só seriam pagos em 2008 mas não, como seria natural e lógico, logo em Janeiro deste ano e de uma só vez.

Não, o brilhante membro do governo revelou que esses retroactivos seriam pagos sim mas de uma forma faseada e num período de 14 meses.

Claro que de imediato se levantaram as vozes de todos os quadrantes políticos da oposição, dos sindicatos, de toda a gente que tem um mínimo de bom senso e, particularmente, das vozes dos próprios reformados e pensionistas que mais sentiram na pele uma tão grande injustiça.

De tão estupefacto que fiquei, confesso que cheguei a pensar se o governo, face aos aumentos tão substanciais que concedeu e que rondam em muitíssimos casos os 50 cêntimos por dia, teria porventura imaginado que alguns desses pensionistas pudessem entretanto falecer durante os 14 meses, poupando desta forma algum dinheiro ao Estado.

Mas, na verdade, só uma mente distorcida como a minha poderia ter alguma vez imaginado tamanho cenário macabro e acreditado que o governo teria perdido a vergonha por completo. Portanto, achei que teria que haver uma outra explicação.

E havia realmente. Um dia depois do polémico anúncio, o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva, anunciou na Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social, na Assembleia da República, que o aumento extraordinário das pensões será pago de uma vez só, no próximo processamento de Janeiro, contrariando assim a posição assumida terça-feira pelo seu secretário de Estado.

Face a tamanha discrepância, calculo que muito maior do que qualquer divergência dos governantes quanto à interpretação da lei, não posso deixar de questionar:

- Terá havido falta de comunicação entre o Ministro e o seu Secretário de Estado? ou

- O Governo deu o dito pelo não dito e, como tem acontecido em algumas situações ultimamente, recuou na intenção inicial? Ou, ainda,

- É desta que o ilustre secretário de Estado vai ser, finalmente, substituído?

Responda quem souber.

terça-feira, janeiro 08, 2008

Entusiasmos ...


Quando em 17 de Dezembro do passado ano aqui escrevi um texto a que chamei “O sucesso da Presidência Portuguesa da União Europeia”, o nosso amigo Zeboma, que reside actualmente no Canadá, enviou-me um mail em que fazia o seguinte comentário:

“Pareceu-me entusiasmado com o PS no poder ... mas entretanto a mim desaponta-me muito sobretudo no estilo.. o que acha? E o PM, o chefe dos "putos", pode ser uma "fera" determinada, mas sempre o achei bastante vácuo na substância de discurso, já de há muitos anos. O que acha?”


Pois bem, meu amigo, respondo-lhe com todo o gosto.

Não retiro uma palavra ao que então escrevi. Continuo a considerar que a Presidência Portuguesa foi de facto um sucesso, porque todos os objectivos projectados foram inteiramente cumpridos e, note-se, eles eram bem ambiciosos e de difícil concretização.

Basta referir o acordo entre os 27 do Tratado Reformador, agora conhecido pelo Tratado de Lisboa e as cimeiras entre a União Europeia e África, com o Brasil, a China e a Índia.

Convenhamos que, independentemente dos resultados que poderão daí avir e do trabalho empenhado que a anterior presidência alemã nos prestou, a organização portuguesa foi impecável. Portugal, a sua diplomacia, o seu governo e o primeiro-ministro Sócrates demonstraram merecer sem qualquer dúvida o respeito e a admiração dos nossos parceiros.

A Presidência correu bem a Portugal e a José Sócrates. Daí o meu entusiasmo.

Mas, não nos deixemos inebriar. Sócrates é apenas um homem, o seu momento e a sua circunstância. Agora que 2008 despontou e que já ficam mais distantes os holofotes da Europa que tanto o fizeram brilhar, chegou a hora de Sócrates olhar para uma outra realidade, a interna, a que tem que enfrentar a pobreza, o desemprego, as relações com os sindicatos, os (muitos) problemas em aberto na justiça, na saúde, na educação, na cultura, no ambiente e em tantos outros domínios.

E aqui, meus amigos, não notarão em mim tanto entusiasmo.

As assimetrias sociais estão a aumentar, os portugueses perderam 25% do poder de compra nos últimos anos e já nos encontramos atrás da República Checa, de Chipre, talvez até abaixo da Letónia, da Roménia e da Bulgária. Somos um país de pobres. Entre os dez milhões de portugueses haverá, quanto muito, uns dez mil que vivem muito bem, os tais que compram carros e casas de luxo, enquanto os restantes continuam a viver muito mal, cada vez pior. A classe média está a desaparecer e não tarda que sejamos uma sociedade onde existam apenas a classe dominante, a rica, e a outra, a muito pobre.

E quem vai conseguir mudar este estado de coisas, quem vai implementar políticas que, finalmente, consigam fazer aproximarmo-nos dos nossos parceiros europeus, nos devolvam a auto-estima e a dignidade?

A oposição? Mas onde é que ela está?

O PS? Também não creio. Hoje o Partido Socialista é José Sócrates, apenas ele. Não existe oposição interna, não existe uma massa crítica que discuta as opções do governo. Nem mesmo Manuel Alegre, que de quando em vez se faz ouvir, consegue abanar o partido, mesmo que suavemente.

E assim o PS, sem ideologia, sem ideias e sem vontade de alterar o status quo, já não constitui o partido que nos dê uma perspectiva de mudança. Como se vai combater a corrupção e a pobreza, como se vão travar as desigualdades cada vez mais gritantes, qual vai ser o modelo de desenvolvimento do país.

Claro que o PS tem feito algumas coisas, tem levado a cabo ou estão em curso algumas reformas estruturais, mas o tempo para isso acabou porque está à vista um novo ciclo eleitoral. E nós sabemos o que isso significa.

Caro Zeboma, meus amigos. Este vai ser um ano muito difícil. Como deu para perceber é escasso o meu entusiasmo. Por isso, e dentro de uma lógica o mais optimista possível, direi que as minhas expectativas para 2008 são de “desânimo esperançoso”. Dá para perceber?

segunda-feira, janeiro 07, 2008

"Case, pela sua saúde"

Achei deveras curioso que a Exponoivos deste ano tivesse escolhido como lema da sua exposição “Case, pela sua saúde”. Segundo os promotores desta ideia, existem estudos que comprovam que o casamento faz bem à saúde e contribui para a resolução de problemas depressivos e para a prevenção de doenças cardíacas e vírus da gripe.

Não conheço a origem desses estudos nem sei se eles são minimamente credíveis, mas, para mim, a frase não passa de um mero slogan para atrair a atenção dos eventuais visitantes. Aliás, um pouco na senda da publicidade a bruxos, curandeiros e “astrólogos” africanos que se propõem curar os “pacientes” do mau olhado, das invejas, dos desamores, das crises financeiras e todos os males que poderão atacar o comum dos mortais.

Mas mesmo não recorrendo a tais sábios e diversificados “curadores de maleitas”, teríamos sempre a possibilidade de nos socorrer do tradicional chá de “Hipericão do Gerês” que para além de fazer muito bem aos males de fígado, são também aconselhados para a hipertensão, pele, calos e, de um modo geral, para todo o tipo de aflições.

Enfim, temos à mão várias hipóteses de alcançar o bem-estar perfeito, para além, é claro, do casamento.

Gostaria, contudo, e por causa das dúvidas, que me explicassem como é que o casamento consegue prevenir o vírus da gripe. Tem que haver uma explicação ...

domingo, janeiro 06, 2008

Deixei de fumar


O primeiro dia de cada ano costuma ser uma excelente data (como muitas outras, de resto) para se dar início a uma actividade ou para pôr termo a qualquer coisa que há muito pretendíamos fazer mas que, por falta de vontade ou de oportunidade, ainda não tínhamos conseguido.

Na verdade, 1 de Janeiro de 2008 constitui uma data marcante para mim. Por duas razões.

A primeira é que depois de uma relutância assumida de vários anos, resolvi inscrever-me num ginásio onde o exercício físico me ajudará a ter mais e melhor saúde. Espero!

A segunda razão tem a ver com o facto de, finalmente, ter deixado de fumar. Não que me faltasse a
força de vontade para o fazer, nada disso. Aliás, eu até nem nunca fumei. Pelo menos de uma forma activa, muito embora tivesse durante muitos anos fumado dos cigarros dos outros. Isto porque nunca tive a força ou a persuasão suficiente para convencer amigos, colegas e desconhecidos a deixarem de fumar nos mesmos espaços que eu frequentava, quer os de lazer quer os de trabalho.

E sempre que tentava demovê-los de acender os cigarros – quase sempre em tom conciliatório, “às boas”, como se costuma dizer – acabava por ouvir “bocas” do tipo

“olha, se não estás bem, muda-te”, ou

“és um felizardo, estás a fumar e ainda por cima de borla”.

Anos, foram anos que, de uma forma passiva, fui fumando centenas, milhares de cigarros, cigarrilhas, cachimbadas e charutos.

Sem o desejar e com o desprazer de quem se sente mal perante o fumo incómodo, sempre tive a consciência que toda aquela nicotina e as demais substâncias nocivas constituíam um grave risco para a minha saúde.

E a liberdade que tantos fumadores apregoavam como sendo unicamente sua e o direito de se matarem entre as nuvens de fumo, espezinharam sempre, sem qualquer consideração, a minha vontade de não querer pertencer ao grupo das chaminés fumegantes e impediram-me de poder exercer a minha liberdade de escolha. A de não querer fumar, mesmo sendo de borla.

Agora que o tormento acabou, por força da lei antitabágica que entrou em vigor no primeiro dia do ano, não posso deixar de sorrir perante todo o tipo de argumentos aduzidos pelos fumadores. Do género:

“que as liberdades pessoais e o livre direito de escolha estão a ser desrespeitados pelo governo e por uns quantos não fumadores" que, por acaso, até são a esmagadora maioria;

“que vivemos numa ditadura mascarada de democracia, onde as pessoas vêem restringidas as suas vontades”.

Ou, ainda, opiniões fundamentalistas como a de Miguel Sousa Tavares que no Expresso desta semana dizia: “Só alguém com sérios problemas mentais poderia ter feito esta lei antitabaco. E só uma Assembleia de deputados incompetentes e sem coragem nem vontade própria a poderia ter aprovado. É uma lei à medida de um país de polícias e de eunucos”.

Liberdade? Ditadura? Lei elaborada por débeis mentais? Mas será que os fumadores que consideram a nova lei como “fascisoide”, só agora falam em falta de liberdade quando antes nunca pensaram naqueles que eram obrigados a partilhar o seu vício de fumar, contra vontade e com prejuízo da sua própria saúde? Onde é que, então, ficava a liberdade de quem não queria fumar?

Provavelmente esqueceram-se que durante anos a fio lançaram miríades de baforadas de fumo sobre os desgraçados que trabalhavam a seu lado, que ocupavam a mesa mais próxima no restaurante ou sobre aqueles que, na pastelaria, apenas tentavam tomar o pequeno almoço tranquilamente.

A partir de agora, existe uma lei equilibrada e que estabelece regras que defendem os direitos de fumadores e não fumadores.

Repito, a lei respeita os direitos de fumadores e não fumadores, uma vez que dá liberdade a quem queira continuar a fumar de o fazer mas ... em sítios que não prejudiquem a saúde dos que não querem fumar.

Pena é que o bom-senso e o respeito que há muito se exigia, só se verifique agora porque uma lei a isso obriga.

1 de Janeiro de 2008. Deixei de fumar!




sexta-feira, janeiro 04, 2008

Quilos a mais não matam?


Agora que se aproximam do fim os festejos da época natalícia, período reconhecidamente propício aos exageros gastronómicos e consequente aumento de peso, é tempo de pensarmos em voltar a ter uma alimentação mais equilibrada e a retomarmos (ou iniciarmos) a prática de algum exercício físico.

O intuito será, como se compreende, o de conseguirmos mais e melhor saúde e não só o de manter ou recuperar através da perda de uns quantos quilitos a mais, o corpinho lindo e maravilhoso que pretendemos exibir daqui a uns meses quando começarmos a frequentar as praias. Aliás, diga-se de passagem, que uns quilos a mais pode até ser benéfico.

É que, segundo um estudo publicado pelo “Journal of the American Medical Association (JAMA)”, o excesso de peso não está associado a um aumento da mortalidade. Quem tenha um excesso de peso moderado poderá até morrer menos de alguns cancros, do que as pessoas com peso normal.

O estudo conclui que, afinal, nos cancros não relacionados com a obesidade (pulmões, pele ou linfomas), nas doenças respiratórias, em situação de ferimentos e infecções em geral, as pessoas com excesso de peso (mas sem serem obesas) até parecem estar mais protegidas do que as têm um peso normal.

Para as doenças cardíacas, o estudo não encontrou diferenças estatísticas entre as pessoas com peso excessivo e normal. Ainda segundo os cientistas, ter uns quilos a mais nem sequer aumenta muito o risco dos cancros relacionados com a própria dieta, nos quais se incluem o cancro do cólon, mama, útero, pâncreas, esófago ou rins.

Perante estes resultados, a equipa diz que é provável que estes resultados se devam à presença de maiores reservas nutricionais ou de massa magra que acompanham o excesso de peso.



Um outro estudo realizado na Suécia concluiu que a obesidade dificulta o aparecimento do cancro da próstata. No entanto, caso a doença já se tenha manifestado, os homens obesos têm maior dificuldade em combatê-lo e a hipótese de morte aumenta.


Mas, atenção, é bom termos consciência que a obesidade não é sinal de boa saúde. Os obesos morrem mais de doenças cardiovasculares, renais, de diabetes e vários tipos de cancro associados à obesidade.


Por isso, meus amigos, por mais uns dias atirem-se às filhós, aos sonhos e às demais iguarias próprias da quadra que atravessamos. Comam e bebam à vontade, mas ... com moderação.
Depois ...

quarta-feira, janeiro 02, 2008

Ai, ai, ai, ai!


Tencionava regressar apenas na próxima semana, mas não consegui resistir à fotografia de primeira página do Diário de Notícias.

Então não é que o Presidente da ASAE foi apanhado em plena festa de passagem de ano no Casino do Estoril, a fumar uma cigarrilha já depois da meia-noite, isto é, já depois de ter entrado em vigor a nova lei sobre o tabaco.

António Nunes bem pode agora justificar-se e considerar que a nova lei não proíbe as pessoas de fumarem em casinos e nas salas de jogo. Pode ser que tenha razão. Mas a verdade é que o lugar onde o todo-poderoso da ASAE se encontrava não era apenas um casino. Era também um restaurante, um recinto público fechado e um lugar de trabalho. E nestes lugares, segundo a lei em vigor a partir do primeiro minuto deste ano, é expressamente proibido fumar.

Valha a condescendência da nova lei ter entrado em vigor em pleno reveillon.

Contudo, o que achei interessante nesta história é que o azar de António Nunes acabou por ser a sorte do fotógrafo que tirou este magnífico instantâneo. Sem dúvida uma bela e oportuna fotografia neste início de 2008.