Como não sou perfeito, cá estou eu, outra vez, a falar de futebol e da fase final do Mundial que se está a realizar na Alemanha. Todo o país está ao rubro no apoio à nossa selecção e os emigrantes, não só os da Alemanha como os da Europa central como, de resto, os de todo o mundo, vivem uma verdadeira festa em redor da equipa de todos nós. E com todas as razões para isso, diga-se, uma vez que as vitórias nos têm sorrido e já estamos apurados para os oitavos de final.
Foi talvez por pensar nos emigrantes que me lembrei do António, um homem emigrado desde a década de setenta nos arredores de Paris. O António, como tantos outros nossos compatriotas emigrados, apesar de viverem há tantos anos no estrangeiro, continuam a manter toda a alma e os costumes lusitanos que, com o passar dos anos, vai fortalecendo cada vez mais, como se isso fosse possível.
Em casa, a Felismina (a Quina, como é conhecida) continua a cozinhar à portuguesa. Os pastéis de bacalhau, o cozido e a sardinha assada marcam presença assídua à mesa, onde não falta também o bom vinho português, alentejano claro, da região de onde o António partiu, a salto, um dia e onde um dia tem esperança de voltar para sempre.
E, por sentir no António tão vivas as suas raízes, não estranhei que ele, numa das últimas conversas que tivemos, desabafasse, com alguma mágoa, que gostaria de ter e de usar mais produtos da nossa terra.
Dizia-me ele com graça que, depois de dormir numa almofada de algodão (feita no Egipto), começou o dia bem cedo, acordado pelo despertador (feito no Japão) às 7 da manhã. Depois de um banho com sabonete (feito em França) e enquanto o café (importado da Colômbia) estava a fazer na máquina (feita na República Checa), barbeou-se com a máquina eléctrica (feita na China). Vestiu uma camisa (feita no Siri Lanka) e jeans de marca (feitos em Singapura) e colocou um relógio de bolso (feito na Suiça). Depois de preparar as torradas de trigo (produzido nos Estados Unidos) na torradeira (feita na Alemanha) e enquanto tomava o café numa chávena (feita em Espanha), pegou na máquina de calcular (feita na Coreia) para ver quanto é que poderia gastar nesse dia e consultou a Internet no seu computador (feito na Tailândia) para ver as previsões meteorológicas. Depois de ouvir as notícias pela rádio (fabricado na Índia), ainda bebeu um sumo de laranja (produzido em Israel), entrou no carro (fabricado na Suécia) e continuou à procura de emprego para o filho, se possível, em Portugal. Ao fim de mais um dia frustrante, com muitos contactos feitos através do seu telemóvel (feito na Finlândia) e, após comer uma piza (fabricada em Itália), o António decidiu relaxar por uns instantes. Calçou as sandálias (feitas no Brasil), sentou-se num sofá (feito na Dinamarca), ligou a TV (feita na Indonésia) e pôs-se a pensar porque é que não conseguia encontrar um emprego para o filho lá em PORTUGAL...
Convenhamos que para um patriota, a coisa não está fácil…
1 comentário:
Mas também convenhamos que o que quer que o "nosso" António produza terá uma etiqueta a dizer "Made in France", verdade????
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