Na Quarta-Feira, dia 31 de Outubro, comemorou-se o dia mundial da poupança.
Para os portugueses, para a esmagadora maioria dos nossos concidadãos, falar em poupança pode parecer que se está, no mínimo, a gozar com eles. De facto, a palavra “poupar” já constitui, por si própria, uma verdadeira afronta para quem vive em situação difícil.
Pois se os parcos rendimentos não chegam para comprar os produtos mais básicos para conseguirem sobreviver, se não ganham o suficiente para ir à farmácia buscar os remédios de que tanto necessitam, para eles e para a sua família, se o nível de endividamento para com a Banca e outros credores é de tal forma insuportável que já nem a DECO os consegue ajudar, se estão desempregados há um ror de tempo, se têm que ser ajudados por pais e demais familiares, como é que se lhes pode falar, então, em poupança? Como acham que eles conseguem entender que até existe um dia que é consagrado a uma coisa chamada poupança, um termo que eles nem conseguem imaginar, por muito que quisessem?
Mas o que eu achei curioso – ou talvez não – é que no mesmíssimo dia em que se celebrava o Dia Mundial da Poupança, a imprensa portuguesa tivesse noticiado que a Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis (ANAREC) prevê que só neste ano de 2007, 40 542 pessoas abasteçam as suas viaturas de gasolina ou de gasóleo e não paguem. Isso mesmo, mais de 40 mil cidadãos chegam às bombas de gasolina, atestam os depósitos e põem-se em fuga sem pagar ... certamente por esquecimento.
A coisa é simples. Eles têm necessidade de andar de carro e o carro tem necessidade de combustível para andar. Mas como o raio da gasolina e do gasóleo estão tão caros, são eles que não vêem necessidade de pagar aos revendedores onde se abasteceram. E como não vêem essa necessidade, piram-se.
Eis uma bela forma de poupar. Já que não pode ser de outra maneira, aqui está a oportunidade de muitos portugueses conseguirem aforrar alguma coisita.
Muitos portugueses, digo bem. Repito, 40 542 em 2007, mais 20% que em 2006 e mais 73% que em 2005. Uma verdadeira catástrofe, como diz o presidente da ANAREC.
E como uma catástrofe nunca vem só, por causa de todos estes roubos, só nos dois últimos anos encerraram 144 postos de abastecimento, o que deixou no desemprego mais umas quantas centenas de portugueses que, também eles, vão sobreviver sei lá como, mais uns que não vão poder pensar em fazer poupanças ... se conseguirem sobreviver.
E para que se entenda de que prejuízos é que estamos a falar, cada posto de abastecimento tem que vender 4 mil litros de combustíveis só para compensar as perdas com as fugas dos condutores que não pagam.
Percebem agora porque é que eu não tive a certeza de ter achado curioso que no Dia Mundial da Poupança, se tenha sabido que quarenta e tal mil portugueses abastecem os seus carros e fogem?
Tratar-se-á apenas de coincidência ou isto tem a ver com o empobrecimento galopante que afecta a generalidade da população? Será que uma coisa tem directamente a ver com a outra? Isto, claro está, para não falarmos na questão da falta de princípios que, o facto em si mesmo, revela.
Mas há uma outra coisa que não deixa de ser estranha. Quando tanto se fala da necessidade das pessoas em começarem a efectuar poupanças (a pensar no dia de amanhã), cujo o dia inspirador é o 31 de Outubro – Dia Mundial da Poupança, três dias antes, a 28 de Outubro, comemora-se o Dia Mundial da Terceira Idade. O dia, justamente, daqueles para quem a palavra poupança tem um sentido muito misterioso, a roçar o perverso.
Crueldade ou, apenas, coincidência?
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